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18 DE ABRIL DE 1951 869

E, agora, outra do professor italiano Angelo Perego:

No campo ético-jurídico o direito ao trabalho encontra um limite nas exigências do direito de propriedade e do bem comum.

As determinações do direito ao trabalho competem à autoridade política, à qual pertence também especificar o direito natural não determinado suficientemente.

Na autorizada opinião destes citados autores, e também no meu desvalioso parecer, não se trata de um direito absoluto, embora a sua integração prática exija um progressivo esforço da organização e do Estado, a fim de assegurar cada vez mais normal e geralmente o seu exercício, até que fiquem por liquidar apenas os casos excepcionais de crise de resolução. Mas não serão estes que hão-de formar os princípios, influenciá-los e muito menos destruí-los.
Sr. Presidente: até aqui o aspecto positivo. Agora o aspecto negativo.
O Estado tem o dever de evitar que, na prática, o direito ao trabalho seja tornado ineficaz, quer quando se regulamente superiormente, quer quando se regule nos contratos de trabalho. E a este respeito direi rapidamente alguma coisa do que se tem passado entre nós e que, para mim, dá especial relevo à consignação constitucional deste direito.
O Estatuto do Trabalho Nacional dispõe no seu artigo 46.º que os serviços de colocação dos trabalhadores são normalmente da iniciativa dos organismos corporativos, em especial dos sindicatos. Assegurou ao mesmo tempo às empresas a liberdade de escolha dos empregados e preceituou que, excepcionalmente, estes seriam, porém, escolhidos exclusivamente entre os que constassem das listas de colocação dos sindicatos.
O Decreto-Lei n.º 23:050 assinou aos sindicatos a obrigação de organizarem agências para colocação de profissionais.
Mais tarde, o Decreto n.º 23:712 estabeleceu a faculdade de o Subsecretário dás Corporações determinar quais as profissões relativamente às quais as entidades patronais só poderiam admitir indivíduos registados nas listas de colocação dos sindicatos. Tratava-se, evidentemente, de uma medida transitória e de emergência destinada ao combate ao desemprego.
Ao abrigo deste diploma foram proferidos dez despachos permitindo a elaboração de listas nos sindicatos e foram aprovados cinco regulamentos de colocação dos profissionais respectivos. Ao todo, portanto, quinze providências com o objectivo referido.
Pois, por melhor que fosse a intenção da lei, dos despachos e dos regulamentos e por mais vigiada que fosse a sua execução, não foi possível evitar que, mais tarde ou mais cedo, os sindicatos tendessem naquela execução para utilizar tais medidas como meio de «fechar» as profissões, quer dizer, como meio de as monopolizar em favor dos que nelas já se encontravam e em detrimento dos que, legitimamente, nelas queriam ingressar. E a tal ponto chegou a má execução, e tão completa foi a prova de que, no estado actual da organização, não era possível dominar a tendência e os seus efeitos, que foi necessário abandonar o sistema das listas de colocação.
Hoje só existe uma, a qual não tem dado os maus resultados das outras e, pelo contrário, tem funcionado com respeito pelo espírito que a criou. Mas há mais.
Creio não estar a Assembleia esquecida de que há bem pouco tempo muitos Srs. Deputados deram aqui nota de considerar que as carteiras profissionais poderiam em certos casos trazer perigos semelhantes ao que acabei de apontar.
Também é verdade que até na execução de convenções colectivas do trabalho uma ou outra vez se tentou fechar profissões. Não tem sido pequena nem fácil a luta travada pelo próprio Instituto Nacional do Trabalho para, nestes casos e em outros casos ainda, contrariar as tentativas feitas para se vedar a entrada de novos elementos nas profissões.
Eis, portanto, exposto um aspecto do direito ao trabalho, da sua segurança, que não é indiferente: impedir que o trabalho se concentre apenas nas mãos de alguns, constituídos para o efeito em classe privilegiada.
Sr. Presidente: gostaria ainda, para demonstrar que entre nós está definido o conteúdo do direito ao trabalho, e este parcialmente integrado, de me referir aos fins do Fundo de Desemprego e à assistência dispensada aos desempregados por meio de trabalho nas obras públicas e outras ou por meio de socorros de instituições de assistência. Não seria ocioso fazê-lo, mas não me chega para o efeito o tempo regimental.
E, agora, o problema da subjectivação do direito ao trabalho. Poucas palavras para o efeito, pois me parece que não haverá necessidade de longa explanação.
Se é na organização económica e social que deve encontrar-se a sua objectivação, concluo por mim que é à sociedade, ao Estado, que pertence a obrigação correlativa. Não a obrigação de dar um emprego a cada desempregado forçado - repete-se -, mas a obrigação de estabelecer aquela organização por modo a que dela o por ela resulte distribuir-se o trabalho, normalmente, sem faltar a ninguém.
Isto não invalida que, em certos casos, o sujeito passivo do direito ao trabalho seja a família ou sejam até determinados indivíduos. São problemas que já não há tempo de expor. Recordemos, porém, que, no respeitante às obrigações individuais, há a esse respeito alguma coisa feita ou ao menos começada entre nós. Refiro-me ao imposto arrecadado por contribuição do rendimento do trabalho de cada um para o Fundo de Desemprego e destinado ao pagamento de salários na ocupação de desempregados.
Em resumo, e na tendência para uma síntese final, direi ainda, com Azpiazu:

O direito ao trabalho não supõe que o necessitado exija a uma pessoa determinada que lhe de trabalho, e só supõe um direito ao qual corresponde uma obrigação na sociedade. É exactamente o que sucede ao pobre que morre de fome. Tem direito a viver e a que a sociedade lhe dê o suficiente para a vida (e a sociedade é o conjunto de indivíduos), de modo que alguém terá de dar-lhe o que peça e necessite. Esta determinação concretiza-se na prática por vários modos.

Eis porque podemos dizer com Santo Agostinho: «quia non pavisti, occidisti».
E nem se me afigura procedente o argumento de que a um direito de alguém corresponde sempre uma obrigação certa de outrem. Não se trata de obrigação de um certo e determinado, a cumprir de maneira certa e determinada, mas de obrigação que pode ser, conforme os casos, do Estado, da sociedade ou de particulares, a satisfazer mediante o estabelecimento de uma organização económica e social que normalmente a todos, permita encontrar trabalho ou que socorra na falta deste.
Não se argumente também que o direito ao trabalho é atentatório do direito de propriedade. A afirmação só seria procedente se um ou outro fosse direito absoluto. Mostrámos que não o era o direito ao trabalho, até em face da nossa legislação. Lembremos que o de propriedade também não o é em face dos nossos princípios, da nossa doutrina e da nossa lei, entre o mais porque estas lhe prescrevem uma função social.