11 DE JANEIRO DE 1902 137
E não será também louvável a intenção de o Governo pretender regulamentar o processo burocrático das autorizações no sentido da sua maior simplicidade e rapidez ?
Quem se tenha visto embaraçado, sofrendo prejuízos de vária ordem, a perder tempo na organização complicada e morosa de um processo de autorização para introduzir uma simples e pequena modificação no seu equipamento industrial ou fabril saberá bem apreciar o valor que se encerra na base IX da proposta.
Quanto à segunda parte desta base IX, apresentarei uma proposta no sentido de ser também ouvido o Ministério do Ultramar.
E a remodelação do Conselho Superior da Indústria, proposta na base XV do Governo e a constituir por técnicos de reconhecida competência, industriais idóneos e representantes dos organismos de coordenação económica ou corporativos, igualmente aconselhada no parecer da Câmara Corporativa, mas com a presença de delegados da Administração, é inteiramente de aceitar e de julgar necessária a presença destes naquele Conselho.
A esta base XV da proposta, ou base XVII do parecer, apresentarei uma proposta para que no Conselho Superior da Indústria haja representação do Ministério do Ultramar.
Mereceu ao Governo especial tratamento tanto os estabelecimentos de trabalho caseiro e familiar e as indústrias consentâneas com o trabalho doméstico, como as indústrias tributárias da agricultura e os estabelecimentos complementares da exploração agrícola destinados à preparação e transformação dos produtos do próprio lavrador ou de vários lavradores associados, conforme propõe na base vi.
Na verdade, a indústria familiar deve merecer toda a protecção do Estado, visto que vem trazer melhoria de situação às famílias que trabalham no seu domicilio.
A protecção dispensada à indústria complementar da exploração agrícola é digna também dos maiores encómios. E a classe agrícola deve estar reconhecida ao Sr. Ministro da Economia por ter a iniciativa de querer satisfazer uma das suas velhas aspirações.
Virão beneficiar, particularmente, os pequenos lavradores, facilitando que se possam associar de maneira a poderem preparar ou transformar os seus produtos.
Oxalá que venha a ser aprovada pela Assembleia Nacional a supressão de obstáculos à formação de cooperativas agrícolas e que tal medida venha a dar na prática o resultado que se espera.
A indústria da preparação ou transformação dos produtos agrícolas é presentemente realizada por indústrias próprias ou pelos grandes lavradores que disponham de capacidade financeira bastante para manter os seus estabelecimentos industriais complementares da sua exploração agrícola.
Das facilidades propostas pelo Governo já os pequenos agricultores poderão beneficiar da associação ou das cooperativas.
Mas é preciso notar que a fiscalização não se poderá dispensar, quer na isenção do condicionalismo das indústrias familiares, quer das indústrias próprias do agricultor ou de agricultores associados.
É perfeitamente aceitável que se pretenda proteger o trabalho caseiro e familiar e se dêem todas as facilidades às indústrias complementares da exploração agrícola. Porém, no primeiro caso, é preciso que as indústrias sejam consentâneas com o trabalho no domicilio, e, no segundo caso, que as indústrias preparadoras ou transformadoras se destinem unicamente aos produtos agrícolas do próprio lavrador ou de vários lavradores associados; isto é: que a isenção do condicionalismo seja sómente concedida nas condições da proposta do Governo.
Como se poderá obter tal garantia?
Eu creio que sómente será possível por meio da fiscalização que venha a exercer-se. E, sendo assim, na elaboração dos regulamentos industriais previstos na Lei n.º 1:956 dever-se-á atender à fiscalização e às normas cominando sanções.
Tudo se pode ludibriar se não houver fiscalização.
Há presentemente reclamações de industriais que trabalham com debulhadoras e enfardadeiras, porque os agricultores que adquiriram para si aquelas máquinas passaram a fazer o serviço de debulha de cereais e de enfardamento a outros agricultores da sua região, provocando assim uma concorrência ilegal e desregrada com os respectivos industriais.
Outro tanto sucede com os lagares de azeite.
É fácil prever que se possa desvirtuar a louvável intenção que preside à isenção do condicionamento, e portanto é indispensável a fiscalização, que deve ser extensiva às cooperativas.
Não me fatigo em apregoar os benefícios das cooperativas, porque delas muitas vantagens resultam para os seus associados.
. As cooperativas de consumo, que alguns preferem chamar cooperativas de distribuição, em geral dedicam-se apenas aos artigos de alimentação e vestuário. Mas são instituições tão úteis e têm dado tão bom resultado na prática que no regime corporativo elas pertencem às Casas do Povo e aos grémios das respectivas indústrias.
Nestas cooperativas sómente os associados podem e devem constituir a massa consumidora. E, além da vantagem que resulta do abaixamento de preço dos géneros e de os lucros serem repartidos pelos sócios na proporção das suas compras, as cooperativas evitam ou, pelo menos, atenuam as crises e o desemprego e, por vezes, uma parte dos lucros é com vantagem destinada a obras de beneficência e previdência.
Já tive ocasião de falar na Assembleia Nacional da obra meritória que tem realizado a Casa do Povo de Santa Eulália, freguesia do concelho de Eivas, em grande parte devido à existência da sua cooperativa de consumo.
E citei apenas esta Casa do Povo, porque é a que eu melhor conheço. Mas, tratando-se na presente proposta de lei de cooperativas agrícolas, direi que elas devem funcionar, no nosso regime corporativo, anexadas ao grémios da lavoura onde estão inscritos os agricultores. E, além de adquirirem materiais e artefactos necessários à exploração agrícola ou pecuária, devem também procurar adquirir em melhores condições, para os seus associados, as sementes, os adubos e as máquinas, podendo também tratar da venda dos produtos e seleccionar os géneros, evitando assim as despesas que acarretam os serviços prestados pelos intermediários.
Enfim, as cooperativas agrícolas são de produção e venda e são também de consumo, mas sómente naquilo que for inerente à produção.
Com possibilidade de poder mais económicamente preparar ou transformar os produtos agrícolas dos seus associados, as cooperativas agrícolas têm assim a grande vantagem de evitar que se pulverizem as pequenas indústrias complementares da agricultura, que tornam certamente os produtos mais caros e fazem investir um somatório de capitais que poderia antes ser utilizado com maior proveito para os agricultores.
O seu êxito, porém, reside no maior número de associados em cada cooperativa e também na fiscalização que se exercer para não serem desvirtuados os seus fins.
O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª supõe que as cooperativas não têm fiscalização? Julgo importante a explicação que V. Ex.ª dê sobre esse ponto.