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23 DE JANEIRO DE 1952 243

têm a responder depois da entrada do requerimento em duplicado; basta arquivar para que apareça uma nova unidade classificada como industrial.
Perguntamos a nós próprios, que não somos industrial, se o precedente aberto para tentar salvar da falência a moagem de espoadas, à custa de um encargo de 52:000 contos para os mesmos que vão pagando toda a farinha que consomem, não será de invocar em breve para salvar da falência a totalidade das moagens de ramas, visto que algumas já têm falido, e que mais uma vez se tenha de repetir para as de espoadas, visto que entraram já em vida difícil, como no decorrer deste debate já aqui foi afirmado.
Evidentemente, Sr. Presidente, que nenhum destes males provém da existência de um condicionamento, mas sim da forma como ele se faz, como se regulamenta, como se cumpre a regulamentação ou, antes, como se não cumpre, através de excepções, como aqui tem sido referido.
Não há certamente nenhum partidário da libertação das indústrias, mesmo quando ela se mostre conveniente em certos aspectos, que possa aprovar situações jurídicas que levem aos números atrás apontados.
Aceitamos sem dificuldade que a luta é capaz de estimular a iniciativa, que pode levar a uma selecção de valores, que são os que triunfam na vida industrial ou em qualquer outro campo de acção, mas a economia de um país é problema sério em demasia para campo aberto a toda a natureza de experiências e tentativas, na sua maioria condenadas a malogro.
Conhecemos de perto muitas das instalações a que nos vimos referindo, tanto o seu apetrechamento como a pessoa do industrial - passe a expressão -, como os seus conhecimentos técnicos e também o analfabetismo de muitos, como ainda a ausência de capital de tantos. Mas estas instalações assim formadas constituem, na verdade, uma unidade industrial? Serão indústrias caseiras, como julgamos já aqui foram classificadas?
Não; certamente não cabem em nenhuma destas classificações. Se em 1952 fosse feito um estudo a sério das indústrias portuguesas para a realização do inquérito ordenado há vinte anos, certamente não poderiam tomar lugar entre as organizações industriais capazes de assegurar o abastecimento público.
Não mós move nenhuma má vontade contra quem procura por este sistema angariar os meios de vida, mas a verdade é que o abastecimento público não pode assentar em velharias,, que, longe de tenderem para desaparecer, pelo contrário, nascem como cogumelos. Preocupa-nos igualmente a situação de alguns milhares de portugueses que vivem daquilo que está ultrapassado pelo tempo e que virá a desaparecer, quer se queira quer não. Preocupa-nos outro aspecto ainda, pois não esquecemos um espectáculo bem doloroso verificado em duas aldeias do distrito de Beja há cerca de oito meses. Apareceu uma doença desconhecida que ocasionava fortes perturbações gástricas, ao mesmo tempo que os doentes eram rapidamente quebrados por grande anemia, debilitando-os ao ponto de terem de ficar nos leitos. Famílias inteiras se encontraram nesta situação. Segundo o médico local, verificava-se rápida destruição dos glóbulos vermelhos, o que dava aos doentes um aspecto verdadeiramente lamentável. A doença generalizou-se e estendeu-se a uma outra aldeia vizinha. Intervieram as autoridades de saúde, que verificaram terem todos os doentes comido pão fabricado com farinha procedente da mesma fábrica de ramas, embora nem todos que dela se serviam tivessem adoecido. Feita uma visita de inspecção à fábrica, que se compunha de um único casal de mós, foi verificado que principalmente uma das mós apresentava em larga superfície reparações feitas com chumbo. Postas as autoridades na pista de uma intoxicação pelo chumbo, dada a raridade deste caso, foi estudado e verificado posteriormente que os sintomas, que os doentes apresentavam correspondiam exactamente a tal natureza de intoxicações. Não chegaram, no entanto, a uma conclusão precisa, concludente, mas o que é certo é que dezenas de doentes tiveram de ser auxiliados com alimentos, medicação, assistência médica, etc., e ainda hoje muitos deles, os mais atacados, continuam a sofrer. O dono da instalação, quando interrogado sobre a razão de ser do chumbo nas mós, explicou que se dedica àquela actividade há trinta e dois anos e que sempre viu fazer aquelas reparações com chumbo, embora saiba que há um cimento especial para o fim em vista, mas que, sendo caro, é geralmente por todos os moleiros substituído pelo chumbo.
Seja como for, ficou a suspeita, e nesta matéria não há inspecções, como seria para desejar, visto que a farinha é consumida tal como é entregue.
Conhecemos de há muito uma má vontade contra as moagens de ramas, que certamente se filia na concorrência que fazem à moagem de farinhas espoadas. Sabemos mesmo que, desde que se iniciou a incorporação de cereais panificáveis na farinha de trigo, muitas fábricas de ramas não conseguem farinar completamente a incorporação e que esta não fica mais que triturada, sendo arrastada na peneiração juntamente com a sêmea. Sabemos que, em consequência desta circunstância, certo peso de farinha em rama produz menos quilogramas de pão que igual peso de farinha espoada. Sabemos ainda que nas zonas rurais, onde a base da alimentação é o pão, o trabalhador não ,pode viver de pão branco, de pão fino, mas sim tem de comer o belíssimo pão chamado de toda a farinha, que já existia antes das moagens modernas. É o pão pesado que os alimenta, o pão que não tem categoria que chegue para por ele se avaliar do grau de desenvolvimento de um país, como modernamente pretendem que se avalie aqueles que suo exportadores de trigo. Mas é o pão que alimenta, como a pesada broa de milho alimenta substancialmente outras zonas do País.
Sr. Presidente: entendeu o Sr. Ministro da Economia que, para atender «à magra economia do nosso lavrador», deveriam ficar fora do condicionamento as indústrias complementares da exploração agrícola.
Desde há muitos anos que muitos Srs. Deputados se esforçam nesta tribuna por demonstrar que, não obstante os «espadas» que a lavoura possui, é de facto uma actividade de lucros incertos e precários, em consequência de condições geoclimáticas que o homem não consegue vencer nem dominar. A afirmação da proposta de lei dá necessariamente aos homens da terra a satisfação platónica de ver reconhecer uma verdade que a discussão decorrente mostra ter sido recebida por formas diferentes, ocasionando largas demonstrações do nosso colega engenheiro Calheiros Lopes, que revelam vasta erudição sobre quanto se tem feito em países estruturalmente diferentes do nosso, desde a densidade populacional, passando pelo nível de vida há muito já bastante elevado, com solo e subsolo ricos e clima favorável à exploração agrícola, por melhor distribuição pluviométrica.
Do que me foi possível deduzir, tão vasta argumentação tem em vista manter na situação presente a indústria do descasque de arroz. Logrou a lavoura conseguir com regadios abastecer as necessidades nacionais em arroz, cultura rica, menos contingente que a do sequeiro. Fácil foi montar-se uma indústria, que se tornou próspera, com matéria-prima nacional e metropolitana. Segundo a insuspeita opinião da nossa cozinheira, que ignora a existência de condicionamentos da indústria e a origem dos géneros que confecciona,