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246 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124

economia política, salvo aquela que aprenderam com a experiência do trato da terra, revolvida por sucessivas gerações, em busca de riqueza, que é a riqueza da própria Nação.
Para mim, e pura esses portugueses, a proposta tem essencialmente uma grande virtude: o reconhecimento de legítimos direitos da lavoura e do lugar que lhe pertence na economia nacional.
E digo mais: a aprovação da proposta é indispensável à vida futura da lavoura, que sem ela muito dificilmente poderá seguir novos rumos que garantam mais pão e mais sustento à população, favoreçam o aumento do nível de vida de uma parte importante dessa população e restabeleçam o próprio prestígio de um dos sectores da organização corporativa.
Reconhece-se na proposta que a acção da lavoura não deve limitar-se à simples extracção dos produtos da terra, que vai mais longe, até à colocação no mercado dos seus próprios produtos transformados, e, sobretudo, que a associação dos produtores agrícolas, através das cooperativas, é um elemento fundamental da valorização da agricultura.
Creio que esta afirmação de uma política do Governo tem real conteúdo e as claras palavras do notável relatório que acompanhou a proposta, no sentido de se estimular a actividade associativa da lavoura, dão-nos u certeza de que se caminha para uma nova época, em que a lavoura -sempre presente para todos os sacrifícios nos momentos difíceis das nossa vida económica será finalmente compreendida como o elemento mais importante da economia nacional. Até porque acontece às vezes, tantas vezes mesmo, louvar-se a lavoura e as suas tradicionais virtudes de trabalho, de poupança, de honradez e de inexcedível persistência, sem se lhe atribuir o verdadeiro significado, antes como processo para melhor se entrar em campo que só a ela pertence e só a da compete lavrar.

Vozes:- Muito bem, muito bem !
O Orador:- O que quererá dizer-se, por exemplo, como há pouco li em exposição enviada à Câmara por um importante organismo industrial, que a lavoura precisa de valorizar o mais possível os seus produtos e que as medidas tomadas na proposta são de interesse para a economia do País, quando a própria exposição é a negação da possibilidade dessa valorização?
E os protestos de admiração pelo trabalho agrícola e de carinho e até de amor pela lavoura que tantas vezes ouvimos, sem que as sonoras palavras correspondam obras que as justifiquem!
Mas vejamos, Sr. Presidente, rapidamente, se as medidas previstas na proposta de lei, dentro da linha de considerações que me propus fazer, são ou não de interesse para a economia nacional.
O problema principal a resolver por qualquer indústria que pretenda viver e progredir é o da colocação dos seus produtos.
Se não puder colocar no mercado os produtos que fabrica, e a preços convenientes - isto é, vender e vender bem -, essa indústria não tem possibilidades de viver e muito menos de progredir.

Vozes:- Muito bem!
O Orador:- Produção industrial para exportação ou concorrência no mercado nacional com produtos de importação:
Não interessa, por agora, para o ponto de vista que estou a defender, considerar qualquer desses aspectos do problema.
O que me parece que está fora de toda a dúvida é que muitas indústrias portuguesas só poderão existir, e muitas outras viver com estabilidade e desafogo, se conseguirmos aumentar o poder de compra da população e, consequentemente, melhorar o seu nível de vida.
Eu direi com o Sr. Prof. Ferreira Dias: «... no caso português, em que não é razoável encarar outro mercado para a indústria que não seja o interno, pode dizer-se que a agricultura é a grande cliente daquela, pela sua posição dominante na economia nacional, e a indústria só tem vantagem em que esta viva próspera, porque não interessa a ninguém ter fregueses sem desafogado poder de compra».
Na verdade, quando a maior parte da população portuguesa, essa massa rural de pequenos e médios proprietários e de jornaleiros, se puder alimentar melhor, comprar mais roupa para se vestir e «para se aquecer, habitar em casas melhor construídas, viajar por essas estradas e caminhos de ferro do nosso Portugal, tiver acesso a certas pequenas comodidades e distracções, que são conquistas legítimas da Humanidade, renovar e aperfeiçoar os seus instrumentos e utensílios de trabalho, em suma, quando puder comprar o que precisa para viver com um nível superior àquele em que hoje vive, sem que isso resulte de uma ilusória elevação de preços que sacrifique a restante parte da população, então a indústria portuguesa será aquilo que todos desejamos.

Vozes:- Muito bem!

O Orador:- Mas como criar maior riqueza que a todos aproveite, como aumentar o poder de compra dessa massa rural.
Pelo aumento da nossa área cultivável?
Sem dúvida. Mas temos a considerar que a área cultivável do País está na sua quase totalidade aproveitada, bem ou mal, mas aproveitada.
Por outro lado, os Governos do Estado Novo têm feito notáveis esforços para fomentar o aumento e melhoria da produção agrícola.
Muito há a esperar, certamente, para o aumento e melhoria da produtividade do solo português, das grandes e pequenas obras de hidráulica agrícola, dos aproveitamentos hidroeléctricos, da colonização interna, do povoamento florestal, estando bem orientado, da instalação de novas indústrias para a produção de adubos azotados, etc.
Na verdade, também a política de preços, o aperfeiçoamento dos meios técnicos de cultura, a técnica oficial ao serviço da lavoura, o melhoramento dos equipamentos, a preparação profissional, não esquecendo, porém, em tudo isso que a nossa economia agrária assenta na pequena e média propriedade, são factores a considerar para o aumento do nível de vida da gente do campo.
Mas o que me parece é que somente quando a lavoura puder ocupar plenamente o seu lugar, tirando dos produtos que semeia ou planta e que depois colhe, à custa de enormes canseiras e trabalhos e não menor tenacidade, todas as utilidades de que os mesmos são susceptíveis e que estejam evidentemente ao seu alcance, quando se vir livre de formalidades e burocracias inconvenientes, que travam o seu desenvolvimento, e se vir livre também dos intermediários dispensáveis, que chamam a si o que a ela se torna necessário para viver decentemente, então já o poder de compra aumentará, já poderá comprar o que a indústria fabrica.
Este facto real, mas antieconómico, como o classificou em 1942 o Sr. Presidente do Conselho, de uma boa parte da nossa agricultura não ser industrial, foi por S. Ex.ª posto em relevo ao dizer que ela «não trabalha para o lucro, produz para viver pobremente e alegremente gastar o excesso de outras rendas».