248 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124
A experiência de catorze anos mostra bem que as objecções que se fizeram em 1037 à isenção dessas indústrias do condicionamento industrial não tinham razão de ser.
A própria Câmara Corporativa é de opinião de que não há inconveniente em manter-se a doutrina da parte final da base II da Lei n.° 1:956, e de parecer idêntico são os organismos industriais que representaram sobre a proposta.
Julgo que se poderá ir mais longe sem preocupações.
A possibilidade do condicionamento está de tal maneira limitada pela proposta a indústrias ou modalidades industriais que revistam determinadas características que se torna difícil, senão impossível, incluir as indústrias complementares da agricultura, destinadas à transformação dos produtos dos próprios lavradores, individualmente ou associados, em qualquer das alíneas da base III.
E poder-se-á perguntar, como, aliás, já aqui se perguntou e respondeu, se essas indústrias seriam porventura susceptíveis das obrigações que a proposta de lei impõe às indústrias ou modalidades industriais condicionadas.
A lavoura é a fonte principal da riqueza do País.
Valorizá-la será valorizar toda a economia da Nação.
A aprovação da proposta de lei constitui um dos elementos mais eficazes para essa valorização, e o Governo merece todos os louvores por a ter trazido a esta Assembleia.
Tenho dito.
Vozes:- Muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Mascarenhas Gaivão:- Sr. Presidente: em primeiro lugar rendo a V. Ex.ª as minhas respeitosas homenagens.
A VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, peço desculpem os breves momentos que lhes vou roubar. Para quem não tem a experiência da política, e muito menos dotes de oratória, seria de boa prudência abster-se de subir a esta tribuna, onde espíritos tão lúcidos e de tanto prestígio têm debatido o problema que aqui me traz.
Como homem de trabalho apenas e com a experiência de uma vida inteira em Moçambique ao serviço da actividade particular, são as credenciais com que me apresento a fazer o meu depoimento. Com tão fracas qualidades seriar como digo, prudente limitar-me a ouvir as brilhantes lições que VV. Ex.ªs, deste mesmo lugar, me têm dado. Atrevo-me, porém, a fazer o meu depoimento, na certeza da antecipada benevolência de VV. Ex.ªs
Sr. Presidente: na apreciação de uma proposta de lei com a transcendência desta, que estabelece normas de condicionamento industrial, parece a todos os títulos desejável se não esqueça que somos um país com largos domínios ultramarinos, vastas províncias, vastos territórios que têm características económicas próprias, inconfundíveis e que é necessário ter em conta quando se legisla sobre matéria complexa como esta, acerca da qual se têm manifestado na Assembleia alguns dos espíritos mais brilhantes e bem informados que a compõem.
Muito se tem falado da unidade económica de todo o território português no Mundo, unidade que se tem julgado complementar da unidade política e da unidade moral que tão profundamente se revelam em todo o quadro da vida portuguesa. Trata-se, porém, de uma expressão que pode e deve manifestar um estado de tendência, que tem de ser interpretada com inteligência e sentido das realidades sempre que se trate de definir uma política económica baseada em princípios e métodos aplicáveis a todo o território nacional.
Podemos aspirar a uma política económica unitária, quer dizer, uma política económica que vise a integrar todos os interesses e a manifestar por todas as economias, metropolitana e ultramarina, o mesmo grau de respeito e atenção. Mas uma (política de unidade economia que desconheça as condições diversas de cada território e pretenda sobrepor-se às realidades insofismáveis da geografia, do clima, e por consequência das razões de vizinhança e das produções naturais de cada parcela do território nacional, não poderia conduzir à unidade, mas à divergência, cada vez mais profunda e irremediável.
Quando ouço falar de coordenação económica entre a metrópole e as províncias do ultramar, posso entender, Sr. Presidente, que no campo da produção e do consumo se procure ajustar interesses recíprocos, sempre que eles se apresentem, ajuntáveis e se aproveitem todos os meios para fortalecer a economia comum pelo desenvolvimento máximo de cada um dos elementos territoriais associados. Quando, porém, coordenação significa subordinação económica de um território ou de um grupo de territórios aos interesses doutro ou doutros, quando por coordenação se entende que, para além e acima do direito de um território a desenvolver a sua riqueza, há que contar com limites que são impostos pelo exclusivo interesse de uma das parcelas do agregado nacional, então má, e se está a trabalhar para a unidade económica, mas a criar razões para antagonismos conducentes a divisões, que poderão vir a ser - bem contra a vontade de todos nós - acentuadas e profundas.
Será bom que no regime de condicionamento industrial que vier a estabelecer-se não se percam de vista estas realidades.
O Sr. Melo Machado: - Estou plenamente de acordo com as considerações de V. Ex.ª, mas permito-me acentuar que esta lei de condicionamento é para cá e não visa, de maneira alguma, ao condicionamento nas províncias ultramarinas.
O Orador:- O condicionamento industrial encontra a sua razão de ser nas sociedades economicamente evoluídas, quando se trata de ajustar a produção e o consumo, quando se torna necessário evitar que se acentue o desequilíbrio entre factores, económicos, com prejuízo da ordem económica, dos capitais investidos, da qualidade e preço dos produtos e do trabalho.
Nos meios ultramarinos, no início ou mesmo em plena evolução, quando tudo é desejo de aumentar a riqueza, de desenvolver a produção, de arrancar do solo e das indústrias transformadoras o máximo proveito, quando os recursos parecem ilimitados e a terra se apresenta apta a realizar todos os sonhos de grandeza, a expressão condicionamento industrial parece dificilmente ajustável às circunstâncias, se não for convenientemente explicada. Ali não há concorrências prejudiciais: todas as actividades encontram aplicação e podem somar-se; não têm a necessidade de guerrear-se e eliminar-se que existe em meios mais pequenos ou saturados.
As condições especiais dos meios ultramarinos - em que são escassas as iniciativas, raros os capitais e não abunda o trabalho - aconselham a concessão das maiores facilidades às actividades individuais. Terras ainda por descobrir, se nos reportarmos à imensidade dos seus recursos intactos, à maravilha inimaginável das suas riquezas inexploradas, temos de admitir, como necessidade, que no ultramar encontrem local próprio ao seu desenvolvimento as mais arrojadas iniciativas individuais, as ambições que comandam os grandes génios da aventura, aplicados às explorações agrícolas, industriais e comerciais, e que dificilmente poderão mani-