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280 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 126

de inteligência, tacto, bom senso e sentido das realidades práticas que o nosso antigo colega Dr. Ulisses Cortês possui é suficiente garantia de que tudo se conseguirá pela melhor forma possível, sem excessivo intervencionismo do Estado, nem hesitações ou fraquezas da parte deste, sempre que o interesse nacional o exija. Não basta ser economista, é indispensável ser-se também um grande político, e o actual Ministro reúne, numa harmonia notável e em alto grau, estas duas qualidades, tão necessárias para o desempenho daquele difícil cargo.

Vozes: - Apoiado! Apoiado!

O Orador: - As suas notabilíssimas comunicações à imprensa, esclarecendo a opinião pública, feitas com tanta ponderação è sentido das oportunidades, as suas medidas claras e prontas para libertar a economia portuguesa de peias inúteis e que têm merecido os mais entusiásticos e justos aplausos confirmam a minha opinião.

Vozes: - Muito bem! Apoiado!

O Orador: - Disse há pouco que o condicionamento e por conseguinte a lei que se lhe refere, para serem convenientemente examinados, têm de olhar-se no conjunto do complexo nacional.
Por isso, na minha opinião, o condicionamento deverá visar a defesa, através das indústrias, da economia nacional, em função das suas necessidades presentes, é certo, mas também e principalmente em função das suas necessidade futuras, possíveis de prever. O económico é algo que está em constante movimento.
Os interesses económicos do consumidor e os bens de consumo de valor para ele variam com hábitos criados pela civilização e pelos conhecimentos científicos da higiene pública.
Neste campo há um importante papel a ser desempenhado pelas indústrias complementares da agricultura ou com base nela, e é sobretudo neste ponto que a questão do condicionamento industrial tem provocado mais celeuma.
Pergunta-se: deverá reconhecer-se à agricultura o direito de utilizar os seus produtos integralmente, industrializá-los e ale mesmo comercializá-los, explorando a sua riqueza desde o acto propriamente agrícola até à venda directa ao público?

O Sr. Melo Machado: - Porque é que o lavrador não pode fazer isso?

O Orador: - Adiante julgo responder ao que V. Ex.ª acaba de perguntar.
À primeira vista parece tratar-se de um direito inegável do agricultor, de um direito legítimo. Corresponderia esse facto à possibilidade de organização de uma espécie de trust vertical, que oferecesse aparentemente, pelo menos, certas garantias de rendimento, visto suprimirem-se os intermediários inúteis.
Mas eu pergunto a mim próprio se esta maneira de pôr o problema não é uma (maneira viciosa, por não corresponder à realidade dos factos.
É certo que um agricultor que queira moer a sua azeitona em lagar privativo poderá apresentar um azeite, no ponto de vista bioquímico, da mesma qualidade daquele apresentado por um lagareiro especializado. Mas a questão é outra. O problema é fundamentalmente este: terá o agricultor interesse económico em fazê-lo? Poderá ele fazê-lo tão eficientemente como o industrial especializado e com a mesma facilidade? Não o forçará esse empreendimento a um desvio da sua atenção para problemas marginais que o distraiam da sua actividade económica fundamental e em prejuízo desta? A mini parece-me que isso só seria possível e viável na medida em que o agricultor fosse simultaneamente um agricultor e um industrial, que por acidente se encontrassem reunidos na mesma pessoa, mas sem que, de modo nenhum, as suas qualidades de bom industrial fossem inerentes à circunstância de ele ser um bom agricultor.

O Sr. Botelho Moniz: - Julgo que o produtor de determinada matéria-prima deve ter o direito de preferência, em relação a qualquer outra entidade, de melhorar industrialmente essa matéria-prima. E foi dentro dessa orientação, que é também uma orientação económica, que eu pus o problema.
Se esse melhoramento da matéria-prima se executa em regime de concorrência com a indústria pelo aparecimento de um novo industrial, é evidente que ele só pode subsistir se o lavrador transformado em industrial souber ser industrial, souber aproveitar a sua matéria-prima. E, se o souber, contribui iniludivelmente e por direito próprio, por direito superior a qualquer outra entidade, para o progresso económico geral.

O Orador: - Pode realmente ser assim por excepção. Simplesmente eu penso que na prática, normalmente, não é assim.
Em primeiro lugar trata-se de realizar essa actividade industrial em condições tais que corresponda ao que V. Ex.ª acabou de dizer, isto é, melhorar, e não explorar de qualquer maneira e tendo em mira o lucro. Se se quer apenas acrescentar o lucro industrial ao da exploração agrícola, então esta não deve ser isenta do condicionamento, se o interesse nacional assim o exigir.
Na opinião de V. Ex.ª não são levados em linha de conta todos os factores sociais, mas apenas os factores relativos ao agricultor.

O Sr. Botelho Moniz: - Se estivermos em regime de livre concorrência, é evidente que entramos em linha de conta com o complexo total.

O Orador: - O que V. Ex.ª afirmou tem por objectivo invalidar a legitimidade do condicionamento? Julgo que não.
Aquilo de que se trata é: se nós aceitamos um condicionamento que por definição é prudente, é inteligente e tem em mira o interesse nacional, evidentemente que as circunstâncias, concretas na sua complexidade, viriam de novo a transformar de uma maneira geral a actividade industrial num sentido de actuação mais livre se fosse conveniente, mesmo naquelas actividades que dizem respeito aos produtos agrícolas que exigem uma especialização técnica e que estivessem inacessíveis ao agricultor. Mas é preciso não esquecer que dificilmente o agricultor poderá satisfazer às exigências técnicas que essa industrialização requer.

O Sr. Botelho Moniz: - Se ela não for feita nessas condições, repito, morre. E, então, a indústria não tem que ter medo dela.
Eu ocupo lugar directivo numa indústria que é produtora de azeite, e parece que devia estar aqui a defender essa indústria, em detrimento da lavoura, pretendendo que a lavoura fosse obrigada a entregar a essa indústria toda a sua azeitona. Ora eu tenho feito precisamente o inverso, porque considero que ao agricultor deve ser dado o direito de escolha.
Na minha pequena casa agrícola resolvi o problema vendendo a azeitona, em vez de a entregar ao lagar que dirijo, porque isso me conveio mais. É essa liberdade que pretendo para toda a agricultura.