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390 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 131

animada cada vez mais ido espírito liberal, prosseguiu na hostilidade aos vínculos, finalmente extintos em definitivo peias Leis de 30 de Julho de 1860 e de 19 de Maio de 1863 1.
A par dessas leis, outras vieram concorrer para o progresso do fraccionamento do solo. As de desamortização forçaram à divisão de domínios antes concentrados na mão de pessoas morais perpétuas. A Reforma Judiciária, como depois dela o Código Civil, ordenou que na partilha judicial os lotes se compusessem, quanto impossível, de bens do mesmo género ou da mesma espécie. Além disso o Código, mandando registar o encargo enfitêutico, levou muitos senhorios directos, em caso de prédios diminutos, a preferirem vender o seu direito aos foreiros, e daí a consolidação jurídica da propriedade, com a consequente divisibilidade dos prédios. A tudo isto acresceu a Lei de 18 de Maio de 1880, que sujeitou u contribuição de registo por título oneroso as tornas devidas em consequência de partilha, na parte referente a imobiliários: a incidência dessa contribuição leva muitas vezes a preferir o fraccionamento de um prédio que doutro modo se encabeçaria num só herdeiro, com pagamento de tornas.
Abolidos os vínculos, a propriedade deixou de ter defesas legais contra a excessiva divisão, sempre que não se apresentasse sob a forma de prazos ou fideicomissos, uns e outros indivisíveis, mas os segundos muito limitados e agora forçosamente temporários.
Os interessados, nas regiões nortenhas, utilizam com largueza essa liberdade legal e nas partilhas de heranças pulverizam o solo. Mesmo que pudessem manter indivisos os prédios herdados, pela sua distribuição entro os vários quinhões, muitas vezes não o fazem, pois cada um. quer unia parte em cada um dos prédios, no receio de ser prejudicado por uma partilha não inteiramente igualitária.
Nos último tempos alguma coisa se tem feito, mas ainda não o suficiente, em reacção a esse estado legislativo: do que adiante se falará.

Vantagens da pequena propriedade

6. A pequena propriedade tem vantagens incontestáveis, assim de ordem social como de carácter económico. Longe de combatê-la, devem os Poderes Públicos fomentá-la.
Ela aumenta a classe dos proprietários. Só por seu intermédio podem muitos satisfazer a legítima ambição de terra, sonho maior das gentes rurais.
E é um enorme bem que o número de proprietários seja, quanto possível, grande.
Daí resultará, em primeiro lugar, maior equidade na distribuição da riqueza, sem contrastes tão fundos entre ricos e pobres.
Além disso, o solo tornar-se-á mais produtivo. Quem trabalha terra própria põe no seu amanho maior amor e diligência. Não a causa, numa exploração antieconómica, como tantas vezes faz o rendeiro, porque ela é sua. Mas, com prudência e esmero, esforça-se por a valorizar através de benfeitorias e por, sem excessos, a fazer produzir o máximo. As colheitas tornam-se miais abundantes o maior a riqueza da Nação.
Daqui uma última vantagem, que é o afrouxamento da corrente emigratória e da fuga para as cidades.
Aquele que encontra na terra independência económica, sua e dos seus, e que dela tira não só alimento, senão também um certo bem-estar, não se sente tão facilmente tentado a trocar essa estabilidade e paz pela aventura da cidade ou de países distantes.
Eis por que dizemos que o legislador deve rodear de simpatia e estímulos o fomento da pequena propriedade 1.

Inconvenientes da pequeníssima propriedade

7. Se a pequena propriedade tem vantagens, a pequeníssima tem inconvenientes que as sobrelevam. Economicamente é um mal o retalhamento do solo em glebas minúsculas e a sua disseminação.
A pulverização dos prédios rústicos faz destes um emaranhado caprichoso, um labirinto, em que eles se interpenetram segundo formas irregulares e extremamente variáveis.
A multiplicação dos prédios para além do razoável obriga a perda considerável de terreno, subtraído à agricultura em vedações. Muros, sebes, valas cobrem superfície improdutiva, tanto maior quanto mais numerosos os prédios e mais tortuosa a sua linha de demarcação. Supondo um muro divisório de 0m,5 de espessura, distribuído em partes iguais pêlos dois terrenos vizinhos, ele ocupará, aproximadamente, 20 por cento da área de cada um dos terrenos, se esta for de 25 metros quadrados, 10 por cento se for de 100 metros quadrados, 2 por cento se tiver 2:500 metros quadrados. A percentagem de espaço perdido sobe à medida que decresce a área do prédio e representa qualquer coisa de substancial nos mais diminutos.
Aos muitíssimos hectares desperdiçados em vedações somam-se os absorvidos pêlos caminhos, cuja rede é tanto mais extensa e complicada quanto maior for a fragmentação da propriedade.
Segundo elementos fornecidos pelo Prof. Lima, Bastos, em escrito de 1941, a freguesia de Vale da Madre, no concelho de Mogadouro e distrito de Bragança, tem 27ha,985 de vedação e serventias e 34ha,312 de vias públicas de comunicação - números altíssimos, resultado da estrema divisão fundiária. Em contrapartida, no concelho e distrito de Beja, a freguesia de Cabeça Gorda, com uma área agrícola sete vezes superior, apenas atinge respectivamente 4ha,850 e 50ha,563. Quer dizer: aqui, num espaço sete vezes maior, as vedações e serventias ocupam uma superfície 5,7 vezes mais pequena e as vias de comunicação uma superfície apenas 1,4 vezes mais extensa 3.
A exiguidade dos terrenos impossibilita ou dificulta a execução de trabalhos de irrigação e drenagem, bem como o emprego de máquinas agrícolas, e estes inconvenientes económicos vêm somar-se à improdutividade do solo roubado à agricultura.
Mas os males sobem de ponto quando da divisão resulta encravamento de prédios - situação que se multiplica com os extremos a que a divisão é levada. O prédio encravado, sem comunicação directa com as vias públicas, é como uma ilha, cujo acesso sujeita os prédios vizinhos a um ónus gravoso - a servidão de trânsito ou passagem.
O prédio encravado desvaloriza-se, pela dificuldade do acesso, que raramente será tão cómodo como o da via pública, e pela necessidade de devassamento de terrenos alheios, que se a alguns agrada, desagrada a outros. Os terrenos servientes desvalorizam-se também, sujeitos a esse devassamento constante, e algumas vezes de exploração mais difícil pelo alongamento do per-

1 Prof. Paulo Mereia, «Organização Social e Administração Pública», na História de Portugal, de Barcelos, vol. n, pp. 458 e 460; Prof. Cabral de Moncada, A Reserva Hereditária no Direito Peninsular e Português, vol. II, cap. III; Gama Barros, História da Administração Pública, 2.ª ed., tomo VIII, pp. 221 e segs.; Herculano, Opúsculos, vol. IV; Coelho da Rocha, Instituições do Direito Civil Português, 6.ª ed., tomo II, pp. 390 e segs., e nota a pp. 700 e segs.: Xavier Cordeiro, O Problema da Vinculação.

1 Rerum Novarum, II-B.
2 «Propriedade Rústica», nos Anais do Instituto Superior de Agronomia, vol. XII, fase. 1.°, p. 45.