17 DE ABRIL DE 1952 697
mar. Eis um dos destinos - auxiliar e trabalhar para a metrópole dentro do grande pensamento da unidade imperial, além doutros concursos, que adiante se mostrarão para evidenciar o sentimento de solidariedade que tem prendido os coloniais ao progresso e bem-estar da metrópole.
Se no aspecto político interno e externo a doutrina do decreto não se pode ajustar aos grandes e verdadeiros interesses coloniais, o mesmo teremos que salientar quanto ao seu aspecto económico.
As nossas colónias, como se sabe, são ainda países em formação. A sua povoação e o seu fomento tem «ido quase exclusivamente particular.
O seu progresso e o «eu desenvolvimento devem-se a iniciativa particular, ao esforço e trabalho dos colonos e aos investimentos, que só a poupança tem conseguido amealhar na formação de capitais, e que nas colónias tem sido colocados.
Grandes e graves crises tem atravessado, mormente a de 1929 a 1939, cuja depressão económica fez passar a todos os que mourejam pelas colónias as horas mais amargas e de maiores sacrifícios. Vivia-se então no regime das menos-valias, houve muitos prejuízos a suportar, mas a tenacidade do colono soube enfrentar a crise e soube superá-la à custa do seu trabalho e do seu esforço desprotegido. Não é lógico nem legítimo que nas horas mais afortunarias se coarcte aos colonos o produto de um rendimento que não só serve para resgatar encargos contraídos, cobrir os danos e os prejuízos do passado, como privá-los do que ainda necessitam para dar maior incremento ao desenvolvimento das riquezas por explorar, ao alargamento das que já estão em exploração e onde já há largos investimentos, como ainda para a reposição de toda a utensilagem de primeiro estabelecimento, que as más horas não deixaram amortizar e cujo custo mais que decuplicou.
E o exemplo do passado mostra que os coloniais não precisam, de ser tutelados na administração dos seus dinheiros. Tudo lá investem, desde o dinheiro ao trabalha e até a sua própria saúde.
Não há por isso razão nem fundamento para se dizer, como se proclama a propósito do decreto, que a serão aproveitados para obras de fomento os excessos de lucros que causem perturbações inflacionistas tios nossos territórios de além-mar.
Nunca os excessos de lucros obtidos pela exportação podem originar internamente uma conjuntura inflacionista. Os valores de exportação são riqueza efectiva, porque são créditos sobre o estrangeiro com que se pagam as importações e que, por isso mesmo, descreve uma curva em sentido contrário à inflação.
O problema da inflação dos preços, que por toda a parte existe, esse é devido principalmente a três factores que importa frisar:
1.º O aumento do custo da mão-de-obra por virtude da elevação do nível social do indígena e do agravamento dos custos da alimentação, do vestuário e da assistência médica e hospitalar;
2.º O aumento de todos os artigos de importação, cujos preços nos mercados externos têm vindo a subir, como é notório, numa espiral sempre crescente e que hoje se pode computar numa média de cinco a dez vezes mais em relação a 1939;
3.º O aumento de meios de pagamento que tem engorgitado o mercado interno, no qual as exportações não têm a menor responsabilidade, tanto em relação ao comércio em geral, como em relação ao comércio em especial com os países participantes da União Europeia de Pagamentos. Quer no comércio geral quer naquele comércio especial, a nossa balança comercial é deficitária, o que mostra não serem os meios de pagamentos produzidos pela exportação que geraram o fenómeno, pois nem sequer chegaram para liquidar o saldo das nossas importações.
Com os países do estrangeiro o nosso deficit, conforme as estatísticas do Instituto Nacional de Estatística, é de 2:540 milhões e com a União Europeia de Pagamentos, não conforme as liquidações feitas através do banco emissor, que não traduzem rigor, mas conforme os números da estatística do Instituto Nacional de Estatística, é de 90:000 contos, sendo certo que só com os países da Europa o nosso deficit foi, através da União Europeia de Pagamentos, de 1:423 milhões.
Justiça é, pois, reconhecer que ao fenómeno interno da inflação dos preços é estranha a exportação.
Mas ainda, economicamente, o decreto não tem rigor nos princípios que o informam quando pretende, através do Fundo de Fomento e Povoamento e do capital de fomento e povoamento, cercear ao particular uma onerosa parte dos seus rendimentos e substituí-lo na realização das obras de fomento.
É hoje fora da ética o uso de tal processo à custa de uma fiscalidade que as fixaria as possibilidades do comércio e da produção.
Hoje, a prática o tem demonstrado, querer financiar as despesas de capital pelo tributo é criar uma super fiscalidade e com ela a degradação da moeda, que conduz à inflação dos preços.
Quando os encargos que se impõem à economia constituírem um fardo demasiado oneroso, a sua consequência é o aviltamento da moeda.
E, como dizia há pouco o chefe do Governo Francês, «com uma moeda que se deprecia (por contrapartida da elevação dos preços) as suas consequências são acelerar a sua crueldade contra os humildes, como as mais odiosas injustiças contra todos».
Economicamente seria um erro distrair dos particulares os rendimentos que tão necessários são às iniciativas de fomento, que tão ardorosamente têm realizado, como seria asfixiá-los sobre o peso de encargos que lhes eliminariam as possibilidades de trabalho.
E, se se entender que é necessário intensificar a obra de fomento e povoamento, parece que, em compensação dos sacrifícios feitos pelo ultramar no abastecimento de produtos contingentados, deveria ser a metrópole, à semelhança dos grandes planos elaborados pela França, Inglaterra, Bélgica e América, a fazer o respectivo investimento de capitais.
Para exemplo citemos o plano decenal do Governo Belga para fomento do Congo, que votou para a realização deste grandioso plano uma verba equivalente a ou milhões de contos, que não visa mais que apoiar a iniciativa particular, sendo certo que nesta cifra avulta uma larga verba obtida pelo Plano Marshall.
Isto não representaria, com efeito, mais do que o reconhecimento dos enormes sacrifícios que as colónias têm feito pela metrópole, que roça pela ordem de centenas de milhares de contos, nos preços políticos impostos aos seus produtos para abastecimento da metrópole por menos de metade do valor das suas cotações.
E nesta questão de princípios há ainda que analisar o decreto sob o seu aspecto jurídico.
Este diploma estabelece um princípio de arrecadação de dinheiros do património particular cuja- classificação não encontra cabimento dentro da nomenclatura da legislação em vigor.
Esta forma nem está na tradição nem na orgânica do nosso sistema tributário. Não é um imposto, porque não