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13 DE NOVEMBRO DE 1952 953

titucional em que as colónias estrangeiras, inglesas sobretudo, vão caminhando para a meta da independência, conduzidas pela mão tutelante das metrópoles europeias. A autonomia, em sentido rigoroso e próprio, exprime a estrutura constitucional daqueles territórios coloniais em que já se vislumbram, com maior ou menor nitidez, um parlamento e um governo próprios, que detêm, a bem dizer, a plenitude das atribuições legislativas (ordinárias) e executivas, conservando a metrópole apenas, quanto às primeiras, o direito de veto e, quanto às segundas, a chefia do governo, por intermédio de um governador por ela nomeado. Este governo é designado de acordo com o predomínio relativo das várias correntes de opinião representadas no parlamento da colónia e está na dependência da sua confiança. Estamos perante um Estado in fieri, um embrião de Estado independente, do modelo democrático-parlamentar. A autonomia vem a ser a exportação para as colónias das instituições parlamentares metropolitanas.
Nada disto cabe no sistema do projecto, nem expressa nem implicitamente. Os conselhos de que se está falando não detêm a plenitude da competência legislativa para o território considerado. Parte da legislação a vigorar no território emana de órgãos legislativos metropolitanos; a competência legislativa dos conselhos ê exercida sob a superintendência e fiscalização da metrópole, que, portanto, se lhes pode inclusivamente substituir; na província não há um governo colegial, constituído de acordo com as correntes de opinião representadas no conselho e dependente dos seus votos: há, antes, um governador, com a plenitude das funções executivas, representando nela a autoridade do Governo de Lisboa e só dele dependente.
O nosso sistema é, pois, uma construção original, com a virtude de dar relevo aos interesses e à opinião pública local, sem comprometer a unidade política de todo o território português. Trata-se de um regime de legislação descentralizada (com um antecedente no antigo regime, quanto ao Estado da índia), que exprime mera necessidade administrativa (lato sensu) e não compromete a unidade política da Nação Portuguesa.
Mantemo-nos fiéis, nestes meados do século xx, à concepção clássica portuguesa em matéria de política e administração ultramarina, sem deixar de dar tradução às novas realidades e às novas exigências sociais 6 políticas, que impõem a intervenção directa dos colonos e dos naturais de cada território na regulamentação e disciplina dos seus próprios interesses: conciliamos os comandos do passado com os imperativos do presente - e, não negando nem uns nem outros, caminhamos calmamente pela senda do futuro, que outros povos colonizadores percorrem em sobressalto, vendo esboroar-se-lhes nas mãos os seus impérios.

3. Se, pois, merecem o aplauso da Câmara Corporativa as ideias dominantes do projecto, já se não pode dizer o mesmo da sistematização que nele se adoptou, a qual lhe parece extremamente deficiente. Para só aludir ao fundamental, a -Câmara Corporativa chama a atenção, em primeiro lugar, para o facto de no projecto se contrapor (título II) organização geral a organização provincial (título III), expressões que se não opõem uma à outra. O que parece ter estado na mente do Governo é o binómio administração central-administração provincial.
Como quer que seja, o projecto não se mantém fiel às epígrafes escolhidas para estes dois títulos e alude a aspectos de organização provincial no título respeitante a organização geral. Assim: alude aos órgãos legislativos provinciais e versa, sob a epígrafe de « administração geral», o essencial da matéria respeitante aos serviços públicos provinciais (que em parte ó depois tratada no título respeitante à organização provincial) e ao respectivo funcionalismo.
No título respeitante à organização geral aparece-nos um capítulo sobre os tribunais, embora não se saiba bem como aí possa caber. E no respeitante à organização provincial, que só às províncias deveria dizer respeito, surge-nos um capítulo sobre as autarquias locais, isto é, sobre a organização local em sentido estrito.
Se, por outro lado, atentarmos nas divisões dentro dos títulos do projecto e na distribuição das matérias por cada uma dessas divisões, mais e mais nos sentiremos descontentes com a sistematização adoptada. Assim, e para só reparar no mais saliente, no título I, relativo aos princípios fundamentais (entenda-se: da administração ultramarina), não encontramos, a bem dizer, nenhum desses princípios. Na capítulo I do título II, respeitante ao sistema legislativo, aparece-nos, de passagem, uma alusão ao Conselho Ultramarino, como se este órgão tivesse que ter apenas funções legislativas. Aí se trata, por outro lado, da aplicação no ultramar dos diplomas em geral, não só, portanto, dos diplomas legislativos, antes também dos diplomas regulamentares. No capítulo vi do título III, por último, as respectivas secções são dispostas por uma ordem ilógica.
De um modo geral, pode dizer-se que o projecto não respeitou, no ponto de vista sistemático, nem as lições que se poderiam colher da consulta da legislação anterior do mesmo género, nem as sugestões que se podem retirar da ciência do direito administrativo colonial.
A Câmara Corporativa entende, por consequência, ser seu dever ordenar as matérias do projecto de proposta que lhe foi submetido de maneira inteiramente diversa.
Antes de mais, cuida que os preceitos da nova lei devem dispor-se em bases, não em artigos. O propósito do legislador é, claramente, o de estabelecer as linhas gerais, o esquema, o regime geral do governo das províncias ultramarinas, a completar por vária legislação da competência, predominantemente, do Ministro do Ultramar. O que o projecto nos apresenta, e na forma em que o faz, não são artigos, são bases, a desenvolver, na maior parte, em legislação complementar.
A divisão fundamental em títulos, perfilhada pelo projecto, deve ser substituída pela divisão em capítulos, já que naqueles não conseguiu o Governo englobar matérias subordináveis à mesma epígrafe comum. A divisão em capítulos é mais flexível e permite, por isso, uma disposição sistemática das matérias muito mais satisfatória.
Um capítulo inicial tratará do território do ultramar português e da sua divisão administrativa em províncias. No segundo capítulo enunciar-se-ão os princípios gerais relativos à administração ultramarina. Dir-se-á, no capítulo III, da administração central do ultramar; no capítulo IV, da administração provincial, e no capítulo V, da administração local. Em rigor, da administração financeira se deveria fazer uma subdivisão do capítulo da administração provincial, mas a extensão do assunto e, pode dizer-se, a tradição legislativa impõem que se lhe dedique um capítulo à parte, que será o sexto. A administração da justiça é também constituída por serviços provinciais, privativos ou comuns, e deveria rigorosamente ser tratada naquele capítulo, mas a mesma tradição manda versá-la em capítulo separado. E o que se fará no capítulo VIII. Os princípios gerais da administração ultramarina, de que tratará o capítulo II, são desenvolvidos e pormenorizados ao tratar-se, no capítulo viu, da ordem económica e social das províncias ultramarinas. Assim um pouco como as constituições modernas deixaram de ser exclusivamente documentos em que, à parte a enunciação dos direitos