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13 DE NOVEMBRO DE 1952 955

Aproveite-se o ensejo para pôr a dúvida seguinte: será lícito que a Assembleia Nacional legisle para todo o território nacional ou sobre matérias comuns à metrópole e a alguma ou algumas províncias do ultramar?
É que, pelo monos à primeira vista, parece que nas últimas alterações à Constituição se lhe retirou competência para, a par com o Governo, expedir legislação geral ou comum para a metrópole e para as províncias ultramarinas e para regular matérias de interesse comum da metrópole e de alguma ou algumas das províncias ultramarinas. Na verdade, a Constituição (artigo 150.º, n.º 2.º) fala em que a competência para legislar nestes casos pertence ao Governo, cabendo à Assembleia reservadamente as matérias a que alude o artigo 150.º, n.º 1.º
Poderia dizer-se, em abono desta interpretação, que provavelmente o legislador constitucional entendeu dever a Assembleia ficar com competência privativa para legislar em certas matérias que, não obstante a sua alta importância, «não exigem, em regra, estudo especializado» e podem, por isso, ser entregues à ponderação de «um órgão sem cultura profunda dos problemas coloniais .
Esta orientação tinha sido expressamente abandonada em 1945 pela Lei n.º 2:009, que, dando nova redacção ao corpo do artigo 28.º do Acto Colonial, distribuiu pela Assembleia Nacional e pelo Governo a competência para legislar, respectivamente sob a forma de lei e de decreto-lei, em matérias de interesse comum da metrópole e de todas ou de alguma colónia.
Desde que a Assembleia Nacional se mantenha, tanto quanto possível, dentro do critério de se restringir à aprovação das bases gerais dos regimes jurídicos, e desde que a iniciativa legislativa caiba, nesta hipótese, ao Ministro do Ultramar, e não a qualquer Deputado, não parece, de jure condendo, que lhe deva ser vedado legislar para o ultramar de todas as vezes que se trate de normas a aplicar a todo o território nacional ou da regulamentação de matérias de interesse comum da metrópole e de alguma ou algumas das províncias ultramarinas. De resto, não há razão para considerar o Governo, no seu conjunto, mais do que a Assembleia, constituído por técnicos de administração colonial, a ponto de só ele ser qualificado para intervir na feitura da legislação comum ou de interesse comum.
Como chegar, porém, legìtimamente, a imputar ao legislador de 1951 o propósito de assim repartir a competência legislativa entre o Governo e a Assembleia, tendo pela frente o obstáculo grave constituído pela letra do artigo 150.º, n.ºs 1.º e 2.º, da Constituição?
Não se encontram elementos de elucidação do problema nos trabalhos preparatórios conhecidos. A discussão parlamentar é omissa neste ponto. A interpretação que nos conduz à solução expressamente consagrada antes da Lei n.º 2:048 pode, porventura, basear-se no preceito do artigo 91.º, n.º 1.º, da Constituição, considerando-o de direito constitucional comum à metrópole e ao ultramar. Por força dele, a Assembleia Nacional poderia legislar para a metrópole e ultramar ou regular matérias de interesse comum da metrópole e de alguma ou algumas províncias ultramarinas. Esta interpretação importaria, porém, que se considerasse lícita a iniciativa de qualquer Deputado, nos termos do artigo 97.º da Constituição, e essa solução não é augurável, embora seja a do direito anterior.
E natural que, à falta de texto favorável, e dadas as necessidades da prática, um «costume constitucional» se venha a formar no sentido de tal legislação ser lícita, embora apenas em seguida a propôs! as do Ministro do Ultramar.
ARTIGO 4.º

7. I - Este número é a reprodução do n.º 3.º do artigo 151.º da Constituição. Nele se dá o critério com base no qual se delimita a competência legislativa do Ministro do Ultramar. A Constituição, depois de se referir a todas as matérias do certo tipo, remete para a lei orgânica para efeitos de nesta se fazer a especificação dessa competência. Isto significa, segundo parece, que cabe ao legislador ordinário definir ou especificar quais são as matérias que representam interesses superiores ou gerais da política nacional no ultramar e quais são as matérias que devem considerar-se comuns a mais de uma província ultramarina.
Isto não quer dizer que o Ministro do Ultramar não possa de todo legislar em matérias diferentes destas, de interesse menos elevado e de alcance menos amplo, que a lei remete para a competência dos órgãos legislativos locais. Fá-lo-á, então, em nome do seu poder de superintendência, que lhe permite substituir-se a esses órgãos, e, de qualquer modo, sem sanção (artigo 150.º, § 3.º).
À lei orgânica compete, pois, especificar aquilo que na Constituição se traduz por uma «cláusula geral». Não tem que reproduzir esta cláusula: há apenas que dar-lhe execução. O n.º I deve, por consequência, ser eliminado.
II - É nas alíneas deste número que o projecto de proposta de lei orgânica procede à especificação da competência legislativa do Ministro do Ultramar. Repare-se, sobretudo, na falta de referência à matéria dos n.OS 1.º, 7.º, 9.º, 10.º e 11.º do artigo 10.º da Carta Orgânica, que dispunha sobre este mesmo assunto. Para todas as omissões há explicação, excepto para a primeira e para a última. Sobre o n.º 1.º dir-se-á mais adiante, na alínea A). Vejamos neste momento quanto aos restantes.
Ao Ministro não pode hoje caber a legislação sobre a organização militar colonial porque se unificou essa organização e a das forças armadas metropolitanas. Não lhe cabe regular o regime monetário e fiduciário das províncias ultramarinas porque essa competência foi transferida para a Assembleia Nacional (artigo 150.º, n.º 1.º, da Constituição). O mesmo se dirá sobre o Estatuto Judiciário do Ultramar, uma vez que, por força do mesmo artigo, a organização dos tribunais cabe exclusivamente à Assembleia. Quanto à aprovação dos empréstimos que não exijam caução ou garantias especiais, de montante superior a certo limite, é que não há razão para que se lhe não faça referência na especificação por este n.º 2.º empreendida. Não se diga que não é matéria legislativa, pois que a autorização de empréstimos ao Executivo é da tradicional competência de órgãos legislativos (cf. Constituição, artigo 91.º, n.º 5.º).
a) Já a Carta Orgânica, nos n.ºs 5.º, 6.º e 8.º do artigo 10.º, especificava matérias deste género, mas realmente não todas as que se impunha referir. (Matérias deste melindre devem ser colocadas de facto fora da competência dos órgãos legislativos locais.
b) As matérias a que esta alínea alude devem considerar-se, efectivamente, senão de interesse superior ou geral da política nacional no ultramar, ao menos matérias comuns às províncias ultramarinas. Pelo que respeita às pessoas colectivas de utilidade pública administrativa (as antigas corporações administrativas), o respectivo regime será, normalmente, traçado nos quadros mais latos do regime administrativo geral das províncias ultramarinas, da competência do Ministro. De qualquer modo, há a notar que as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa são, elas próprias, organismos corporativos morais ou culturais e não têm, por isso, de ser mencionadas à parte.