974 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 163
provincial» ou «repartição provincial» pela «secretaria-geral», para superintender nos negócios de administração civil. É certo que já tivemos, no século passado, secretarias-gerais, por força da lei orgânica de 1869. Mas as secretarias-gerais de 1869 eram verdadeiramente secretarias para o expediente da generalidade dos negócios públicos provinciais. A lei de 1914 transferiu esse expediente para secretarias distintas, tendo os funcionários delas encarregados o nome de chefes de serviços da colónia, agentes imediatos do governador na administração dela. Desapareceu, a partir daí, o organismo «secretaria-geral» e não pode pensar-se em restaurá-lo com a índole inicial, dada a magnitude actual dos negócios do governo de cada província. A «secre-taria-geral» do projecto não é, por isso, mais do que uma secretaria ... especial, uma direcção ou repartição central, ao lado das outras, mas diferentemente «baptizada». Haverá vantagem nesta modificação meramente terminológica?
Supomos que não, apesar de o projecto curar de pôr esse organismo a tratar do remanescente de assuntos e serviços, fora da superintendência das restantes secretarias. Note-se, porém, que, sem mudar o nome ao organismo, pode ele perfeitamente tratar do que for comum a todos os serviços, assim como pode superintender em serviços de restrito desenvolvimento. Aliás não se vê por que razão só esta secretaria, e não as restantes, há-de poder reunir tais serviços, quando é certo que podem ter muito mais afinidades com qualquer destas últimas.
A aprovação do projecto neste ponto conduziria, para mais, a uma completa descaracterização da figura do secretário-geral, tal como hoje existe na administração ultramarina. Como bem se sabe, esta figura foi restaurada pela Lei n.º 2:016, não no plano dos directores ou chefes de serviços, mas no plano governativo propriamente dito, com vista a aliviar os governadores (de Angola e de Moçambique) do absorvente despacho respeitante a todos os departamentos colocados na sua dependência. A necessidade de uma espécie de vice-governador nessas duas províncias e porventura também no Estado da índia, pequeno em extensão mas pleno de dificuldades governativas, não é satisfeita pelo projecto, uma vez que reduz de categoria e Junção o actual secretário-geral.
E diga-se, a propósito, que, em relação às províncias de governo simples, é necessário inscrever na lei orgânica um artigo do teor do artigo 102.º da Carta Orgânica, segundo o qual o governador, por meio de portaria publicada no Boletim Oficial, e tomando a responsabilidade de tudo, poderá delegar nos directores ou chefes de serviços a resolução de negócios administrativos que por estes devem ser tratados.
Para finalizar a apreciação deste artigo, note-se que a Carta Orgânica previa organismos especiais de direcção e coordenação dos serviços militares, como serviços provinciais. Estes serviços são hoje parcelas de serviços nacionais, que como tais são dirigidos de acordo com o disposto em diploma especial.
Quanto aos serviços autónomos e aos organismos provinciais de coordenação económica, têm formas especiais de direcção, através das quais mantêm contacto com o governador.
ARTIGO 52.º
54. Este preceito dispõe, além do mais que se não contesta, que, normalmente, a comunicação oficial entre a metrópole e as províncias ultramarinas se fará por intermédio do Ministério do Ultramar. Isto significa que nem outros Ministérios, nem qualquer organismo público, poderá corresponder-se oficialmente com o governo de qualquer província ou com organismo público desta que não seja através do Ministério do
tramar. Eis no que, porém, se não vê qualquer vantagem. O que apenas interessa dispor - e está disposto na Carta Orgânica - é que a correspondência oficial da província, do seu governo, de qualquer organismo público ou de qualquer funcionário, com a metrópole, passe normalmente pelo governador e pelo Ministério do Ultramar. Assim se preserva a hierarquia no ultramar e a subordinação do governador ao Ministro. Ressalvam-se, naturalmente, as hipóteses das várias alíneas do n.º III.
A Carta Orgânica exceptuava os funcionários que fossem membros da Assembleia Nacional da regra de que nenhum funcionário em serviço na colónia poderá corresponder-se directamente com o Governo Central. Tal excepção não aparece agora no projecto, e parece que com boa razão. Na verdade, fora dos períodos de funcionamento efectivo da Assembleia Nacional (durante estes os funcionários que forem Deputados não podem, aliás, exercer os respectivos cargos), não há justificação para que os funcionários Deputados à Assembleia Nacional estejam, quanto a esta regra, em posição diversa da dos restantes funcionários.
A alínea a) do n.º III corresponde à alínea c) do § 2.º do artigo 103.º da Carta Orgânica, com leve diferença de redacção, sem alcance prático.
A alínea b) corresponde à alínea b) desse mesmo § 2.º, com esta importante diferença: de ora avante os funcionários a que o preceito alude correspondem-se directamente com o Ministro, sem obrigação de informarem o governador, não apenas quando em missão oficial, mas antes, de um modo geral, quando em serviço de inspecção.
A Câmara concorda com que se assegurem, como deste modo se faz, os meios de dar independência aos inspectores superiores, embora, em contrapartida, acentue que é este um cargo que só pode ser ocupado por pessoas da maior competência e isenção.
A alínea c) corresponde de certo modo à alínea d) do mencionado § 2.º, mas vai mais além, dispondo, de um modo geral, para todos os serviços nacionais. A este propósito parece bastante prescrever que é lícita a comunicação oficial directa destes serviços com o Ministério respectivo, nos termos da legislação especial que lhes diga respeito (como é o caso, para os- serviços militares, com o Decreto-Lei n.º 37:542, de 6 de Setembro de 1949). Os organismos de coordenação interministerial a que a alínea, por último, se refere, não têm propriamente que ver com o assunto da correspondência.
CAPITULO VI Património e regime financeiro
SECÇÃO I
Direitos patrimoniais
ARTIGO 53.º
55. O capítulo VI do título da Constituição respeitante ao ultramar português, que versa sobre o regime financeiro, começa com um artigo, o 165.º, respeitante à personalidade colectiva das províncias ultramarinas. O projecto de lei orgânica em apreciação, por seu turno, inicia também a matéria respeitante à administração financeira das províncias ultramarinas (designação da Carta Orgânica substituída desnecessariamente pela de «património e regime financeiro») por um artigo, o 53.º, sobre o mesmo assunto.
Este artigo, numa sistematização rigorosa, deveria estar colocado no capítulo respeitante aos princípios gerais da administração ultramarina, como, aliás, sucedia na Carta Orgânica. Mas não há desvantagem especial em que se inclua na divisão em que se encontra.