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304 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 179

tado da Agricultura, engenheiro Homem de Melo, que quiseram conhecer em pormenor o quadro de desolação c de miséria provocado por aqueles extensos mantos arenosos que, das bocarras escancaradas das motas do rio, rolaram sobre extensas terras de cultura, sepultando para sempre a esperança de tantos pobres agricultores e proprietários que delas viviam; tenho acompanhado as medidas terapêuticas de urgência emanadas daquele ilustre Ministro e que lhe granjearam gratidão inesquecível no coração daquelas pobres gentes. Mas nem por isso devo deixar de levantar de novo o problema nesta Assembleia, no momento em que se aprecia o Plano de Fomento.

A ameaça constante destes campos, a causa principal do seu aniquilamento progressivo é a erosão acima da Portela, que arranca de toda a bacia hidrográfica do Mondego boa parcela de terreno das montanhas e de bom e produtivo terreno de cultura.

Concorrem para isso os montes íngremes e escalvados, exibindo os seus esporões, agulhas e castelos de rochas, como atestado permanente da acção constante e da violência dos elementos erosivos, e as encostas de ravinas profundas, de terra movediça, remexida pela acção do homem, que, no teimoso esforço do arrastar dela produtos para o seu sustento, assim auxiliará a acção das enxurradas, montes e ravinas do interior, que contrastam flagrantemente com os plainas extensos do litoral para onde são carreados esses preciosos terrenos.

O Mondego tem, além disso e da extensíssima bacia hidrográfica, que mede 6700 km3 -a segunda em vastidão das bacias hidrográficas dos rios que nascem em Portugal-, um regime torrencial que condiciona ente arrastamento em massa de tão volumosa quantidade de detritos.

Nasce o Mondego a mais de 1400 m de altitude, no berço mais alto que o solar português lhe podia oferecer, e lá em cima, na sua origem, é um riacho pequeno e insignificante, a um rio piegas» - tão pequeno e tão insignificante que o povo o baptizou justamente de Mondeguinho! Assim se arrasta durante importante parte do seu percurso; mas, mal saído dos contrafortes alcantilados por onde se esgueira, toma vulto e beleza, «todo o seu caminho será uma sucessão cinematográfica de quadros diferentes, verdadeiras maravilhas que fizeram dele, em todos os tempos, o rio da beleza», o rio dos poetas. Ele lá vai, caminho em fora. «saltando e brincando, como zagal brincalhão, até atingir Coimbra, onde chega por entre laranjais e salgueirais, que lhe realçam a beleza e o encanto e a que devemos as mais belas horas de inspiração dos .nossos poeta.", para depois entrar na planície encantadora, a caminho da morte, nessa fascinante cidade da Figueira da Foz!

Assim o viram Emídio Navarro, Fernandes Martins, Silva Teles e Armando Narciso. Nós, os que lhe sofremos as consequências da impetuosidade das suas enchentes, esquecemo-nos da sua beleza, para só o olharmos ora como elemento de fertilização, ora como causa de fome e de miséria de uma extensa e populosa área do Centro do País.

Nu fase inicial do «eu percurso tem 43 km em que a média do seu declive é de 23,5 por cento; logo, nos ]00 km seguintes, a média baixa para 3,6 por cento; nos 37 km que vão da foz do Dão à Portela, anda por 1,5 por cento, e abaixo da Portela, até à Figueira da Foz, o declive é mínimo, de 0,4 por cento.

São aqueles montes graníticos e pré-cúmbricos da parte mais interior da bacia do Mondego e dos seus afluentes, desprovidos 'de revestimento florestal, com pequena permeabilidade e grande declive, que não retêm a água das chuvas; são aquelas terras agricultadas das encostas íngremes, com terras movediças nas épocas

do seu percurso em gargantas apertadas que precipitam aquela grande massa de detrito» no leito do rio e que criam o seu regime torrencial, criando correntes caudalosas, as quais nas grandes cheias atingem 7 km por hora na parte mais alta e 2 km por hora abaixo de Coimbra e são elas. ainda que criam estas fantásticas diferenças de caudal, que vão de l m3, no pino do Verão, para 3 000 m3 nas grandes cheias, e são elas também que fazem com que qualquer chuvada o engrosse subitamente e que, por isso, as pequenas chuvadas do equinócio de Setembro criem sérios problemas na planície inundada.

O problema dos campos do Mondego, mais do que um problema regional, é um problema nacional de carácter económico, técnico e político que urge resolver.

Não quero maçar a Assembleia com pormenores sobre a fisionomia agrícola daquela região e sobre o valor económico daqueles compôs, nem demonstrar a necessidade de olhar urgentemente ,para eles, a sério e sem demora, numa visão conjunta, com medidas que tendam a corrigir e a deter as causas do mal. a fazer a profilaxia das constantes crises que a assolam, desta permanente ameaça de miséria e de morte. E não o faço porque W. Ex.ª têm todos a consciência desta necessidade.

Mas sempre pensei que com este Plano de Fomento viria a resolução deste tão importante problema.

E pensei-o porque sabia da existência daqueles dois projectos de solução; sabia do estado avançado em que se encontrada a execução do plano de arborização da bacia hidrográfica do Mondego e sabia do interesse do Governo por este assunto. Era, portanto, lógico esperar a sua incorporação no Plano de Fomento.

Eu sei bem as razões por que não foi escolhido nem uni nem outro projecto, ambos considerados prontos para executar pêlos organismos que os elaboraram, aquando do aviso prévio do comandante Morna, em 1938.

Mas, fosse pelo que fosse, vale a pena recordar aqui o que disse o Sr. Deputado Melo Machado, com aquela inteligência, experiência e bom senso que todos, lhe conhecemos: «Pois se há dois projectos, dois planos, tudo está perdido, porque não 'há forma de resolver questões entre repartições diferentes!».

Foi assim mesmo!

Por causa disto, ou porque de 1938 para cá, em catorze anos, não foi possível corrigir as deficiências ou os erros contidos nos projectos, continuamos sob a ameaça da ruína de unia das mais férteis zonas d« Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Em nome desses povos, que aqui represento, lavro o meu protesto contra esta forma de tratar uni assunto de tal importância, de cuja solução dependem a vida e a prosperidade de muitos milhares de famílias.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E peço ao Governo que determine que, pelas instâncias competentes, se ultimem com a maior urgência os trabalhos necessários e indispensáveis para a conclusão do projecto das obras destinadas a salvar da destruição completa os campos do Mondego - milhares de hectares de terreno precioso que estamos a deixar inutilizar continuamente, vale ubérrimo de outrora, onde as cinquenta sementes eram coisa corrente e onde agora estamos reduzidos a cinco!

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª dá-me licença ?

O que se me afigura indispensável é que se encontre um processo nosso contra a erosão, porque nessas encostas é inaplicável o processo americano conhecido.