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460 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 187

caso, termino com uma afirmação, de cuja sinceridade ninguém pode duvidar: nasceu-me uma alma nova! Louvado seja Deus!
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pacheco de Amorim: - Sr. Presidente: quando Fontes Pereira de Melo resolveu iniciar a construção dos caminhos de ferro, com a linha Lisboa-Santarém, não o quis lazer sem ouvir primeiro os pareceres das entidades mais representativas das forças vivas. Das respostas que recebeu é digna de menção a dum banco emissor do tempo, e não dos menos importantes, que disse ser de opinião contrária a tal projecto, e pela razão seguinte: o tráfego entre estas duas cidades estava a fazer-se pelo rio e, lançando contas ao seu rendimento, não daria para cobrir as despesas de tráfego do comboio projectado.
Opinião parecida, mas ainda mais sumária e decisiva, foi emitida no Parlamento acerca do projecto da linha do Norte.
Entre o Norte e Lisboa, disse-se, havia já uma diligência e era rara a vez que vinha cheia!,
Fontes não se deixou impressionar por estes argumentos e em Outubro de 1856 foi inaugurado o primeiro troço da linha do Norte - Lisboa-Carregado. E em Novembro do 1877 era aberto à exploração o último troço da mesma linha - Gaia-Campanhã. Logo nesse ano o número de passageiros transportados foi de quase l milhão (941 933) e o da tonelagem de mercadorias de mais de 300 000 t (301 076 t).
As receitas foram de 1:881 contos e as despesas do 570 contos - apenas 36 por cento das receitas.
Em 1881, ou seja quatro anos depois, o número de passageiros subia para mais de 2 milhões (2 187 836) e as mercadorias transportadas excediam as 700 000 t (731 812 t). As despesas foram de 41 por cento das receitas o esta percentagem manteve-se entre 40 e 51 por cento, pelo menos, até 1910. A crise veio muito depois.
Para dar uma ideia sumária da evolução do tráfego dos nossos caminhos de ferro, compararemos os principais dados em 1881, 1910 e 1951.
Os passageiros foram 2 187 836 em 1881; 10 765 835 em 1910; 46 932 000 em 1951.
Como nestes setenta anos a extensão das linhas triplicou, faz-se ideia mais exacta da evolução do tráfego de passageiros considerando os números correspondentes por quilómetro de linha, que foram respectivamente 1789, 5785 e 13145.
Nestes setenta anos o número de passageiros por quilómetro de linha foi multiplicado por 8.
É de notar, porém, que no número de passageiros de 1.ª e 2.ª classes há graúdo retrocesso em relação a 1910.
O grande aumento foi na 3.ª classe: 30 vezes mais em 1951 do que em 1881.
O transporte de mercadorias também aumentou por quilómetro de linha, pois passou do 598 t por quilómetro em 1881 para 970 t por quilómetro em 1951.
Parece que, dado o aumento do tráfego, tanto de passageiros, como de mercadorias, as receitas por quilómetro deviam aumentar mais rapidamente do que as despesas.
Mas sucedeu o contrário: as receitas aumentaram 70 vezes e as despesas 184 vezes!
A razão é simples. O tráfego por quilómetro do linha aumentou, de facto, e muito, mas as tarifas não acompanharam a desvalorização da moeda. Ao passo que a libra ouro multiplicou por 70 o seu valor, o preço dos bilhetes de 1.ª classe subiu apenas 26 vezes e o dos do 2.ª e 3.ª classes 23 vezes.
Foi desta desproporção, que se manifestou depois da grande crise de 1929, que nasceram as dificuldades financeiras dos nossos caminhos de ferro.
Pelo que fica dito, parece que a maneira de remediar a crise seria por uni aumento de tarifas. Impossível. Todos os serviços colectivos, com ou sem concorrentes, têm um óptimo de tarifas, para além do qual as receitas baixam.
E esse óptimo pode não dar para as despesas, mesmo em regime de monopólio.
Os caminhos de ferro têm agora a concorrência da estrada, o que lhes faz descer o óptimo de tarifas e de receitas.
Aliás, a solução foi já experimentada e não deu resultado. Houve um aumento de tarifas, um pouco antes da última guerra, que foi contraproducente.
Não podendo os caminhos de ferro vencer a crise pelo aumento do tarifas, outro meio foi experimentado : a redução da concorrência da estrada por meio da coordenação dos transportes.
Esta forma indirecta de protecção aos caminhos do ferro também não deu o resultado desejado e foi perturbadora do natural desenvolvimento da camionagem, que é um factor de progresso material e cultural como os caminhos de ferro.
Se estes constituem um indispensável serviço público, nacional e social, também o mesmo se dá com os transportes motorizados por estrada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Ambos servem o público no transporto do passageiros e mercadorias e servem o País em caso do necessidade. Ambos sustentam e dão trabalho a grande número de portugueses.
E, neste particular, os transportes por estrada, por serem susceptíveis de exploração por pequenas empresas, são muito mais úteis do que os caminhos de ferro. Por estas razões, preconizei na discussão na generalidade, o auxílio directo do Estado aos caminhos de ferro, e daqui dirijo um apelo a S. Ex.ª o Sr. Ministro das Finanças, a fim de que sejam revistas as tributações dos transportes motorizados por estrada, pois estou informado de que muitos camionistas têm perdido os seus haveres, que têm sido vendidos em hasta pública para pagamento dos impostos relaxados.
Há camiões de carga que têm de pagar por ano 60 contos de encargos!...
E o pior é que os que mais sofrem são justamente os pequenos empresários, que são socialmente os mais úteis. Eu sei que não é só o peso dos impostos que os esmaga e que lhes não é menos pesada a concorrência dos camiões e camionetas particulares, que pagam pouco mais de l conto e encobertamente transportam mercadoria alheia (apoiados).
Toda essa legislação precisa de ser revista à luz da experiência já colhida. Não só foi pouco eficaz para o fim que teve em vista, como foi socialmente prejudicial e economicamente embaraçosa para o público, que tem direito a colher livremente todos os frutos do progresso.
Dada a ineficácia, ou, pelo menos, a insuficiência, da chamada coordenação dos transportes, restavam duas hipóteses: ou deixar os caminhos de ferro entregues aos próprios meios, que o mesmo é dizer deixá-los vegetar em agonia lenta até de todo se extinguirem, ou dar-lhes auxílio bastante para os serviços se aguentarem.
Debaixo do ponto de vista puramente económico, um serviço que não paga extingue-se. Mas o problema do caminho de ferro não é meramente económico.
Vozes: - Muito bem!