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794 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 213

Refiro-me principalmente ao esforço desinteressado e extenuante na preparação do seu aviso prévio, que exigiu meses e meses consecutivos para estudar centos de processos nos vários Ministérios (apoiados). Acompanhou-o o Sr. Deputado Carlos Moreira, a cuja colaboração inteligente muito se ficou devendo neste trabalho verdadeiramente sobre-humano.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Depois da forma brilhante por que o ilustre Deputado Sr. Paulo Cancela de Abreu realizou o seu aviso prévio, o assunto ficou completamente esgotado. Nada há a acrescentar-lhe, a não ser, talvez, duas recordações: a do ambiente em que foi votada a Lei n.º 2 039 e a dos motivos que levaram o mais humilde componente desta Câmara a apresentar um primeiro projecto, que, depois de modificações justas e de alargamento notável, se transformou, por obra das comissões parlamentares e votação unânime da Assembleia Nacional, na referida Lei n.º 2 039.
Recordemos, pois: em Janeiro de 1949, quando da penúltima campanha eleitoral para a designação do Chefe de Estado, o candidato da oposição começou por proclamar que, se fosse eleito, concederia amnistia ampla aos seus correligionários vítimas dos movimentos políticos posteriores a 28 de Maio de 1926.
Em 12 de Janeiro, ao iniciar a minha colaboração modesta nessa campanha eleitoral, respondi a S. Exa., em carta publicada no Diário de Lisboa, que tal espécie de amnistia seria, nem mais nem menos, nova lei de excepção. Mais uma lei de excepção, além das muitas em que a demagogia fora fértil, visto que, afinal de contas, ora amnistia somente destinada aos amigos políticos de S. Ex.ª E eu entendia que mais alguma coisa havia a fazer em Portugal em matéria de esquecimento de lutas políticas: algo de completo e do imparcial, em que nem a palavra Monarquia nem a palavra República aparecessem, algo em que todos puséssemos, acima das preocupações de partidarismo, outra coisa mais alta e mais bela: a nossa qualidade de portugueses.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Votou a Assembleia Nacional a Lei n.º 2 039, em que não havia discriminação quanto a beneficiários. Mas o Executivo publicou o Decreto-Lei n.º 38 267, no qual, em vez de manter o pensamento político da Assembleia Nacional, veio a efectivar, pelo menos em parte, o pensamento político de S. Ex.ª o General Norton de Matos (risos), pois os maiores beneficiários foram precisamente aqueles a quem o candidato oposicionista se referia, isto é, os que se revoltaram posteriormente a 28 de Maio de 1926!

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Nada me repugna, absolutamente nada, que eles tenham aproveitado dessa lei. Era-lhes também destinada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pelo contrário, desejaria que tivéssemos conseguido ir mais longe o que, em vez de colocarmos esses nossos antigos adversários na situação de inactividade, reserva ou reforma, os trouxéssemos ao convívio dos demais funcionários civis e militares e lhes restituíssemos direitos plenamente iguais aos destes, porque só assim se poderiam apagar completamente os «últimos vestígios de discórdias passadas», a que alude o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 38 207.
Em vez de apagá-los, a execução do decreto veio talvez avolumar a recordação de tais lutas. Quanto aos restantes, quanto às vítimas anteriores a 28 de Maio de 1926, não sei como pode explicar-se ou admitir-se que elas tenham sido relegadas a plano de inferioridade tão notável e tão absurdo.

Vozes:-Muito bem, muito bem!

O Orador: - E possível que, uma vez mais, se tivesse querido pôr à prova a sua capacidade de resistência espiritual ou exaltar-se o seu sacrifício e a fidelidade constantemente demonstrada ao Estado Novo, situação política que lhes deve grande parte da sua preparação, quer revolucionária, quer doutrinária, e pela qual, durante vinte e sete anos seguidos, vêm praticando actos da maior abnegação pessoal e política. Temo-los tido ao nosso lado em todas as emergências de perigo, quer militar, quer de ordem pública, quer ainda em matéria eleitoral. Não sinto a consciência tranquila porque as reintegrações ou restituições de direitos que lhes continuamos negando já há muitos anos, quer antes quer depois do 28 de Maio, foram concedidas a outras vítimas exactamente iguais, justamente colocadas hoje em altas situações políticas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Teria sido receio de dize tu, direi eu? Porque a maior parte dessas vítimas são homens que nunca quiseram abdicar, honradamente não quiseram abdicar, da sua qualidade de monárquicos ? Não acredito.
Há muito tempo que o Estado Novo, logo mesmo no dia 27 de Maio de 1926, devia ter agido da mesma forma por que procedeu Sidónio Pais, reintegrando imediatamente nos seus cargos todos os homens que tinham contribuído com o seu sacrifício para o estado de espírito que gerou a revolta militar chefiada por Gomes da Costa e Mendes Cabeçadas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não se fez então, nem se realizou até hoje. Temos deixado que vão morrendo pouco a pouco, uns talvez na miséria, outros na dor, a maior parte em consequência da idade, mas sempre sem compensação dos muitos anos de desilusões e desenganos.
Quando algum dia quisermos fazer justiça, talvez tenhamos que fazê-la apenas a fantasmas, porque não houve coragem de a realizar para homens vivos.
Sempre tive a honra do ser republicano, e sempre, acima dessa honra, senti aquela ainda maior de abraçar nas horas de perigo os monárquicos bons portugueses, cuja política tem sido desde há muitos anos o mais lindo exemplo de sacrifício, a mais bela obra de colaboração patriótica.
Por isso nenhum receio tenho de que venham a chamar-me monárquico por aqui lhes dar a minha solidariedade mais completa, na certeza de que, assim, só lhes pago parte mínima do muito que têm feito pela Nação.

Vozes: - Muito bom, muito bem!

O Orador: - E que dizer dos inválidos de guerra?
No discurso que pronunciei na sessão desta Assembleia de 21 de Abril de 1950 está tudo quanto penso.
Entretanto, mais convincentes que as minhas palavras de então foram, com toda a autoridade, as do presidente da Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, Sr. Deputado General Craveiro Lopes.