O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

21 DE MARÇO DE 1953 1007

dade da intervenção e justificativo das soluções adoptadas. O trabalho dessa comissão, como também já anotei, enquadrar-se-á facilmente no conjunto dos problemas postos ao exame de VV. Ex.ªs

D) Aspectos especiais do seguro doença

No seguro doença, há aspectos especiais a considerar quanto à forma e às condições da sua prestação, aspectos que se põem independentemente dos problemas, atrás examinados, de regimes financeiros, esquemas de benefícios e estruturas administrativas, isto é, que nos aparecem dentro de qualquer sistema de previdência social.

Alguns deles envolvem questões graves e delicadas, quer pelos seus inevitáveis reflexos na vida financeira das instituições, quer pelas suas vivas repercussões de natureza social (a que necessariamente levaria também, e piores, um eventual desequilíbrio financeiro). À sua roda, precisamente por isso, se tem levantado apaixonadas e intermináveis discussões, sem que se tenha podido encontrar até agora, neste mundo novo, inquieto e inexperiente da Previdência Social, uma plataforma de transigência ou uma solução ideal.

Diz a sabedoria popular que só se aprende bem a própria custa. A nossa aprendizagem (que, portanto, há-de ser a mais instrutiva) é ainda, incipiente. A aprendizagem dos estranhos (que, em iodo o caso, sempre nos será útil conhecer) também não tem a acreditá-la o saber de longos anos vividos. Estamos, torno a afirmá-lo em autêntica terra de experiência.

Como, porém, é indispensável continuar a abrir caminho e fazer o nosso próprio treino, não podemos deixar de tomar posição perante esses problemas, embora, sem o ar satisfeito de quem adquiriu certezas definitivas. A orientação, norteada naturalmente pelas nossas concepções doutrinárias, e pelas lições das realidades já conhecidas, está marcada nos princípios informadores do Decreto n.º 07 762, de 24 de Fevereiro de 19-30, ainda em vias de execução integral, e a ela havemos de encostar-nos.

Salientarei, a este propósito, os três seguintes pontos:

a) A Previdência Social não pode ter a preocupação de se independentizar com uma espécie de auto-suficiência de serviços para a realização do seu esquema de seguro doença e deve, em especial, através de acordos convenientes, procurar a colaboração dos serviços sanitários da assistência pública e privada normalmente destinados à generalidade da população.

Assim, por exemplo, os hospitais e os sanatórios erguidos pela iniciativa oficial ou particular para a satisfação das necessidades assistenciais do País e que, por isso, se destinam a receber todos os doentes!, pobres ou ricos, devem ser os estabelecimentos destinados também aos económicamente débeis da Previdência Social;

b) Temos como defensável que o beneficiário há-de intervir, em princípio, no custeio directo das prestações médicas e farmacêuticas. O beneficiário, sem ter a consciência disso, pode ser um dos maiores inimigos da Previdência Social se lhe falta a noção como falta muitas vezes- ide que tem de chegar a todos o que é de todos e de que se perde para uns o que os outros desperdiçam.

Seria psicologicamente desacertado, financeiramente perigoso e socialmente nocivo organizar a prestação do seguro doença com desconhecimento ou com menosprezo desta viva realidade.

O mais difícil aqui-e em tudo, afinal- é encontrar o meio termo adequado - a justa medida.

Dever-se-á levar sempre à couta do segurado uma percentagem do custo ida prestação? Na hipótese de resposta negativa, que casos deverão exceptuar-se? Para os demais casos a percentagem haverá de ser uniforme ou variável? E qual a taxa ou as taxas a estabelecer para este fim?
O problema, como se vê, desenvolve-se numa série de problemas, que é indispensável examinar com atenção e prudência;
c) Não são menos de ponderar os aspectos médico e farmacêutico da Previdência Social.
Para as soluções a buscar ou a rectificar em ambos estes aspectos, não obstante o que já se conhece das vozes reclamantes das interessadas, devem ser ouvidos os competentes organismos profissionais.
O acervo de questões postas neste domínio é muito delicado. Nós havemos de encará-las dentro de dois grandes princípios orientadores, a saber:
1.º A Previdência Social não quer suprimir a farmácia nem (passe o estrangeirismo) «asservir» a medicina; mas
2.º Não pode querer também que farmacêuticos e médicos partam do pressuposto de que a organização do seguro social de saúde, para os economicamente, débeis, é a descoberta feliz de saúde processo adequado para numerosa clientela modesta passar a ser considerada como algente de posses abastadas» e que nem sequer vê a conta, porque ... paga a Previdência Social.
Isto quer dizer que, dentro da liberdade possível, tem de haver disciplina e fiscalização. Também aqui somos pela concorrência, mas por uma concorrência disciplinada, e não pela livre concorrência.
Como se há-de ela estabelecer melhor? Esta é a grande questão.
O problema é sobretudo eriçado de dificuldades no aspecto médico, sobre o qual está já feito um estudo onde VV. Ex.ªs encontrarão elementos de grande proveito. As dificuldades resultam de particularidades próprias da medicina e também da formação e das naturais deformações profissionais ido médico. Como acertadamente observou alguém, o peso de tradições seculares e até certas exigências da profissão conduzem os médico», em geral, para um quase inconsciente individualismo sem nuances. Temos de contar com isto. Mas também aqui, apesar de tudo, havemos de ter confiança em que nos não faltará a boa vontade de muitos espíritos esclarecidos, a força que irá sendo dada pelo próprio uso ... de usos novos e a formação do sentido social, que à Ordem dos Médicos compete ajudar a fortalecer ou a criar.

VII) Nota final

Termino, que já não é sem tempo. E termino pondo mais uma nota, a nota final, para o «lastro comum» da nossa formação mental.
Nós somos todos pela Previdência Social. Mas não fazemos dela uma «(religião», do mesmo moído que, dentro dela, não aderimos à «seita» da saúde. Nem a Previdência Social é panaceia para adormecer todo o receio do risco (de si mesmo criador) nem a saúde é ídolo para fomentar «a sede de cuidados».
Antes dos benefícios proporcionados pela Previdência Social, interessa que os trabalhadores possam desfrutar da tranquilidade da ordem e, nesta, da fecundidade do trabalho, que dá o salário, e, com ele, além do pão (que é o mais necessário), a possibilidade da própria previdência social.
Nesta hierarquia de valoreis assim enunciada (o político, o económico e o social) se há-de enquadrar o nosso pensamento e realizar a nossa acção.
Lisboa, 4 de Fevereiro de 1953. - José Soares da Fonseca.