996 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 223
Não são mais encorajadores os casos dos elementos auxiliares de diagnósticos indicados no aviso prévio. Assim:
1.º O Ministro e a actual direcção da Federação encontraram quase apto a funcionar, em Lisboa, um laboratório privativo de análises clínicas. Em obediência a um princípio orientador, extinguiu-se o laboratório - com sacrifício de capitais investidos e de indemnizações contratuais anteriormente estipuladas. Os médicos analistas de Lisboa, aos quais é entregue todo o trabalho de análises da Federação, não ofereceram dificuldades em aceitar, por sua vez, a tabela de preços que lhes foi proposta - e desta forma se está a proceder. Não tendo havido apelos para a Ordem, esta mio interveio na questão e, portanto, não apoiou nem desapoiou o procedimento havido (ainda que se conheçam casos de intervenções suas «espontânea»» - até para protestar contra tabelas já plenamente acordadas com médicos e, às vexes, em comissões de que fazia parte um representante da Ordem dos Médicos).
Pois, não obstante a singela clareza do facto que deixo apontado sobre análises dos beneficiários da Federação, o aviso prévio pôde erguer a acusação de que existe a «ameaça dos serviços privativos (...) analíticos»!
2.º Para a radiologia, o Ministro e a actual direcção da Federação encontraram criado um serviço no Porto, embora ainda sem funcionar - mas tenho já prestes a ser instalado um aparelho e estando à espera da chegada de outro, então recentemente adquirido. Encontraram também entregue aos Hospitais da Universidade de Coimbra e a outros hospitais da província o monopólio dos trabalhos radiológicos da Federação - nem sempre em condições... .medicamente aceitáveis.
Extinguiram-se estes monopólios e regressou-se ao regime de procurar a iniciativa privada, distribuindo-se o serviço por todos os radiologistas das aludidas localidades e procurando-se mesmo (como, de resto, em Lisboa ou no Porto) fomentar o estabelecimento de novos consultórios particulares de radiologia. Por sua vez o aparelho existente no Porto não chegou a ser desencaixotado e a compra do outro foi anulada, com o natural prejuízo da indemnização costumada.
Será isto uma «ameaça», como se diz no aviso prévio, de «serviços privativos radiológicos»?
Entretanto, porém, verificou-se que, não obstante todos os esforços empregados para diminuir ... o «pesadelo» da, tesouraria com exames radiológicos, estes estavam ainda a custar à Federação, só em Lisboa e Porto, cerca de 8 500 contos. Para acudir à gravidade do problema a Federação procurou, dentro da indiscutível seriedade dos seus processos, organizar também aqui uma tabela, de preços, que propôs aos radiologistas de todo o País. E em todo o País se está a praticar a tabela, salvo em Lisboa, e Porto - onde os radiologistas, unidos por uma espécie de juramento de Hipócrates (um fechado «compromisso de honra»), se recusam, conforme expressão do u viso prévio, a «baratear os (seus) actos médicos».
Procuraram-se todos os meios de evitar esta falta, de colaboração de ... iniciativa, privada. O próprio Ministro fez, talvez dezenas de vezes, de assistente social da Ordem dos Médicos e da sua secção de radiologia. Tudo em vão!
Houve radiologista que chegou a alvitrar, para se vencer o «pesadelo» da tesouraria da Federação, que se deixassem passar dois anos sem tirar radiografias - solução que, do mesmo passo, seria incompreensível para os beneficiários, negaria o próprio valor deste elemento auxiliar do diagnóstico e causaria, talvez, a morto dos radiologistas ... economicamente débeis (alguns dos quais se abalançaram à compra de aparelhagem, confiados no serviço da Federação).
Houve consultório que dizia poder provar, com a escrita à vista «(confiada a um guarda-livros privativo), os graves prejuízos que sofreria se recebesse um centavo a menos de 800 contos anuais, como estava a receber pelo mesmo serviço até ali habitualmente executado. Parece, no entanto, que só o exame das contas ... na Federação levou a apurar que o guarda-livros (Deus lhe fale na alma!) viciava a escrita.
Houve quem julgasse perfeitamente defensável que estabelecimentos oficiais ou quase oficiais entregassem a seu abundante serviço de radiologia, em regime de monopólio, a um ou dois radiologistas, mas considerasse perigosamente socializante que a Federação procedesse de idêntico modo (para vencer as dificuldades que lho estavam a ser criadas), entregando, eventualmente o seu serviço de radiologia a três ou quatro radiologistas procurados na província.
Porque instituições particulares, com consultores privativos de radiologia, se mostraram dispostas a trabalhar para a Federação pelos preços da tabela proposta, houve quem actuasse em ordem e tornar impossível esta solução (de resto, naturalmente precária).
Porque, passados longos meses de luta inglória, se fez anunciar que não haveria mais ... remédio do que montar serviços próprios ou montar serviços para serem entregues, em regime de amortização, a radiologistas da província dispostos a virem para Lisboa nestas condições e se fizeram publicar anúncios de concurso para a compra de aparelhagem, houve quem se sentisse coagido - a concorrer encobertamente, por ... interposta firma.
Não vale a pena carregar mais o quadro, que já tão carregado se mostrava lios esclarecimentos fornecidos pela Federação e aqui juntos em anexo - onde se fala em autênticos «subsídios de greve» aos radiologistas «cuja situação se ia tornando cada vez mais embaraçosa e que, por isso, recalcitravam è com razão».
Acrescentarei apenas que, fatigado da inutilidade das minhas intervenções -pessoais, procurei que a direcção da Ordem dos Médicas tratasse do assunto, sem intermediários, com & direcção da Federação. Mas também isto foi impossível de se conseguir. A direcção da Ordem preferiu, designar para p efeito a sua comissão de radiologia, e esta, naturalmente, buscou todos os processos dilatórios para, tal como antes, se não obter uma solução.
Vai passado «mais de ano e meio na roda do mar» encapelado da radiologia, em Lisboa e Porto. Contudo, por amor doutrinário a outras soluções, por deferência pessoal para com o Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos e por teimosamente querer esperar na vinda de melhores dias, a ameaça dos serviços privativos nunca se executou. Não se comprou qualquer aparelho de radiologia e o existente no Porto continua fechado na tranquilidade inútil dos caixotes.
Ao fim e ao cabo o aviso prévio pôde lançar a acusação de que a Federação, que «já intentou erguer hospitais próprios» (qual ... federação?), «quer agora impor a criação de serviços de radiologia ». simplesmente «em defesa da sua burocracia»!
A direcção da Ordem dos Médicos, apoiando e encorajando, como o tem feito até agora, o movimento colectivo dos radiolistas de Lisboa e Porto contra a Previdência Social, está na linha habitual do seu procedimento. Mas transforma aquele organismo corporativo de «areópago sereno que devia ser» (a cuidar, sobretudo, dos interesses culturais e morais da profissão - das mais altas e mais nobres) em «braço secular» ao serviço de doutrinas peremptas do mundo liberal e contra os «progressos da protecção social».