18 DE ABRIL DE 1956 835
No entanto está hoje calculado que mais de 4000 nativos se empregam com maior ou menor regularidade ao serviço das roças como operários, enfermeiros, escriturários, condutores de automóveis, etc., e como trabalhadores agrícolas, tomando os trabalhos nas plantações por empreitada.
Sempre foi necessário, e continuará a ser, contratar trabalhadores agrícolas noutras províncias ultramarinas.
E então todo o interesse e amparo pela agricultura para ela se desenvolver, aperfeiçoar e baratear a produção será uma constante que deveremos ter sempre presente em S. Tomé e Príncipe.
Nas medidas a tomar dever-se-á, portanto, considerar sempre os reflexos que delas resultarão, e que directa ou indirectamente tragam aumento do custo da produção, para evitar perturbações à economia da província.
A melhor das intenções que não atenda a esta constante, que domina, e sempre dominou, a economia das duas ilhas, arrisca-se a dar resultados contrários ao bem geral da província.
A secular administração de S. Tomé e Príncipe confirma, o que acabo de expor. E elevado o custo da produção nas explorações agrícolas da provinda, e sempre ali se registou este fenómeno, bastando para tanto que o comparemos com o custo dos outros países produtores de cacau.
Outra característica que diferencia a província é a existência de duas populações distintas: a população nativa, com carta de cidadania, que é fixa, ali residente e com os seus interesses ali criados; e a população natural doutras províncias ultramarinas, que temporariamente trabalha nas plantações das roças por meio de contratos de trabalho celebrados nas respectivas províncias donde é originária.
Ora, Sr. Presidente, a população dos nativos e a população temporária, contratada por três anos, por se encontrarem em situações diferentes, merecem cuidados diferentes e peculiares a cada uma.
Os cuidados crescentes com a população nativa, à medida que ela se vai desenvolvendo em número e civilização, estão incluídos no nosso código civilizador, constam dos nossos métodos tradicionais de colonizar e em tudo se identifica com a nossa vida metropolitana.
Quanto aos cuidados e atenções pela população temporária e contratada, dirigem-se no sentido do rigoroso cumprimento dos contratos, particularmente no salário, na alimentação, no alojamento e nas assistências médica e hospitalar, e deverão continuar a ser o timbre da nossa acção na província de S. Tomé e Príncipe.
Sr. Presidente: expostas assim as características especiais desta província ultramarina e ao que elas nos conduzem na sua administração, mais funil se torna interpretar os actos administrativos e as sugestões que se possam apresentar.
Seja-me, pois, permitido, Sr. Presidente, que aborde um assunto palpitante de interesse nacional e internacional, que diz respeito ao bem-estar da população flutuante e contratada.
É sem dúvida alguma assunto de capital importância para a economia da província e para o prestígio de Portugal a maior eficiência, que possa haver nos serviços de enfermagem, hospitalização e clínica médica e operatória destinados à população trabalhadora das plantações agrícolas.
Não deu o resultado que se esperava o sistema de zonas sanitárias que foi criado em S. Tomé e Príncipe, por ser hoje considerado menos profícuo e mais dispendioso.
O Sr. Ministro do Ultramar, Prof. Doutor Raul Ventura, para remediar alguns inconvenientes daquele sistema, teve de o substituir pelo Decreto-Lei n.º 40 195, de 21 de Junho de 1935, mediante regulamentação a ser elaborada.
Para a boa solução deste importante problema, que envolve o prestígio da Nação, todos as sugestões serão de aproveitar.
É nesse sentido que irei fazer algumas considerações e dar o meu contributo na medida das minhas possibilidades e do conhecimento que possa ter daquela província ultramarina.
Desde já devo dizer, Sr. Presidente, que o sistema das zonas sanitárias não foi ainda de facto suprimido, apesar de todos os seus reconhecidos inconvenientes e da aplicação do referido decreto-lei.
Como a alteração introduzida pelo Governo está dependente de diploma regulamentar e este ainda não foi publicado no Boletim Oficial da província, resulta daqui que o sistema se mantém no estado anterior à publicação daquele decreto-Lei.
A posição das empresas agrícolas da província é de expectativa, na esperança de que, mais cedo ou mais tarde, a alteração ao sistema das zonas sanitárias, que foi introduzido pelo Governo, venha a ter a sua efectivação.
Porém, seja qual for a modalidade que se queira adoptar na assistência sanitária aos trabalhadores contratados e assalariados para serviços agrícolas das plantações, dever-se-á ter em atenção que será preferível atribuir ao Estado tumente a missão fiscalizadora. Lembremo-nos de que desde sempre esse serviço especial e particular de assistência sanitária foi prestado pelas entidades patronais ao seu pessoal trabalhador, embora regulamentado por disposições da lei.
O caso apresenta-se de tal maneira e até revestido de certos melindres e particularidades que só convém continuar entregue às empresas patronais, sob a fiscalização do Estado.
Para se obter toda a eficácia possível na assistência prestada aos trabalhadores agrícolas da província e por todas as razões internas e externas que se possam invocar, só encontro vantagens que ao Estado, pela Repartição do Serviço de Saúde e Higiene, seja cometido apenas o papel fiscalizador.
Sr. Presidente: este assunto da assistência sanitária aos trabalhadores contratados em S. Tomé e Príncipe é de extraordinária importância. O assunto é de tal natureza, que já em tempos passados trouxe dissabores a Portugal, provocados por industriais de chocolate doutro pais, e é por isso mesmo que não devo deixar o problema em suspenso ou simplesmente esboçado.
É minha intenção, ao esclarecer a Assembleia Nacional sobre pontos capitais de administração ultramarina, prestar colaboração ao Governo e que as minhas objecções possam ter alguma utilidade aproveitável.
Seja-me permitido, pois, fazer algumas considerações que lancem mais luz sobre o assunto e nos levem a dar boa solução ao problema, mas dentro das normas estabelecidas na Lei Orgânica do Ultramar Português. Não faria sentido, Sr. Presidente, que se alvitrassem soluções fora dos princípios orientadores daquela Lei Orgânica.
A imaginação de cada um de nós, por mais fértil e fulgurante que seja, terá forçosamente de se submeter aos princípios que regem a nossa administração ultramarina.
Já lá vai o tempo em que cada um tinha o seu programa dentro dos seus princípios, sem obediência a princípios legais de conjunto e unidade, que não havia. O Estado Novo modificou esse estado de coisas. Hoje todos devemos obediência aos princípios consignados na Lei Orgânica do Ultramar em matéria de administração dos territórios ultramarinos.