17 DE DEZEMBRO DE 1956 211
com todas as suas consequências políticas e sociais: a paz pública, o pleno emprego, a elevação do nível de vida, a retracção ou o aceleramento na formação de novos capitais em busca do equilíbrio económico em expansão.
Entre nós, onde se verifica certa tendência orgânica à sobreprodução industrial, pela desproporção entre a capacidade produtora das indústrias e a capacidade do mercado, a política do salário ocupa um lugar primacial, ao lado da política dos preços.
A expansão do mercado cria as condições duma melhor produtividade, e, portanto, a possibilidade de preços mais baixos. Assim, a política do salário guarda em boa parte o segredo da expansão. Uma boa política de salários pode determinar uma cadeia de fenómenos que alimentem a expansão, que, partindo do acrescido poder de compra, se amplia com a produtividade melhorada .
A produtividade não poderá melhorar, porém, em todos os sectores por igual. Haverá sectores em que a produção aumentará sem que a produtividade melhore sensivelmente e haverá outros em que nem a produção nem a produtividade se modificarão substancialmente. Na construção civil, por exemplo.
Não seria, por isso, viável uma política de salários que se subordinasse a níveis gerais.
Por não poder realizar justiça igual para todos, atrasaria indefinidamente a expansão, expansão de que todos acabariam por beneficiar no aceleramento das actividades.
Se não nos orientarmos para uma política diferenciada por sectores e dificultarmos os aumentos nos sectores onde a produtividade é melhor e os índices de produção mais elevados ou onde situações monopolísticas se verifiquem, concentraremos a formação de novos capitais nesses sectores, estimulando, assim, a concentração da riqueza. A má política do salário pode conduzir a grandes iniquidades económicas.
Uma sã política de salários crescentes é, porém, inseparável de um mercado de consumo em progressiva diversificação. Só assim se evitará que o novo poder de compra pese sobre uma gama restrita de produtos essenciais, sobretudo alimentares, e se torne um factor inflacionista.
A política económica que dá prioridade às infra-estruturas nos países ou regiões mais ou menos subdesenvolvidos não constitui dogma. Como todas as generalizações, tem de ser submetida à dura prova das realidades.
Em Portugal, onde existe uma indústria de produtos de consumo de certa importância para o meio, não podemos sistematicamente sacrificá-la à preocupação e acumular capitais para as infra-estruturas, em detrimento dos consumos, como se se tratasse de uma região onde tudo estivesse por fazer e fosse necessário começar pelo princípio.
Parece-me que devemos pensar em pôr de pé o que já temos, promovendo a expansão produtora de bens de consumo através do aumento do salário até onde a balança de pagamentos o permita e à permanência da expansão convier. O nível de vida subirá e a formação de novos capitais será dispensada. Baixando a razão da sua formação (volume de novos capitais para volume dos consumos), faremos melhor justiça social e económica e afinal aceleraremos a formação de novos capitais.
A expansão posta em movimento reclama um forte afluxo de capitais novos a alimentá-la continuamente. Os progressos técnicos, o preço elevadíssimo da automatização e o envelhecimento rápido das máquinas electrónicas exigem imensos e constantes investimentos. Os investimentos industriais constituem hoje um grave problema, que se não resolve com a bolsa do Estado e requer um amplo mercado de capitais.
A amortização da máquina constitui um factor de crescente importância na composição dos custos de produção, ao mesmo tempo que baixa a posição do salário, com a substituição progressiva das grandes massas proletárias por uma elite crescente de especialistas.
O papel do capital e dos incentivos empresariais à produção é fundamental numa economia em expansão, e, portanto, no pleno emprego e na elevação do nível de vida. Quer se queira, quer não, a economia moderna é uma economia capitalista, quer se trate do capitalismo democrático do Ocidente, do capitalismo totalitário do Oriente, ou ainda do capitalismo misto de outras zonas. São os factos a comandar e perverter as doutrinas. O capitalismo pode até não ser liberal. O comunismo pode até não ser colectivista.
O comando da economia repousa, em última análise, no mercado, mercado no seu sentido mais amplo, universal, que abarca todos os valores. Mas havemos de cingir-nos, neste ligeiro esboço à margem do relatório do Ministro, aos mercados de bens e de capitais, ao mercado nacional, ao mercado comum europeu e, finalmente, ao mercado internacional.
Não creio que o mercado nacional seja constituído por uma série de regiões complementares umas das outras, se com isto se quiser significar qualquer coisa de diverso da complementaridade verificada entre todos os mercados em toda a parte. As trocas entre o ultramar e a metrópole não serão, porventura, mais importantes do que as que se duo entre a zona industrial do Porto e a zona industrial de Lisboa ou entre o ultramar e o estrangeiro. Todas essas trocas são complementares, porque todas elas satisfazem as necessidades recíprocas. Cada território importa o que necessita e exporta aquilo de que não carece.
Parece-me que haveria vantagem em afastar a ideia de que o comércio internacional tem de ser complementar, porque essa ideia pode atravessar-se no caminho da unificação do mercado nacional. Não vejo porque no ultramar se não possam um dia produzir e exportar para a metrópole artigos similares aos que aqui suo produzidos, beneficiando do mercado único nacional, tal como os fabricantes de ferragens ou de tecidos do Norte e do Sul vendem os seus produtos indiscriminadamente em qualquer região da metrópole.
A ideia de mercado único implica a livre concorrência de todos os produtores nacionais em qualquer parte dos nossos territórios, libertos de todas as peias à livre circulação de bens. Não pode conceber-se de outra forma o mercado único nacional.
Bem sei que isto pode trazer consigo problemas de transferência, enquanto se não alterar o sistema bancário e monetário português, e problemas orçamentais, enquanto se não modificar o sistema fiscal do ultramar. Por isso, o mercado único nacional tem de esperar por essas reformas, que farão protelar o que é urgente efectivar.
Mas não basta unificar o mercado nacional, é preciso integrá-lo em todos os seus elementos humanos.
Parece-me perigoso subordinar o desenvolvimento do ultramar às necessidades da metrópole. É o mercado que comanda o sentido do desenvolvimento económico, volume de produtos de que podemos abastecer-nos no ultramar é limitado, como limitado é o mercado interno das diversas parcelas dos nossos territórios. O mercado que comanda e assegura a expansão económica do ultramar é o mercado internacional. Nesta altura do desenvolvimento nacional, a nossa capacidade de produzir no ultramar é muito superior à nossa capacidade de consumir a produção ultramarina. Será