19 DE MARÇO DE 1963 2117
1959 haviam subido para 4$ por metro cúbico, em vez de 2$50 por metro cúbico preconizados no relatório da comissão.
Não estando as entidades portuárias espanholas satisfeitas com o modo como decorriam as dragagens da barra do Guadiana, levadas a efeito pela Mina de S. Domingos, e porque dispunham de material de dragagem, sugeriram a Portugal a revisão do problema de forma a eliminar-se o material da empresa da mina, admitindo como solução que as dragagens fossem levadas a efeito pelas entidades portuguesas ou pelas entidades espanholas, ou ainda em conjunto, conforme as entidades portuguesas julgassem preferível. Das negociações levadas a cabo surgiu o seguinte regime: as dragagens seriam efectuadas, em anos alternados, por portugueses e espanhóis.
No ano de 1961, a dragagem seria efectuada pelos espanhóis.
A Espanha só iniciou as dragagens em 1962, cabendo a Portugal a dragagem de 1963, cujos encargos serão suportados pela Junta Autónoma dos Portos de Sotavento do Algarve.
Feita assim a longa e fastidiosa história do que desde há muitos anos se vem passando com as dragagens do porto de Vila Real de Santo António, há que pôr em evidência, sem quaisquer rodeios, o estado ruinoso em que se encontra actualmente a mesma barra. Pode afirmar-se que está praticamente assoreada, pois dificilmente e com o maior perigo já por ela passam barcos que calem mais de 2,5 m, na baixa-mar de águas vivas.
É assim da maior gravidade este problema, e a ele se tem referido a imprensa regional e nacional com a maior insistência. Há que resolvê-lo quanto antes, evitando-se gravíssimos prejuízos. Os povos do Sotavento do Algarve vivem em dolorosa ansiedade pela melhor solução que possa salvar o seu porto.
Sabemos que a direcção da Junta Autónoma dos Portos de Sotavento do Algarve, entregue à prestimosa direcção técnica do distinto engenheiro Custódio Rosado Pereira e sob a presidência do dinâmico e inteligente algarvio Dr. Luís Moreira, tem desenvolvido uma incansável actividade no sentido de resolver este magno problema. Têm sido inúmeras as suas conferências com as entidades espanholas de Aiamonte e Huelva, todos se esforçando por encontrar uma rápida e boa solução.
A obra por todos apreciada e justamente louvada que o Dr. Luís Moreira levou já a efeito na presidência da Câmara Municipal de Faro, a sua incansável actividade em prol do aeroporto do Algarve, já em construção e do qual toda esta província espera a valorização da sua maior riqueza, o turismo, são, juntamente com o elevado sentido regionalista do ilustre governador civil, Dr. Baptista Coelho, a garantia segura de em breve podermos ver resolvido este premente assunto.
O Sr. Ministro das Obras Públicas, o muito ilustre engenheiro Arantes e Oliveira, grande entre os maiores obreiros desta época de Salazar, que nunca, esquece entre as obras nacionais as da província do Algarve; o Sr. Ministro das Comunicações, entidade a quem os algarvios estão gratos pela sua valiosa actividade em favor da construção do aeroporto; o Sr. Engenheiro Armando Palma Carlos, ilustre e muito digno director-geral dos Serviços Hidráulicos, que nunca regateou o seu valioso auxílio aos interesses algarvios dependentes dos seus bem orientados e apetrechados serviços hidráulicos, prestarão, certamente, como, aliás, em todas as circunstâncias o têm feito, o auxílio preciso não só para se salvar a barra do porto de Vila Real de Santo António, como para evitar que se percam as dos restantes portos algarvios.
Possui a Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos uma divisão de dragagens, funcionando sob a direcção dos seus serviços marítimos, orientados pelo ilustre engenheiro Manuel Fernandes Matias. Como todos os serviços da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos, e o País sabe e reconhece quanto lhes deve, a divisão de dragagens contém hoje em técnicos e unidades tudo o necessário à sua boa e melhor finalidade. Dispondo presentemente para cima de 33 unidades, entre as quais se contam umas 11 dragas de sucção marítima, além de 1 corta-rochas, 5 rebocadores, quase uma vintena de batelões e demais auxiliares, contará, ao findar o II Plano de Fomento, um total de 40 unidades, num valor da ordem dos 200 000 contos.
Não temos, pois, que pedir ao estrangeiro nem técnicos, nem material, para trazer em condições de boa navegabilidade as barras de todos os nossos portos.
Para já urge desassorear a barra do porto de Vila Real de Santo António e seguidamente entregar a técnicos competentes, que também os temos, o estudo do canal melhor para a barra do Guadiana, pois esta, tal como é agora, carecerá anualmente de ser dragada, pela tendência de deslocação e alongamento do canal para sueste, dado o impulso das aluviões litorais e as perturbações ocasionais, mas violentas, que, em sentido contrário, introduzem as cheias e os grandes temporais do sudoeste e cuja acção a enchente e a vazante exteriores fortemente auxiliam.
Os nossos bons serviços navais sabem pelos seus oficiais, sem favor distintos e sabedores técnicos da Missão Hidrográfica do Continente, que isto é assim. E acreditamos que, conhecendo bem o que se passa na barra do Guadiana - além de assoreada, de uma extensão tal, que por vezes as pequenas embarcações levam mais de meia hora a passá-la -, eles estarão bem à altura de lhe aplicar o remédio mais eficaz.
Depois é necessário manter permanentemente no Algarve uma ou duas dragas, não só para evitar a perda de tantos trabalhos feitos e das enormes somas gastas nos nossos portos, mas para que estes, em vez de facilitarem a vida dos homens do mar, razão superior para que foram criados, se não transformem em verdadeiros cemitérios.
O que não há muito se passou com a corajosa, valente e destemida tripulação do salva-vidas Patrão Rabumba diz bem do perigo em que vivem presentemente os homens do mar de Vila Real de Santo António. Na sua nobre missão, aquele salva-vidas saíra a perigosa barra para verdadeiramente arrancar das garras da morte as tripulações de dois barcos da pesca costeira, e, depois de as haver salvo, e já todos a bordo do salva-vidas, se iam perdendo e até o próprio barco. É que o estado da barra, pelo seu grande assoreamento, não os deixava entrar no porto. Tentaram-no, em vão, por duas vezes, e, na impossibilidade de se salvarem por ela e pela de Olhão, foram entrar, após 30 longas horas de luta com o mar, no porto de Portimão, quase no extremo oposto da costa algarvia.
Não é justo nem humano que se obriguem a tais perigos homens da têmpera destes doze náufragos, que, ao chegarem a terra, em resposta «nos jornalistas, que lhes perguntavam se haviam tido muito medo, disseram que «ca altura das ondas e os corpos molhados não lhes tinham dado tempo para se lembrarem do medo, papão por eles ignorado».
Vou terminar já, Sr. Presidente, mas antes duas palavras, apenas para dizer da angústia em que nessa ocasião viveram aqueles homens bons da marinha de guerra portuguesa, de sentimentos tão superiormente altruístas, que se preocupam mais com a vida do seu semelhante do que com a sua própria vida, e que, em permanente vigília, aguardaram e transmitiram as notícias do que se estava.