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DIARIO DAS SESSÕES N.º 194
população trabalhadora rural, e das que venham a constituir-se.
0 benefício novo do abono de família, sem dúvida apetecido e estimável, valioso apoio aos pais carregados de filhos, também será primàriamente concedido aos trabalhadores das áreas das Casas do Povo, e de futuro, além destes, extensível apenas aos trabalhadores com emprego permanente nas demais zonas.
Por fim, o benefício total do regime geral de previdência e abono de família, o das simplificativamente chamadas «caixas», aquele de que gozam os trabalhadores do comércio e da indústria, com mais substância nas vantagens e a coroa da reforma em idade certa, será o privilégio, nos campos, dos trabalhadores especializados e dos empregados permanentes das empresas grandes: uma minoria, por ora, que todavia tenderá a crescer vista a evolução da agricultura.
Assim resumido o programa da lei, mas creio que, sem faltar nada de relevante, ela dá-nos ares de pouco ambiciosa; porém, cumpre atentar em que, mesmo, assim, vem pejada de grandes encargos novos, segundo nos adverte a Câmara Corporativa no seu esclarecedor parecer.
Se sé confirmarem as suas presunções quanto às melhorias a conceder, só quanto à previdência sob, gestão directa das Casas do Povo — médicos e medicamentos; subsídios por casamento, nascimento de filhos e morte dos sócios; generalização e aumento para o dobro dos subsídios de invalidez e velhice — os encargos, que foram de 56 000 contos em 1967, virão a subir para 106 000 contos, tão-sòmente para a, população beneficiária actual, que, convém manter na ideia, é apenas cerca de um quarto de número total das pessoas em condições de aproveitarem, em todo o território metropolitano, da generalização da rede das Casas do Povo, e com isto desta previdência. No acrescido número, só a estimativa dos subsídios de invalidez e velhice triplica quase o montante actual.
Quanto ao custo do abono de família, no mesmo âmbito — isto é, dentro da cobertura das Casas do Povo existentes —, o seu cômputo global atinge os 290 000 contos anuais, a igualar os 100$ por mês e descendente do regime geral da previdência. Convém determo-nos um instante sobre este último número, o do quantitativo individual do abono, pois sobre ele se cruzam conjecturas diversas. Não é segredo que os primeiros estudos se inclinaram para a hipótese dè uns meros 40$ por unidade, mesmo assim já intimidados com o preço global entrevisto. Ora este seria um abono mesquinho, quase ridículo ante o poder de compra do dinheiro, sem significado material nem político. E as esperanças já suscitadas não comportam tamanha desilusão.
A concessão do abono de família será, afigura-se-me, o mais palpável e apreciável dos benefícios da lei. Vantagem imediata, directa, de alívio concreto para os pais de família, com larga incidência, ela não poderá ser estabelecida a nivel inferior ao atribuído aos trabalhadores dos demais ramos de actividade sem reacender aqueles sentimentos de diferença que tanto ferem os do campo e obviamente se quis minorar-lhes.
Aqui esta precisamente um dos pontos em que eu pensava, aquele em que mais pensava, quando de entrada avancei o sentimento de que a lei requer suficiência nas provisões, de que não pode apagar-se em compromissos de meia medida.
Mas será também neste aspecto, quiçá, que ela carecerá de mais habilidade na regulamentação.
O trabalho rural ainda é, em muitas partes, grandemente variado: intervêm períodos de desemprego, as pessoas sáem dos domicílios buscando intercalarmente ocupação noutros lugares — o caso dos trabalhadores migrantes será exemplificativo, mas outros poderão apresentar-se ainda mais intrincados; alterna o labor de conta própria com o de conta alheia, etc.
Porque há-de, como nenhum outro, ser função do emprego quotidiano, e fica com a ligação territorial à Casa do Povo, a concessão do abono de família exigirá não só a decisão de gastar bem, mas também a de regulamentar com adaptabilidade e prudência.
Da gestão da sua previdência já as Casas do Povo afeiçoaram a prática; nesta modalidade nova do abono de família, terão muito que aprender para acertarem.
Previdência específica e abono de família delimitam as relações de causalidade das Casas do Povo com a previdência rural, segundo a lei em exame, e logo a confinam nesses aspectos, portanto, as áreas que tais instituições sirvam.
Quer dizer, liminarmente nem talvez uma quarta parte da população rural ficará por esta -via atendida, pois tal é a proporção da cobertura presente do território metropolitano por aqueles organismos.
Esta ó uma limitação séria, mas creio que esta bem assim.
Utiliza o instrumento mais disseminado, mais acessível, mais da familiaridade, já da confiança dos camponeses; e permite a instalação gradual, a adaptação progressiva do sistema ao meio e deste àquele, conveniente tanto à mais eficaz aplicação como à introdução praticável do suporte financeiro.
Recordei atrás como, desde já, os encargos se podem calcular na ordem dos 400 000 contos anuais, soma cuja importância se avaliará melhor considerando que em 1967 toda a previdência das Casas do Povo custou 73 718 contos, que incluíram aliás uma parte substancial de prestação de serviços médicos a beneficiários da previdência geral, ou fosse a trabalhadores não agrícolas.
O salto é grande, e multipicá-lo imediatamente por quatro conduziria a encargos provàvelmente incomportáveis — que incomportável já seria, sómente para o depauperado meio agrícola, aquela soma de 400 000 contos da. modesta entrada. A este respeito não há, porém, dúvidas, e, as longas e judiciosas considerações da Câmara Corporativa sobre a indispensabilidade e justiça de um muito forte apoio, exterior à agricultura, não carecem de mais elaboração.
Isto não exclui um ajustamento das receitas internas do sector, e a este respeito não me furtarei a considerações delicadas, porque envolvem as bolsas mais fracas, mas necessárias, porque é tempo te encarar de frente todas as realidades.
E nunca é de mais insisti em como a timidez, o acanhamento de decidir, poderá comprometer fundamente a viabilidade do novo regime se no início se não chamarem a adequada comparticipação todos a quantos interessa, para reunir os máximos recursos.
Devemos ter presente que lodos os novos encargos repugnam, todos determinam protestos e originam fugas, mas, se dentro do razoável, enformes com a equidade, contidos nas verdadeiras posse, a acomodação acaba por fazê-los aceitar. Diz o povo que onde todos pagam nada é caro, e se decerto o conceito não é de elasticidade ilimitada, contém no entanto sabedoria bastante para se tomar em conta.
O mundo de hoje tem tendência a esquecer o custo das comodidades que todos os ias pede com mais gana. No espírito do comum das pessoas generalizou-se a noção de que os outros é que pagam, de que «eles» — uns «eles» de que cada qual só sabe que ião quer ser parte — se