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21 DE MARÇO DE 1969
que querem esgotar os limites legais dos seus mandatos, para que o não esgotamento não pareça uma desconsideração. Mas VV. Ex.ªs talvez não tenham considerado que há outro tipo de inércia, a inércia dos possíveis substitutos, que dizem: «Pois continue quem lá esta», e por essa forma cómoda muitas vezes se escusam a tomar o encargo da substituição. Direi mais: estamos a assistir, nos nossos meios rurais, a verdadeiras transformações sociais. As antigas elites estão a desaparecer. Os homens da gravata de seda que era costume chamar aos cargos de serviços públicos quase que desapareceram por completo. Mas há toda uma classe nova de gravatas sintéticas que também tem direito a mostrar a sua personalidade social e vai conquistando capacidade material para dedicar algum tempo ao bem da comunidade. Ê preciso que o respeito aos restos que ainda haja de hábitos tradicionais de escolha para o exercício de cargos públicos, aliado ao comodismo de não sofrer a maçada de os exercer, não se apoie em textos como este que consta do parecer da Câmara Corporativa, para contrariar renovações que podem ser inconvenientes algumas vezes, mais vezes ainda difíceis, mas que raramente serão impossíveis, e poder impelir à chamada ao serviço do comum de novos valores.
Também ouvi aludir à lei que a Assembleia Nacional aprovou há dez anos, sobre a renovação dos mandatos dos presidentes das câmaras municipais. Não a comentarei, porque já houve tempo para isso quando a Assembleia decidiu assim, pelo que mais não quero agora fazer do que recordar o voto desse tempo em apoio do meu voto de agora.
O Sr. Antão Santos da Cunha: — Sr. Presidente: A argumentação do Sr. Deputado Amaral Neto, quanto a mim, não convence. A sua argumentação esta invalidada por um espírito a que me atrevo a qualificar de egoísta. O Sr. Deputado Amaral Neto pretende um modernismo que no fundo o liberte da sujeição a que os homens bons da sua terra o têm obrigado. Mas é por de mais evidente que o Sr. Deputado Amaral Neto, se exerceu durante tantos anos as funções que acabou de referir, é porque ao nível local lhe reconheciam competência, prestígio e posição social para manutenção do lugar. Os problemas da renovação desejável, em muitos casos, têm de se resolver por outros caminhos, não pelo caminho da limitação dos mandatos, mas por considerações importantes da vida local, dos interesses dos que vivem no quadro das suas instituições. O problema no fundo é Um problema de mentalidade. O que importa é criar um clima de renovação de quadros, na consideração de que todos têm deveres para com a comunidade e de que esta não pode prescindir da colaboração dos mais idóneos. Se soubermos criar esse clima, a chamada de novos elementos far-se-á naturalmente sem a dureza de uma limitação que, em alguns ou mesmo muitos casos, poderá ser lesiva do interesse geral.
O Sr. Castro Fernandes: — Sr. Presidente: Só duas palavras de ordem pragmática, embora à primeira vista o não pareçam. Nós procuramos todos, com efeito, cada vez mais um corporativismo de associação, num País que naturalmente é antiassociativo, num País que por natureza não é gregário, em que as pessoas são fundamentalmente individualistas. Mas procuramo-lo como ideal a atingir, batendo-nos há muitos anos para que o nosso corporativismo seja efectivamente de associação. Batemo-nos tentando modificar as mentalidades, tentando modificar o próprio pensamento do Governo ou, melhor, de certos governantes, tentando modificar certos magistrados e certas magistraturas. Mas, para que atinjamos efectivamente o corporativismo de associação que queremos que constitua a base do tal ideal, temos de contar com aqueles que se chamam — desculpem-me o plebeísmo da expressão — os «carolas», os que se dão inteiramente, desprezando conveniências, comodidades, interesses, para se dedicarem àquilo que um homem tem sempre dentro de si e que é a possibilidade de dádiva, de gratuidade, de entrega a uma causa. E não limitamos — e eu aqui estou talvez deslocado da questão, porque esta crise de cabelos brancos já me força a ter mais cuidado quando defendo a vitalidade dos velhos nestas matérias — as possibilidades daqueles que pretendem, que querem desinteressadamente dar-se, porque nestas coisas das Casas do Povo a posição é sempre, ou quase sempre, o mais desinteressada possível.
O Sr. Amaral Neto: — Sr. Presidente: O Sr. Deputado Antão Santos da Cunha fez o favor de citar o meu nome com referências que agradeço, se bem que repelindo a sua insinuação dos meus motivos íntimos, e deu-me o prazer de o seguir em considerações que lhe admiro quanto à forma literária, mas que me parecem situar-se mais no domínio do ideal que no domínio das realidades práticas. Pegarei numa palavra de S. Ex.ª para, sem tentar opor à força da sua eloquência e ao brilho das suas expressões a pobreza da minha argumentação, mostrar que de facto assim é. Disse S. Ex.ª que não devemos deixar cair os níveis. Pois bem, os níveis baixam de muitas maneiras, até pelo cansaço. Independentemente disso, quem nos garante que, ao procurarmos uma pessoa não revestida de grande brilho social ou de capacidade ainda não revelada, vamos necessàriamente baixar o nível? É frequentemente afirmado que muitas vezes as funções fazem os homens. Em verdade, é nas emergências ou nos trabalhos que se avaliam e revelam as capacidades. Continuo a aceitar que a própria força imperativa de nova escolha que se pode conter numa proposta deste tipo é provàvelmente mais benéfica, pode ser mais eficiente em proveito das instituições, que a acomodação aos que já estão. E aquilo que muitas vezes pode considerar-se perigo de baixa de nível mais não é do que desculpa para que não se incomodem a ter de aceitar cargos aqueles que estariam em condições de os assumir.
Quanto aos «carolas», também gostaria de poder ter neles a confiança que tem o Sr. Deputado Castro Fernandes. Mas os «carolas» rurais qualquer dia só os veremos em Belém, no Museu de Arte Popular, enquanto não os virmos no Museu Arqueológico.
O Sr. António Cruz: —Sr. Presidente: Seriam quase descabidas outras palavras relacionadas com o que se estabelece na proposta apresentada por uma comissão de ilustres Deputados. Todavia, na medida em que ouvi pertinentes considerações, e olhando um pouco para trás, ocorrem-me à memória as palavras de Santo Agostinho — e Deus me perdoe de as trazer para aqui — quando ensina que eleger é rejeitar. Se escolhermos o melhor, rejeitamos os que consideramos piores. Não queiramos nós, dentro do conceito agostiniano, começar desde já a rejeitar. Deixemos aos sócios efectivos contribuintes, de acordo com a nova lei, a missão efectiva de escolher quem entendam que deve presidir aos destinos da Casa do Povo da sua terra, fazendo-o quando e pela maneira que lhes apetecer. Não estejamos desde já a impor uma limitação de tempo.
Com respeito aos Srs. Deputados que referiram a disposição legal relacionada com o termo dos mandatos dos presidentes das câmaras municipais, quero lembrar que se fixou um prazo, é certo, mas para um acto que apenas depende da vontade do Governo. Neste caso, porém, o