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DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 199
ciados por atempado pagamento de devidas indemnizações aos proprietários para eles exigirem a drástica restrição ao direito de fruírem as suas leiras antes de os mandar intimar para a destruição dos arvoredos que nelas estão radicados.
Procede a essa intimação sem quaisquer restrições, pouco lhe importando as consequências do facto.
Daqui tem resultado que os proprietários mais humildes são inteiramente despojados do único elemento de valorização dos seus pequenos prédios, que ficam, por isso, reduzidos a superfícies desérticas, que só rendem desolação e nada mais.
Ora este sistema é por de mais odioso para poder continuar a vigorar.
Contra ele se ergue a voz inquebrantável da razão.
Coagir os proprietários a consentirem no seu empobrecimento sob pena de serem havidos como desobedientes e condenados como tais nos tribunais comuns — afronta a própria dignidade humana.
Vozes: —Muito bem!
O Orador: —No entanto, este procedimento está a ter o beneplácito de repartições oficiais da fiscalização eléctrica, que não curam de saber dos direitos dos proprietários......
Importa, por isso, remediar prontamente tão avantajada distorção dos princípios gerais abolindo a legislação que a consente.
Em matérias de tanto melindre, como são as das expropriações e das limitações ao aproveitamento normal dos bens do nosso património fundiário, não se podem deixar desamparados os direitos dos proprietários, perante as exigências sejam de quem for.
Por muito exigentes que se apresentem as necessidades da vida moderna no processamento do seu teor económico, não justificam de nenhuma maneira esse desamparo.
Há direitos cujo objecto perdura à custa de incontáveis sacrifícios, amealhados ao longo de muita vida.
Não se negue que tais direitos tenham de ceder perante outros que se tornaram imprescindíveis ao bem comum!
Todavia, se é em nome do bem comum que se pedem e se justificam sacrifícios," que eles sejam devidamente compensados por prestações conscienciosamente fixadas e prontamente satisfeitas.
De contrário, a continuarem os casos que citei do sector da electricidade, e que representam apavorantes enormidades, em vez de justiça igual e por isso indiscutível, teremos apenas uma aumentada protecção desigual e insólita a desequilibrar cada vez mais a própria estabilidade da vida.
Não quererá, certamente, o Governo que essa situação perdure e, assim, não deixará de mandar proceder à elaboração de um ajustado código de expropriações que abarque todas as formas de delimitação do direito de propriedade, definindo os direitos e as obrigações por forma clara e precisa, para terminarem as intoleráveis sobreposições de certos sectores.
Ao findar os meus trabalhos parlamentares, aqui deixo o meu instante pedido para que este melindroso assunto venha a ser colocado na agenda das preocupações importantes dos competentes departamentos do Estado, pois, se o for, como tanto espero, não tardarão, certamente, as soluções harmónicas que o bem comum exige e o Governo serve sem desfalecimentos.
E, a findar, consinta-se-me que deixe consignados os agradecimentos de que me sinto devedor: a V. Ex.ª, Sr. Presidente, pela compreensão e amizade com que me tratou; a VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, pelas muitas gentilezas que me dispensaram, e aos representantes dos órgãos da informação, pelo acolhimento que generosamente me concederam.
Que as maiores e mais dilatadas felicidades estejam no venturoso caminho das preciosas vidas de todos.
Vozes: — Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Cerqueira Gomes: — Sr. Presidente: De tudo que na minha intervenção de ontem não pude dizer, por escassez de tempo, só algumas breves palavras não queria que não fossem ditas. E são essas que aqui venho hoje proferir, ainda que, mesmo assim, reduzidas ao essencial. E são palavras de homenagem e saudação ao Prof. Marcelo Caetano — o homem que corajosamente e sacrificadamente sucedeu a Salazar e prolonga, a grande altura, a sua missão difícil de governar superiormente a Nação.
Saúdo o intelectual, saúdo o mestre da boa doutrina, saúdo o político e governante.
Saúdo o intelectual.
E no intelectual sobressaem nas múltiplas facetas o erudito, o pensador, o professor, o investigador, o publicista, o escritor. O erudito de ampla e sólida cultura, saber haurido no estudo e na meditação, ao longo de uma vida austera e operosa, produto das suas altas virtudes de trabalhador infatigável e da sua grande capacidade de apropriação e de ordenação intelectual.
O pensador de ideias claras, de raciocínios lúcidos, de juízos seguros. A clareza e lucidez que são, porventura, que são para mim, com certeza, a nota mais saliente e mais bela do seu alto espírito, da sua inteligência aliciante.
Professor de vocação, mas professor que não encerrou o seu magistério nos acanhados limites das aulas universitárias e se projectou amplamente na vida do seu tempo. Porque S. Ex.ª é mestre de todos nós. Pela sua palavra e pela sua pena manteve viva e sempre renovada, espalhou e levou a todos os que têm ânsia de luz, a luz do seu alto preceptorado.
Investigador, porque a sua grande sede de saber se não saciou nas fontes, tantas vezes escassas, que encontrou pelos caminhos já abertos e explorados. E em domínios da história, cheios de trevas e incertezas, pôde S. Ex.ª projectar preciosos raios de luz com documentos por sua diligência carregados do sono dos arquivos e outros que o seu superior critério devidamente valorizou. Assim nasceram os estudos sobre a antiga organização dos mesteres e certos aspectos da nossa vida municipal e os trabalhos sobre algumas cortes portuguesas de mais interesse e mais rico conteúdo histórico.
Publicista, que ao invés do que ó velho e feio pecado português, foi incessantemente e através dos prelos entesourando e difundindo os frutos preciosos dos seus estudos, das suas meditações e da sua experiência.
Escritor de expressão adequada à clareza e harmonia do seu pensamento — prosa de recorte elegante, de linhas sóbrias e clássicas, mas a que não falta o movimento que persuade e o vigor e o calor emotivo que alicia e convence.
A par do intelectual, saúdo em S. o mestre de vida e de verdade, o apóstolo e o construtor do novo mundo e da cidade nova.
Andamos numa das horas mais agitadas, mais confusas, poderíamos bem dizer mais dramáticas, da história. Debate-se em crise o mundo moderno. Crise e desorientação espiritual grave e profunda, multiforme e total. Grave e profunda, porque vem dos primeiros princípios e, logo à nascença, envenena o pensamento, logo à raiz deforma o sentido e a hierarquia dos valores supremos. Multiforme