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2910 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 144

Nota informativa do Ministro da Saúde e Assistência à Assembleia Nacional

1. Entende o Governo ser seu dever proporcionar aos Srs. Deputados informação documentada e esclarecida com respeito aos problemas e situações cuja apreciação postula a disponibilidade de dados que se não encontrem, por completo, ao seu imediato alcance.

A observância desta, linha de rumo é agora suscitada pela ocorrência de incidentes que nos últimos tempos, em remete de um processo de longa e complexa gestação, vieram trazer o embaraço de sérias perturbações à vida hospitalar.

Ninguém conseguiria ajuizar o problema com o total acerto que se exige da opinião qualificada, se abstraísse de o ponderar à luz do enquadramento na perspectiva global em que se insere e que, em última análise, devidamente o esclarece.

Na verdade, múltiplos condicionalismos — alguns radicados em períodos remotos da história hospitalar e que, por isso mesmo, tendem a ser esquecidos, sobretudo pelos mais jovens, e outros pelo menos de difícil acessibilidade a quem não haja acompanhado, com vigilância crítica, atenta e permanente, o nascimento & a formulação dos acontecimentos — se enredam em confusa teia, que retira significado a qualquer apreciação parcelar das várias avaliações externas do processo.

Importa sobremaneira compreender que a chamada «-crise dos internos» representa apenas um dos aspectos — por agora, o mais aparente — do complexo vasto de uma fundamental «questão hospitalar»; e conviria, também, que se localizasse esta última no contexto global de uma política de saúde e assistência que pretende ser unitária e reflectir-se, assim, nos diferentes sectores da vida nacional, a que respeita, nomeadamente nos vários ramos da administração sanitária.

Medidas deliberadamente adoptadas com visita à modificação, rápida e eficaz, de estruturas e termos de funcionamento de instituições cuja revisão até aqui tem sido insistente mente solicitada não deixariam, por certo, de ser sentidas como possível abalo de algumas situações desde longa data toleradas, mas cuja aceitação haveria de ser posta em causa. Nunca o Governo alimentou ilusões sobre dever esperar reservas, individuais ou de grupos diferenciáveis, ao plano que traçou e às programações que, correspondentemente, sem perda de tempo, começou já a executar. Cumpre-lhe, porém, conjugar os interesses que essas posições traduzem na perspectiva equilibrada de uma harmonia geral que os gradue em consonância com criteriosa hierarquia de valores e da qual, sobretudo, não resulte prejuízo para os interesses colectivos nem alheamento das bases fundamentais que hão-de inspirar a unidade de uma política.

Tem-se a convicção de que a análise informada e esclarecida da recente agitação hospitalar a revela como sintoma de reacções a um conjunto de problemas que nos últimos anos se adensaram e que se prestou a hábil exploração em moldes de acção subversiva, apoiada, para mais, pela transplantação para o plano hospitalar de métodos, procedimentos e agentes já anteriormente ensaiados no campo estudantil e cuja penetração no âmbito da representação profissional tem também sido objecto de repetidas tentativas.

Procurar-se-á, pois, sucessivamente, descrever, em breve síntese, a situação encontrada pela actual equipa governamental no sector da saúde e assistência e enunciar o traçado geral das orientações fundamentais que presidem à sua acção neste momento, para, nessa base de esclarecimento, fornecer, depois, os elementos indispensáveis à análise interpretadora e valorativa dos incidentes na vida hospitalar e das decisões com que prontamente se procurou saneá-la.

2. Só em 1968 se delineou em texto de lei uma organização, com carácter nacional, das carreiras médicas, e apenas no ano imediato foi, pela primeira vez, regulamentado, segundo idêntica perspectiva genérica e em directa relacionação com aquela medida, o internato médico. Anteriormente, existiam embriões de carreiras — no plano da saúde pública, no sector universitário e no domínio hospitalar e funcionavam internatos, mas essas instituições careciam de âmbito nacional, reportando-se, antes, especificamente, a cada uma das estruturas orgânicas ou estabelecimentos em que se aplicavam. Constituíram-se, mesmo, tradições individualizadas, com particular relevo para o internato dos Hospitais Civis e para a carreira de cirurgião destes Hospitais.

Ao longo de muito tempo, consolidou-se um modelo que a prática desenhou para tais instituições e que, pelo menos nas soas linhas gerais, é largamente conhecido.

Saído da Faculdade de Medicina — com uma licenciatura que constituía habilitação legal bastante para o exercício da profissão —, o jovem médico dirigia-se, normalmente, para a clínica livre. Enfrentava dificuldades próprias do lançamento numa actividade liberal, mas podia, em contrapartida, alimentar certas expectativas profissionais e gozava, na maior parte dos casos, do apoio que a sua inserção social lhe facultava. Tem-se ainda, por outro lado, na memória a ambiência que caracterizava então a actividade médica: havia uma clientela que se fixava num médico de família, a quem, de acordo com o grau de evolução da medicina por essa época, se pedia, essencialmente, preparação de clínica geral; só os econòmicamente mais desfavorecidos procuravam o hospital — nascido da caridade e que se olhava com certo medo; não existiam as formas actuais de medicina organizada e, entretanto, os serviços públicos de saúde confinavam as suas autuações no campo estreito da higiene e da antiga epidemiologia. Neste contexto, eram, portanto, minoritários os médicos hospitalares ou que exerciam a profissão por conta de outrem.

Para adquirir prática clínica, o jovem médico podia tentar a admissão no internato. As portas do hospital,