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Por fim, não tendo surgido nenhum pedido de ratificação,

concluiu uni Deputado que "o nosso unânime silêncio

silêncio ratificativo é a afirmação legal da nossa clara ra-

tifocação.

Mercê do novo decreto-lei, que não mereceu esse silêncio

ratificativo, as disposições do Código Civil passam a

ser aplicáveis a todas as cooperativas.

O Código Civil disciplina, efectivamente, o direito de

associação.

Regula a aquisição de personalidade das associações,

a capacidade, a aquisição e alienação de imóveis, os

órgãos e a representação das pessoas colectivas, a sua

responsabilidade civil, o destino dos seus bens no caso

de extinção, o acto de constituição e os estatutos e a

própria vida interna das associações.

Lá figura também uma disposição equivalente à do

decreto-lei de 1954, o qual, juntamente com outra legislação,

houve o cuidado de ressalvar, que prevê a extinção

administrativa quando o fim real da associação não coincida

com o fim estatutário, ou quando ele seja sistematicamente

sistematicamente prosseguido por meios ilícitos ou imorais ou

quando a existência da associação se torne contrária à

ordem pública (artigo 182.º, n.º 2).

Ora, esta matéria da disciplina legal do direito de

associação contida no Código Civil, aprovado por decreto-lei,

foi usurpada à competência exclusiva da Assembleia

Nacional, com infracção do disposto no artigo 93.º, alínea d),

da Constituição.

O novo decreto-lei, ordenando a aplicação dessa legislação

inconstitucional às cooperativas, comunga de tal

inconstitucionalidade.

Ele próprio, de resto, enferma directamente de igual

vício, pois, na .realidade, regula o direito de associação.

Fá-lo por remissão para outros preceitos, os que ficaram

enumerados, mas não deixa de o fazer; a regulamentação

regulamentação legal por remissão é uma forma de legislar.

Tanto assim é que, até à sua publicação, os Portugueses

podiam livremente associar-se em cooperativas,

nos termos do Código Comercial.

E agora não podem: foram postos na dependência da

Administração, mesmo quanto aos actos que já haviam

praticado, aplicação retroactiva que constitui só por si

manifesta prepotência. Era as primeiras razões de não

ratificação.

Prevê-se a objecção, fácil, formalista e improcedente:

a Constituição alude apenas a bases gerais, o que deixaria

campo livre ao Governo no restante.

Alude, como sempre, de resto, que contempla os poderes

legislativos da Assembleia. Daí não se segue que, não

tendo ela legislado, o Governo o possa fazer, nem mesmo

ao nível regulamentar. Que regulamentaria ele? E ponto

a que, se necessário, se voltará.

Demais, o Código Civil, a respeito do direito de

associação, contém preceitos regulamentares e normas básicas,

tal como sucede com o presente decreto-lei.

Ambos usurparam, portanto, a competência exclusiva

desta Câmara.

Antes de entrar na análise pormenorizada do presente

diploma e dos seus antecedentes, cumpre evidenciar a

incongruência a que ele conduz, ao mandar aplicar às

sociedades cooperativas o regime legal do direito de

A quase totalidade dessas sociedades tem carácter

comercial: sem prejuízo da sua feição própria, têm por

objecto praticar actos de comércio e encontram-se

constituídas por forma prevista no respectivo Código.

Teremos, pois, sociedades comerciais subordinadas ao

governador civil, dependentes do Ministério do Interior,

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 150

reguladas pelo Código Civil: um autêntico pandemónio

jurídico.

O Código Comercial fixa-lhes certos casos de extinção.

O Civil aplica-lhe outros.

Por aquele podem ser declaradas em estado de

falência; pelo segunda, insolventes.

São sociedades comerciais, mas, regidas também pelo

direito referente às associações, até carecerão de autorização

do Governo para alienar ou onerar imóveis.

E por aqui fora é um rosário de contradições e incongruências

inevitáveis, porque toda a legislação sobre

associações se molda sobre o carácter não económico

delas, e todas as cooperativas estão estruturadas em

moldes económicos.

Como se salienta, e bem, em recente estudo do Dr. Roque

Laia, "as próprias cooperativas ditas de fins culturais

exercem uma actividade económica, na medida em que

põem essa cultura ao nível dos seus sócios, por meios

e preços que eles não conseguem obter de outra forma".

O diploma em discussão conduz, portanto, a uma

autêntica aberração.

Eis outra razão para o não ratificarmos.

Se, do ponto de vista jurídico, o diploma em causa,

além de inconstitucional, é incongruente e aberrante, não

é menos desastroso quando encarado sob os ângulos

político e social.

Ele tem o lamentável aspecto do desfecho, ou melhor,

do esforço, de uma longa luta empreendida pelo Governo

contra as cooperativas, na qual aquele foi sendo sucessivamente

derrotado.

Vejamos.

Em 1968 o Sr. Ministro do Interior declara, por

despacho, a extinção da Cooperativa Pragma, Sociedade

Cooperativa de Difusão Cultural e Acção Comunitária,

com sede em Lisboa.

Esse despacho vem a ser anulado por Acórdão do

Supremo Tribunal Administrativo, 1.º secção, de 11 de Julho

de 1969, que estabelece os seguintes princípios:

1) As sociedades cooperativas não podem ser dissolvidas

por acto administrativo.

2) E aos tribunais judiciais que o artigo 147.º do

Código Comercial atribui competência para

conhecer do pedido de declaração de inexistência

de sociedades que funcionem ou se constituam

em contravenção das disposições daquele

Código.

3) O acto do Governo que decreta a dissolução de tais

sociedades enferma do vício de usurpação de

poder.

Como se vê, decidiu o órgão supremo do contencioso

administrativo, por unanimidade de votos dos três

conselheiros que firmam a decisão, que o Sr. Ministro do

Interior tinha usurpado um poder que só aos tribunais

pertencia.

Restabelecida a legalidade com a anulação do despacho

viciado de tal usurpação, era legítimo esperar que se

deixassem as cooperativas prosseguirem em paz a sua actividade,

sem prejuízo de, se algum acto ilícito cometessem,

fosse de que natureza fosse, se recorrer ao Poder Judicial

para punição dos responsáveis.

É ponto que não esteve nem está em causa.

Mas não, continua a luta administrativa.

Com base no parecer da Procuradoria-Geral da

República de 7 de Dezembro de 1967, muito anterior, portanto,

ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de

Julho de 1969, o Sr. Ministro do Interior passa a ordenar

que algumas cooperativas sejam intimadas pela P. I.