10 DE DEZEMBRO DE 1972 4143
O «desafio económico» está, pois, lançado. Ajudemos todos a encontrar-lhe a resposta devida.
Evidentemente, houve desigualdade em Bruxelas a favor dos negociadores do Euromercado. Era inevitável. Era fatal. Era David a contas com a Europa dos gigantes. Mas a desigualdade teria sido maior, irremediavelmente maior, se tivéssemos comparecido em Bruxelas sozinhos, como outros tiveram e terão de comparecer...
Sozinhos, sem o peso e o prestígio de uma associação de livres trocas assaz importante, ainda que desfalcada pela antecipada partida da Inglaterra e da Dinamarca, e da entretanto sobrevinda desistência da Noruega.
Em todos os instantes o Governo Português mostrou-se atento às realidades que se deparavam e, até extremos limites do possível, conseguiu impor os seus pontos de vista, em perfeita consonância com o interesse nacional. Honra se lhe preste e neste momento se afirme.
E a realidade podia traduzir-se apenas nisto: pura a nova Comunidade Económica Europeia, alargada com a presença da Inglaterra e da Dinamarca, se volviam já 55 por cento das exportações metropolitanas. Quem no-las comprariam? Iríamos ficar ausentes das negociações, das decisões e das consequências deste novo alinhamento económico europeu? Os nossos filhos no-lo perdoariam?
Desçamos da estratosfera das nossas filosóficas meditações, firmemos os pés bem fincadamente na Terra.
Que outra opção verdadeiramente válida para o nosso processo de desenvolvimento económico e social existiria que não fosse a bruma para além de Arzila?
Ficou-nos do passado essa gloriosa mania suicida de transformarmos cada dificuldade ou contratempo em novos Alcácer Quibir ... Deixemos n história aos historiadores, terão nela o seu lugar. E em vez de chorarmos sobre algo que porventura se perdeu ou não se chegou a alcançar, construamos resolutamente o nosso futuro, futuro próprio, onde quer que nos encontremos e com quem económica e culturalmente convivamos.
Não alienámos nada. Todos os outros mercados permanecem abertos aos nossos esforços de penetração, ao engenho e a arte dos nossos diplomatas e exportadores, assim saibamos e queiramos desenvolver frutuosa acção. Não hipotecámos o futuro. Ninguém nos forçou a optar fosse pelo que fosse, contra fosse o que fosse. Estamos no plano económico mais perto da Europa, sem esquecermos o ultramar e o resto da humanidade.
Não abdicámos do nosso genuíno modo de estar no mundo, sem sermos deste mundo exclusivamente europeu. Nem Portugal se esgota na Europa, nem a Terra se resume ao continente europeu. Continuamos iguais a nós mesmos, na Europa e em África, na Ásia e na Oceânia, nas próprias Américas por comunidades de língua e de sentimentos e dupla cidadania.
Cidadãos do mundo pelo mundo esparsos, em igualdade de direitos e deveres, numa cidadania que a todos nos une e há-de fazer a grandeza - está-o fazendo já - da comunidade lusíada. Os seus mortos são os nossos mortos, os vivos ... nossos vivos são. E, recordando uns, iremos construindo o futuro de vindouros.
O espírito e a língua portugueses, a cultura e a civilização lusíadas, o modo de ser e de estar no mundo, por toda a parte se afirma e faz a nossa originalidade, a individualidade do génio português.
Superior a fronteiras geográficas e étnicas, pluricontinental e inter-racial, a comunidade lusíada será uma força no mundo de amanhã se todos nos dispusermos a colaborar na ingente tarefa que a todos nos chama e deve, unidos, congregados, dar sentido à nossa existência colectiva.
Não estamos isolados nem na Europa, nem na África, nem no resto do mundo. E porque assim é, os caminhos do futuro, do futuro desenvolvimento de Portugal europeu, passam aqui e agora, também, pelas estradas da Europa, que aprendemos a percorrer como turistas, emigrantes ou negociadores bem antes do estabelecimento destes Acordos com a Comunidade Económica Europeia alargada e a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço e seus Estados membros, ou da precedente adesão à Associação Europeia de Comércio Livre (E. F. T. A.).
A integração, pois em linhas múltiplas não TOS deve dispensar, nesta hora de reconstrução ou rearranjo dos espaços económicos europeus, de prestar atenção aos problemas concretos da nossa economia e gente, que assim vai, dolorosamente às vezes, coração sangrando de saudade, calcorreando os caminhos da Europa, por não termos sabido ou podido oportunamente construir, nesta «ditosa Pátria, minha amada», o futuro por que muitos de mós e aqueles que haverão de vir anseiam.
Virados parcialmente à Europa, mas voltados para o inundo - que o coração português sempre foi suficientemente grande para amar ... -, não nos é lícito nesta hora desperdiçar oportunidades, desaproveitar vantagens.
«E atrasar benefícios concretos e ao nosso alcance em nome de aleatórios resultados longínquos», como se lê no parecer da Câmara Corporativa, «quando situados no domínio das hipóteses ou no plano das aspirações políticas [...] é ficar surdos aos problemas dos homens em concreto e significa desconhecer, na prática, a instante necessidade e urgência de levar a efeito a promoção
sócio-económica e sociocultural do País.»
Pela minha porte, não o farei.
Nesta conformidade, considerando que, realisticamente, haverá que contemplar prioridade no campo económico se pretendermos afirmar-nos politicamente como nação, dou a minha aprovação sem reservas - já que a não posso propor por aclamação - aos Acordos negociados.
O Sr. Magalhães Mota: - Sr. Presidente: Todos nós teremos escutado, aqui ou além, por vezes um reparo, outras uma crítica, à celeridade, do debate sobre os tratados europeus.
Parece, a quem assim pensa, que de algum modo se estará minimizando a importância dos Acordos para a vida portuguesa dos próximos anos.
Havemos de confessar ter a crítica alguma razão de ser: mais grave lacuna, porém, me parece a falta de informação que acompanhou as negociações e a importância de que se revestem os mil e um problemas da vida de todos os dias de cada um de nós que, de um ou de outro modo, são confrontados com uma nova realidade. Dificilmente se compreende ou aceita que opções fundamentais para a sociedade portuguesa possam ser adoptadas sem ouvir os interessados, sem a larga e objectiva participação da comunidade.
Prefiro, porém, colocar-me noutro ângulo de visão e se é possível e lícito, formular - um desejo: que, perante a mesma pressão do tempo, sejamos capazes de agir e não adiar. Demasiadas palavras já gastámos.
Por isso até antecipadamente me penitencio. A única desculpa é a que Vieira usou. Mas não queria deixar de, tão rapidamente quanto possível, sumariar alguns pontos, muito claramente, para que, se para tanto tiver talento, não fiquem pairando algumas dúvidas, permaneçam silêncios cujo significado mal se apreende, se confundam apoios reticentes com adesões francas.
«Há-de facto - poucas querelas que confessem completamente as suas razões. Tão depressa estas pare-