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8 DE FEVEREIRO DE 1973 4553

O Sr. Presidente: - Se nenhum de V. Exas. deseja usar da palavra sobre o assunto, considero as rectificações definitivas.
Vamos passar à segunda parte da ordem do dia: apreciação do aviso prévio sobre meios de comunicação e problemática da informação em Portugal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Castelino e Alvim.

O Sr. Castelino e Alvim: - Sr. Presidente: Quando o Sr. Deputado Magalhães Mota anunciou o aviso prévio sobre meios de comunicação social e problemática da informação, quis ter a amabilidade de me sugerir a intervenção neste debate.
Gostosamente a tal me dispus, na certeza de que, por fraco que fosse o contributo, o interesse do tema bem merecia o esforço de reflexão de cada um de nós.
Se então manifestei gosto em vir aqui pensar um pouco em voz alta, o tempo que decorreu desde o anúncio do aviso prévio, longe de diminuir o interesse da intervenção, antes veio reforçar a razão da mesma.
Com efeito, a actualidade do tema, que hoje sentimos tão intensa como ontem, veio-nos dar a certeza de estarmos a colaborar na análise de uma matéria cuja importância e interesse o tempo, longe de desgastar, mais aviva.
Vem-nos dar a certeza de que tudo o que se refere a informação e comunicação mereceu ontem, como merece hoje e continuará a impor amanhã, madura reflexão e ponderada apreciação.
Depois de ter ouvido com a maior atenção e interesse e não menor utilidade os colegas que me antecederam nesta tribuna, julgo não poder deixar de reflectir um pouco sobre as responsabilidades de uma sociedade organizada face à problemática da informação e da comunicação social nos nossos dias.
Verificamos, sem dificuldade, que o mundo em que nos movimentamos, a sociedade em que vivemos, está a abandonar os velhos padrões da sociedade de classes, que teve o último reduto na sociedade industrial do século passado, para dar lugar a uma sociedade de massa em que o dramático conflito das classes sociais cada dia mais esmorece, mais se atenua, mais se apaga.
Mas o apagar dos conflitos entre as classes de modo algum pode significar que a nova sociedade nasça, ou possa viver, sem problemas.
A sociedade nascente, como todos os tipos de sociedades que a precederam, traz em si mesma o vírus das suas próprias dificuldades - o mito da sua bondade.
A sociedade moderna abandonou o endeusamento de seres incriados ou de seres criados, esquece o homem como centro e razão de toda a vida social, para, progressivamente, se deixar dominar pelo grande número que, obstinadamente, vai exercendo uma pressão, dia a dia maior, sobre todo o poder organizado, procurando obter cada vez mais regalias, mais facilidades e até mais distracções.
Mas, a par desta luta, assiste-se igualmente ao esmagamento, dado o natural nivelamento por baixo, mais do que das elites, dos valores culturais e morais que essa sociedade de massa talvez não queira directamente contraditar, mas em que no seu movimento não repara, não vê, nem sente.
Os valores que constituíam o fulcro e a base das sociedades, que à nova sociedade deram lugar, subvertem-se face a uma insensibilidade crescente ou a um conformismo progressivo.
O valor moral e religioso cede, assim, o passo a subvalores ou contravalores.
Mas essa sociedade grande número, que se movimenta aparentemente libertada de grilhetas, dificilmente repara que nunca esteve mais próxima de se deixar conduzir, se não mesmo embriagar, por pequenos grupos de poder ou de pressão, que a acabam por conduzir a seu belo talante.
São aqui e hoje os trusts ou a alta finança; amanhã e ali os menagers ou os publicistas; acolá e depois os grupos de terror ou de sabotagem.
Na aparente força da sociedade de massa residirá porventura a sua terrível fraqueza.
Ora, uma das características da sociedade dos nossos dias reside, precisamente, no incontável número de mensagens que em cada momento a essa sociedade são dirigidas, queira ou não queira cada um dos seus elementos recebê-las.
A rádio, a televisão, o anúncio, os discos, os jornais e os panfletos entram-nos em casa ou no escritório, vêm ter junto de nós ao trabalho, como não conseguimos evitá-los nas horas de lazer.
A sociedade de massa encontra-se intimamente ligada, direi mesmo que pressupõe, à comunicação de massa, modeladora da cultura de massa.
Ora, a comunicação de massa, nos seus termos actuais, encontra-se industrializada ou tende para essa industrialização... e tem como produto, disse-o, a cultura de massa.
Cultura de que podemos discutir as virtudes ou os defeitos, mas que não podemos ignorar.
Como diria Levi-Strauss:

Não nos encontramos em presença de um fenómeno patológico, mas devemo-nos habituar a viver numa sociedade de grandes dimensões, no interior da qual há modelos culturais, totalmente heterogéneos, mas que não deixam de ser fenómenos culturais... a televisão é uma cultura, o yé-yé é uma cultura.

Tendo procurado situar o contexto em que se insere a problemática da comunicação nos dias de hoje, julgamos não poder deixar de tomar uma posição no que se refere à atitude do Estado perante os meios de comunicação social.
Vivemos e queremos continuar a viver num Estado ético que não só reconhece como se propõe assegurar o respeito por valores que o transcendem e que, inclusivamente, limitam a sua soberania.
Vivemos e queremos continuar a viver numa sociedade que desejamos cada vez mais progressiva, mas em que o progresso não signifique o atropelo de valores que consideramos básicos de uma civilização.
Vivemos e queremos continuar a viver num Estado em que os seus órgãos não atraiçoem o mandato que lhes é confiado pela Nação.
Se assim queremos continuar a viver, não podemos nós, como não pode o Governo, atraiçoar o valor de um mandato, como calcar aos pés princípios e normas que nos ultrapassam.
Tolerar abusos, admitir a quebra de princípios sagrados, cruzar os braços perante as afrontas à moral