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4554 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 223

e à ordem, não é aceitar a participação, mas fomentar a alienação... não é governar, mas abdicar.
Abdicar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se raramente é fugir... muitas mais vezes é fingir.
Fingir que se não vê, fingir que se não ouve, fingir que se não sente.
E, na sociedade em que vivemos, quantas vezes não somos comparsas deste fingimento!
Fingimento mentira... fingimento compreensão... fingimento abdicação.
Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, queremos deixar bem vincado o nosso voto contra tais abdicações.
Não pode a sociedade abdicar de conquistas que foram e são base de um tipo de civilização.
E porque a sociedade o não pode fazer, igualmente o não podem os seus órgãos, seja a que título for.
Somos por uma participação que desejamos se vivifique em cada dia.
Mas, porque o somos, não podemos confundir participação com abdicação, com cedência a teorias, usos ou práticas que ataquem a ordem, a moral e os bons costumes - não temos receio de que apodem de despotismo a intransigente defesa de uma ordem jurídica e moral que é orgulho de uma pátria e sinal de uma civilização.
Tentemos ser claros e não fujamos, sobretudo, a actuar com clareza.

O Sr. Pinto Castelo Branco: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Só ao regressar, no fim do interregno parlamentar, de uma deslocação ao Estado portuguesíssimo de Angola - donde voltei mais seguro ainda, se tal fora possível, da obra magnífica de promoção sócio-económica que ali se está a realizar à sombra da bandeira nacional, e ainda mais certo do que antes, de que só essa mesma bandeira é capaz de assegurar tal desenvolvimento em termos de verdadeiro universalismo de raças, credos e culturas -, só ao regressar desta viagem, dizia, tive conhecimento da efectivação, agora, do aviso prévio.
Motivos de vária ordem, a maioria dos quais ligados à minha própria participação nos trabalhos da Assembleia, impediram, pois, de me preparar com a extensão e profundidade que, além das limitações pessoais, a mesma vastidão do tema naturalmente exigia.
Irei, portanto, procurar apenas trazer algumas simples achegas ao debate. E terei também de deixar de lado os comentários que me foram sugerindo, no seu decurso, algumas das intervenções já produzidas, resumindo-as a este único apontamento: de que a variedade, direi melhor, o pluralismo das opiniões expendidas, se é certo que em meu entender demonstra não existir o que se possa chamar um consenso da Assembleia sobre a matéria, demonstram, por outro lado, o óbvio e universal interesse de que se reveste, que manifestamente transcende muito o caso português. Por isso, também, aproveito para felicitar o Sr. Deputado Magalhães Mota pela iniciativa da apresentação do aviso prévio. E aproveito igualmente para o felicitar, bem como os restantes e igualmente ilustres Deputados intervenientes, pela forma, que se me afigura exemplar, pela qual o debate se tem processado.

O Sr. Magalhães Mota: - Muito obrigado!

O Orador: - Sr. Presidente: Nesta matéria, como aliás em muitas outras (quiçá em todas), a minha posição pessoal decorre basilarmente de dois factos: o de ser católico e o de ser português.
Aliás, em minha opinião, o segundo, em larguíssima medida, não é inteligível sem o primeiro, pois que não tenho dúvida em afirmar que o cristianismo foi, é, e será a argamassa que cimenta desde a sua fundação o próprio ser da Nação Portuguesa, sem menosprezo, aliás, por outras influências igualmente reais, mas menos sensíveis.
Em larga medida, creio não ser discutível que o fenómeno português, desde o seu início, é dificilmente explicável sem o fenómeno cristão. Mais especificamente ainda, sem o catolicismo. Daí também que, naturalmente, quando, como actualmente sucede, a igreja católica atravessa um período de crise, por muito fugaz que este seja em termos de eternidade, necessariamente Portugal tem de sentir-lhe as consequências, sofrendo-as na alma e na carne.
Este o motivo que me leva a pedir licença à Câmara para citar (mas não em tom elegíaco ...!) alguns trechos da Carta Apostólica Octogésimo Adveniens enviada pelo Papa Paulo VI, no octogésimo aniversário da encíclica Rerum Novarum, ao cardeal presidente do Conselho dos Leigos e da comissão "Justiça e Paz".
E, assim, principiarei por reproduzir os parágrafos que se referem especificamente à ideologia e liberdade humanas.
Diz o Papa:

Também para o cristão é válido que, se ele quiser viver a sua fé numa acção política, concebida como um serviço, não pode, sem se contradizer a si mesmo, aderir a sistemas ideológicos ou políticos que se oponham radicalmente, ou então nos pontos essenciais, à sua mesma fé e à sua concepção do homem: nem à ideologia marxista, ou ao seu materialismo ateu, ou à sua dialéctica da violência, ou, ainda, àquela maneira como ele absorve a liberdade individual na colectividade, negando, simultaneamente, toda e qualquer transcendência ao homem e à sua história, pessoal e colectiva; nem à ideologia liberal, que crê exaltar a liberdade individual, subtraindo-a a toda a limitação, estimulando-a com a busca exclusiva do interesse e do poderio e considerando, por outro lado, as solidariedades sociais como consequências, mais ou menos automáticas, das iniciativas individuais, e não já como um fim e um critério mais alto do valor e da organização social.
Será necessário sublinhar a possível ambiguidade de toda e qualquer ideologia social? Umas vezes, elas reduzem a acção política ou social, a ser simplesmente a aplicação de uma ideia abstracta, puramente teórica; outras vezes, é o pensamento que se torna instrumento ao serviço da acção, como um simples meio de uma estratégia. Em ambos os casos, não será o homem que corre o risco de ficar alienado? A fé cristã situa-se num plano superior e, algumas vezes, oposto ao das ideologias, na medida em que ela reconhece Deus, transcendente e criador, o qual interpela o homem como liberdade responsável, através de toda a gama do criado.