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18 DE DEZEMBRO DE 1982 937

tiva às formas de vida humana, que só na perspectiva da unidade humana de vida se entende.
Daí que as noções de conjunto, de colecção e de espaço de protecção ou área circundante sejam noções fundamentais». Tal como o homem, também as suas obras, como que convivem, entre si, num relacionamento que deve ser normalizado e organizado.
Em terceiro lugar, a noção de património desta lei compor a uma ligação entre a obra da natureza e a obra do homem, sem dúvida especialmente valorizável num país cuja geografia tem aspectos, por si só, de uma obra de arte. A noção de sítio que a lei consagra é agora a tradução disto mesmo. Falta ainda, isso sim, uma ligação entre o regime de património cultural e de património ambiental, problema que se procurará resolver «cooperativamente» no futuro, entre áreas que aliás são diferentes na orgânica do Governo.
Em quarto lugar procurou-se uma integração conceitual entre bens físicos e bens imateriais, compreendendo-se neste conceito a língua, os símbolos e as tradições. Quantas vezes os próprios bens patrimoniais físicos se agrupam e entendem à volta dos bens imateriais, do próprio mito que é culturalmente sem dúvida dos mais produtivos entre todos.
Faltam, porventura, referências mais substanciais ao artesanato assim como ao património etnográfico que se pensa introduzir, por sugestão, aliás, de 2 dos grupos parlamentares desta Assembleia.
Em quinto lugar, a última forma de integração é a que tem a ver com a relação entre património e a criação viva ou a criação actual.
O património não pode ser uma natureza-morta. Não se pode ter dele uma noção mórbida como qualquer conjuntura de ruínas. É possível sobre ele viver a vida moderna. Foi o que se pretendeu já pôr em marcha com o projecto para o edifício da ex-Standard Eléctrica. Uma outra sugestão que poderia parecer oportuna neste campo, na altura em que se iniciam novos mandatos de gestão municipal, seria por exemplo, o de as câmaras municipais transformarem os antigos mercados das suas cidades e vilas, alguns já quase abandonados, ou em vias de o serem, em verdadeiros centros culturais.
Quis-se, também, consagrar uma noção participada do património cultural.
Partimos, pois, aqui do principio da solidariedade entre a Sociedade Civil e o Estado no domínio das responsabilidades do património. Não deve aqui haver mera coexistência de sectores de propriedade, mas sim uma clara solidariedade entre eles.
No quadro da descentralização, há uma responsabilização das câmaras municipais que agora poderão passar a classificar bens de interesse local e gozarão de direitos de preferência sobre aquisição de bens classificados, em certas condições. Mesmo aqui, porém, deverá também intervir o Instituto Português do Património Cultural, podendo discutir-se, no entanto, qual a natureza do parecer que deve emitir a propósito das classificações camarárias. Os vários órgãos da administração deverão, por outro lado, consagrar nos seus orçamentos uma percentagem adequada à protecção e valorização do património cultural que esteja à sua guarda.
Aos particulares, por sua vez, são reconhecidos mais deveres mas, ao mesmo tempo, mais direitos e mais vantagens. Contam-se entre estes os de serem
ouvidos no processo de classificação e várias isenções fiscais. As garantias públicas são, por sua vez, reforçadas através de novas formas de penalização e garantia. Quer-se, porém, que a classificação não equivalia mais a uma espécie de expropriação larvada, que só traz ónus e formas de desvalorização para os proprietários de bens culturais classificados.
Espera-se, igualmente, um importante papel da Igreja, das Forças Armadas e das Misericórdias, entre outras instituições, detentoras da mais importante parte do património cultural português. De resto, a importação de bens culturais pelas instituições com fins desse tipo fica isento de pagamento de imposto, o que muito favorecerá as nossas fundações - a Fundação Gulbenkian nomeadamente - e poderá, também, permitir a reconstituição de certos espólios de propriedade nacional.
Um claro regime de compra, venda e comércio de antiguidades que defenda a nossa riqueza artística perante o mercado internacional de arte, um regime dos achados arqueológicos que assegure especiais formas de prevenção, tal como se prevê com as reservas arqueológicas de protecção e direitos especiais do Estado, as regras sobre registo de bens culturais, o averbamento no registo predial de bens imóveis classificados, a emissão do livre: e ou certificado de registo para os bens móveis classificados, o alargamento da zona normal de protecção dos imóveis, classificados, a insusceptibilidade de aquisição por usucapião de bens culturais móveis classificados e a possibilidade de permuta e transferência de bens culturais são outras tantas reformas importantes propostas pelo novo quadro legislativo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que no seu conjunto a questão do património cultural é uma questão estratégica que deverá merecer uma maior mobilização nacional. É por isso que temos consciência que uma lei não basta. Mas é um passo no sentido da organização antianárquica e do movimento anti-inércia. Organização e direcção globais são, aliás, um problema geral do regime e do País.
Património e patriotismo são, também, palavras que colam uma à outra. É verdade, pelo menos, que um esclarecido entendimento nacional se pode e deve fundar sobre o património cultural. Reside nele um indiscutível certificado da nossa histórica via original. Passa por aí a genealogia das novas formas de autoridade e convivência. Sem uma perspectiva das nossas formas de autoridade e convivência, sem uma perspectiva da história cultural e da responsabilidade pelo património que a traduz o poder pode cair numa espécie de Hipertensão nacional, concentrada sobre as questões apenas presentes ou actuais.
De resto, em geral, para evitar a facilidade de dependência e do mimetismo é preciso assumir mais a nossa cultura e a nossa história e fundar sobre ela a beleza viva e a criação actual. Assim como a inspiração colectiva a todos os níveis.
Não se trata de cair em qualquer nacionalismo cultural mas, ao contrário, de reforçar a nossa força, a nossa qualidade e a nossa personalidade externas, num mundo em que quem não se reconhece não existe. É essa a condição essencial para que, mesmo sendo um país-pobre, não venhamos a ser um pobre país.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.