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28 DE JANEIRO DE 1983 1363

se preserva e perdura sem que a vida política desenvolvida no seu seio traduza uma realidade ética e moralmente forte e respeitada.
Mas é também do nosso conhecimento que os homens - por eles próprios e pelas suas circunstâncias - nem sempre se comportam na sociedade política em que pontificam com pleno respeito pelos princípios éticos e morais que deles seria legítimo esperar.
A violação ou mesmo o simples receio de violação dos princípios enunciados, embora genericamente, faz logo surgir a ideia e a necessidade da tomada de medidas de índole diversa: umas, meramente políticas, e outras, de carácter legislativo; algumas, só preventivas, e outras, mesmo repressivas, mas todas, afinal, orientadas numa única direcção: a moralização da vida política, como condição de credibilidade e solidez da organização do Estado de direito democrático.
Se nos fosse pedido para, numa curta fase, exprimirmos os fundamentos e a finalidade do projecto de lei n.º 171/II, sobre o controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos, nós diríamos, na sequência do que vimos afirmando, que ele assenta e se dirige à prossecução do que temos por essencial em democracia: a moralização da vida política.
Quanto a nós, a transparência da situação financeira dos titulares dos cargos políticos muito poderia contribuir para essa moralização.
Aqueles que dispõem de poder, não se eximindo à obrigação de prestar contas à comunidade, arredariam desta a tentação das suspeitas, dos juízos pejorativos, da invenção de escândalos financeiros, tudo porventura infundado, mas de frequente uso e abuso, seja em privado, seja em público, quando não menos com tratamento e especulação a nível de órgãos da comunicação social.
Como observa o nosso ilustre colega Dr. Raul Rego, no seu livro Os Políticos e o Poder Económico:

Caluniados foram sempre os nossos homens públicos, e o século XIX e o primeiro quartel do século XX deram-nos bastos exemplos de boatos de riquezas atirados sobre quem, às vezes, apertava bem apertado o cinto na sua economia caseira. E homens ricos houve que entraram na política e lá deixaram os bens herdados.

A observação que citámos continua a ser verdadeira em relação à nossa realidade actual.
De facto, de quanta maledicência não são ainda hoje vítimas muitos dos titulares dos cargos políticos. Alguns se têm mesmo justificado publicamente sobre* a origem dos seus bens ou até os quantificam, como o fez bem recentemente na televisão um político muito conhecido, que foi confidenciando a milhões de telespectadores que só tinha de seu a casa e o automóvel.
Se quisermos extrair a lição dos apontados comportamentos, diríamos que existe a consciência de que é útil, necessária e honrosa a revelação pública da situação financeira daqueles que exercem cargos políticos e que essa revelação é estimada pela comunidade.
Diríamos também que a aprovação de medidas legislativas que vão nesse sentido, longe de confirmar um acto generalizado de desconfiança em relação à chamada classe política, traduziria, pelo contrário, um reforço da sua imagem pública e da sua salvaguarda contra falsas arremetidas de adversários, de gente sem escrúpulos e dos inimigos da democracia.
Diz o povo, com a sua sabedoria, que quem não deve não teme e a verdade é que não basta que os titulares de cargos políticos sejam honestos; têm de, como a mulher de César, ao menos, parecê-lo, apresentando-se em público como tal.
São preocupações como as que vimos sucintamente expressando que explicam a razão de ser do projecto de lei em debate.
Projecto que se inscreve na mesma linha de orientação com que os deputados da ASDI apresentaram nesta Assembleia diversas iniciativas, seja o projecto de lei n.º 137/II, sobre o combate à imoralidade administrativa, fraude e corrupção, sejam os inúmeros requerimentos formulados com idênticos fins, seja a constituição por nós suscitada de algumas comissões parlamentares de inquérito, ou a invocação da lei n.º 266, de 27 de Julho de 1914, a aplicar no chamado caso «Alfaia versus ANOP» ou «Alfaia pró NP».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que a tradução prática da filosofia subjacente ao projecto de lei em debate, consistirá na obrigatoriedade da apresentação de declarações do património e rendimentos no início e no termo do exercício das funções de Presidente da República, deputado, membro do Governo e outras funções julgadas de carácter político, tanto da República como das regiões autónomas, independentemente do facto de os respectivos cargos terem sido assumidos por eleição, por nomeação ou por cooptação política.
A apresentação de uma tal declaração haverá de ser feita com alguns detalhes, sem o que não seria susceptível de produzir os efeitos úteis que com ela se pretendem alcançar e, por isso, se propõe que da mesma conste uma descrição, por grandes rubricas, dos vários elementos que compõem o património pessoal, tanto activo como passivo, a indicação dos cargos sociais ou outros exercidos em empresas de qualquer natureza, no País ou no estrangeiro, e, bem assim, a indicação do rendimento colectável bruto para efeitos de imposto complementar e demais rendimentos isentos, ou não sujeitos a este imposto.
Para que esta obrigação adquira o quantum satis de jurisdicidade, estabelece-se como sanção ao seu incumprimento a inibição, para o exercício de cargos públicos, até 5 anos e demissão automática dos cargos e funções públicas que se exerçam, a declarar judicialmente, a pedido do Ministério Público.
A tanto se resume, no essencial, a economia do projecto de lei em debate.
O tempo decorrido desde a sua apresentação nesta Assembleia, a qual teve lugar em Março de 1981, e certas alterações institucionais resultantes da revisão da Constituição impõem que sejam introduzidas modificações no articulado, se bem que ligeiras, e que vamos apresentar de imediato na Mesa desta Assembleia.
Dizem respeito, concretamente à atribuição ao Tribunal Constitucional da competência para o arquivo das declarações prestadas, à eliminação dos ex-membros do Conselho da Revolução do elenco dos titulares de cargos políticos e à actualização do preceito relativo à vacatio legis estabelecida.
Poder-se-á sustentar que os princípios defendidos neste projecto de lei deveriam conduzir ao alargamento da obrigatoriedade da apresentação das declarações de riqueza pessoal a outros titulares de cargos públicos, nomeadamente àqueles que desempenham funções autárquicas. Também estes são muitas vezes alvo de injustificadas