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4 DE FEVEREIRO DE 1983n 1427

De igual modo, a mesma ideia de plenitude do Orçamento - um só orçamento e tudo no orçamento -, consagrada no n.º 5 do artigo 108.º da Constituição, implicaria também a ideia de que não existem orçamentos provisórios.
E a própria história política e legislativa dos orçamentos demonstra que foi para evitar a possibilidade de fuga ao controle parlamentar que a existência de vários orçamentos ou de orçamentos sucessivos permitiria - que sempre se consignou a ideia de um só orçamento e da sua plenitude. E isso traduz-se inclusivamente numa dificuldade para o governo seguinte, pois se, em 1983, um novo governo quiser apresentar uma proposta orçamental, essa proposta - é o meu entendimento - não deverá ser admitida, porque o mesmo princípio de unidade e plenitude orçamental implicará que essa proposta não possa ser aceite, pois em cada ano há um só orçamento e no Orçamento tudo deve estar contemplado.
Acresce e essa é uma velha questão- que, nos termos da Constituição não revista - e que são os aplicáveis a esta discussão orçamental- o Orçamento depende do Plano. Ou seja, só haveria lugar à apresentação de uma proposta de orçamento depois de uma proposta de lei do Plano ou de grandes opções de Plano, visto que o Plano integra o Orçamento e, como é óbvio que um governo de gestão não pode apresentar uma proposta de Plano, também é óbvio que não possa apresentar uma proposta orçamental.
Se tudo isto é assim, como parece, porque não impugnamos então a admissão desta proposta? Direi que por duas ordens de razões: razões políticas e de utilidade. Pensamos que a Assembleia da República deve ser dissolvida quanto antes e que estas questões são urgentes; não estamos, assim, em tempo de nos envolvermos em questões meramente processuais, por muito respeitáveis e dignas que sejam. Cumpre-nos ir ao fundo das questões e o nosso objectivo é conseguir que as eleições se efectivem no mais curto prazo possível.
Em segundo lugar, porque o controle da constitucionalidade neste momento existente é um controle que temos por extremamente deficiente. Esta Assembleia votou por maioria, com a nossa flagrante oposição, uma constituição do Tribunal Constitucional que na devida altura criticámos - e fizemo-lo com tanta razão que esse Tribunal continua por constituir -, indo agora a Assembleia da República ser dissolvida, havendo juizes eleitos com um mandato por 6 anos - ou seja, comprometendo a nova legislatura -, sem que esses mesmos juizes, que não conseguiram cooptar os membros que faltam para o Tribunal Constitucional poder funcionar, aqui venham depor os seus mandatos para que seja a nova Assembleia a escolher os novos juizes.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - A não ser assim, a fiscalização da Constituição será efectuada em termos reduzidos: a fiscalização da Comissão Constitucional só existe para a fiscalização judicial artigo 282.º -, estando a fiscalização abstracta paralisada e a fiscalização preventiva a funcionar deficientemente.
Assim, também nós não ganharíamos muito com o levantar da questão da inconstitucionalidade e, por outro lado, não retiramos nenhuma garantia aos cidadãos. De facto, a Constituição dispõe, no n.º 3 do artigo 106.º, quê ninguém pode pagar impostos que não tenham sido criados nos termos da Constituição; o Código de Processo das Contribuições e Impostos, por sua vez, considera motivo de oposição à execução fiscal a mesma falta de criação e autorização constitucional quanto a impostos. Os cidadãos poderão, assim, recorrer aos tribunais, caso estejam interessados em suscitar a questão da inconstitucionalidade desta proposta.
Não retiramos, portanto, nenhumas garantias, pelo que as razões políticas puderam ser para nós prevalecentes. E essas razões políticas levam-nos a considerar que é preferível um quadro de relativa segurança a um quadro de indefinição, ou seja, é preferível existir um quadro orçamental a não existir quadro orçamental nenhum.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - E a nossa posição pelo menos a de alguns deputados que se sentam na bancada da Acção Social-Democrata Independente não é de hoje. Em 1979, precisamente para que o país pudesse ser dotado de um orçamento, tomamos publicamente uma posição no sentido de que esse orçamento pudesse ser viabilizado. Nessa altura, houve alguns deputados e até alguns recentes adeptos do Prof. Mota Pinto que o alcunharam de todos os delitos - que preferiram fazer custar 12 milhões de contos ao País do que discutir seriamente um orçamento geral do Estado. Não foi essa então a nossa posição e não será também a posição que agora tomaremos.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Temos, portanto, este Orçamento como um mal menor. E temo-lo fundamentalmente como uma discussão que em termos políticos se processa numa situação que é ou pode ser de autêntica eutanásia - e parece-me particularmente relevante chamar a atenção para este ponto. E creio que sobre isso vale a pena reflectir antes de discutirmos, na especialidade, esta proposta orçamental.
Esta Assembleia da República assumiu, ela própria, o pesado encargo e responsabilidade de se demitir dessas mesmas responsabilidades e de assumir claramente as suas obrigações, e ficou a aguardar: do Governo, soluções; do Presidente da República, a dissolução. E pôs-se nessa situação de quem aguarda de outrem a resolução dos seus próprios problemas, porque ela própria não foi capaz de enfrentar corajosamente os problemas com que se defrontava. Não foi capaz de os assumir e não quis responsabilizar-se por soluções.
A história desta legislatura é a história de um progressivo esvaziar do Parlamento. E creio que também vale a pena que todos tenhamos consciência disto. Quando permitimos que uma disciplina partidária rigidamente entendida transforme os deputados em alguma coisa que se muda como as pedras de um jogo das damas ou do xadrez, em substituições de última hora ditadas pela regra do voto, quando lhe exigimos que violentem o seu pensamento e a sua consciência, quando estamos a tratá-los, afinal, como coisas e não como pessoas, nestes casos, é o próprio Parlamento que estamos a pôr em causa.
Só há parlamentos livres quando os deputados que os compõem são livres!

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!