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14 DE DEZEMBRO DE 1984

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O debate que se fazia há alguns anos sobre a defesa era militar. Hoje, aquele que se faz sobre a defesa militar não tem eminentemente esse carácter. Pelo contrário, é um debate de um projecto global de sociedade e por isso é um debate de inovação, mas também de reafirmação de alguns valores. Deste modo, denota-se alguma estranheza na recordatória dos mesmos. No fundo, é um debate de reafirmação.
Creio que - para tornar o debate mais explícito e perspectivar a opinião do meu partido - valerá a pena ter em conta os 5 elementos ou postulados de partida que nós consideramos essenciais em termos de referencial de análise: o primeiro, é o Estado multissecular; o segundo, é a existência da Nação como a temos hoje; o terceiro, é a que resulta de correlação de forças no âmbito mundial; o quarto, é a nossa geografia; o quinto, e último, são alguns factores novos trazidos pela democracia portuguesa nos últimos 10 anos.
Um debate desta natureza transcende no tempo a opção de um governo e a vigência de uma geração, pois configura aspectos que estão para além da política de um governo e que permanecem independentemente de uns e daqueles que se lhes seguem. Por essa razão, é também um debate de imanências.
Portugal assenta num Estado multissecular e hoje também numa Nação que tem contornos diferentes daqueles que teve há alguns anos. Aliás, é importante a prefiguração, a visão da evolução da Nação nos últimos séculos, bem como a de um Estado que, actualmente, é bastante mais reduzido em relação àquele que tivemos até, diria, há cerca de 10 anos.
Encontramos hoje uma nação suficientemente mais forte e mais ampla e que não corresponde à própria territorialidade genérica do Estado português ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... de um Estado amplo e multifacetado que, hoje, é truncado face à emergência da descolonização. Portugal deixou, todavia, pululantes pelo mundo um conjunto de comunidades, que fazem actualmente da Nação portuguesa mais uma noção de povo do que de próprio território.
A dimensão territorial inframuros da Nação portuguesa é demasiado restritiva para a visão dessa mesma Nação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Daí, da existência desse Estado multissecular e dessa Nação que é hoje uma comunidade espalhada pelo mundo, têm-se implicações directas no âmbito das relações externas do Estado português.
O terceiro dado de partida neste debate é a correlação de forças mundial.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vivemos num mundo bipolar. Custa muito ouvir esta realidade, porque se no âmbito meramente político-diplomático ela é multipolar, se na área meramente diplomática ela se exerce, todavia tal realidade não tem tradução efectiva no seio das relações de Estado, a não ser numa óptica bipolar.
A multipolaridade mundial é diplomática, não é efectora. Em termos de meios efectores o mundo reduz-se hoje - queiramos ou não - a uma realidade bipolar.
Portugal não mergulha a sua acção nessa realidade bipolar, já que ela é consubstanciada e traduzida na direcção de duas superpotências, mas Portugal coexiste

e vive num mundo de relação entres essas duas superpotências. Por isso, a realidade bipolar implica que só sejam verdadeiros pólos quem detém meios estratégicos de primeiro e segundo ataque (retaliação).
A diferença entre a generalidade das potências do clube nuclear e as potências classificadas como < superpotências» está em estas últimas deterem meios estratégicos de primeiro e segundo ataque. _ Daí a realidade decorrente do mundo bipolar em termos de capacidades efectoras. É nessa correlação de forças que Portugal se insere.

Quarto aspecto, Portugal insere-se geograficamente como uma inevitabilidade da qual decorrem consequências muito ricas e muito vulnerabilizantes para o País. A nossa força é a nossa geografia, mas a nossa debilidade é essa mesma geografia.
Teórica e geograficamente, isto é, numa linguagem de mera geografia e não de geopolítica, Portugal é uma zona periférica da Europa, mas essa periferia é falsa. Portugal está num centro de acção e de inter-relação de superpotências.
Portugal, apesar de estar na periferia geográfica da Europa e de ser um triângulo geográfico - Açores, Madeira e continente --, que se reporta a essa realidade, não assume a sua posição da periferia geográfica na Europa mas antes, uma característica de placa giratória. Diríamos mais: sendo a realidade mundial militar e política tridimensional, Portugal não é uma placa giratória, é acima de tudo um cilindro giratório. E é-o nas várias feições que assume a realidade da correlação de forças no mundo bipolar.
Em primeiro lugar, é-o porque a disputa no mundo bipolar faz-se em sede de duas realidades: a primeira, é o controle ou a neutralização das zonas de reservas de matérias-primas, energéticas ou não; o segundo, nas zonas onde existem recursos humanos, científicos e tecnológicos. Por isso, hoje, os conflitos são numa primeira fase periféricos e só numa segunda fase centrais. A Europa é a última moeda de troca, mas será sempre nessa ordem de ideias o primeiro alvo.
É ainda nesse sentido que Portugal está na zona de passagem dos abastecimentos das matérias-primas, de importações e exportações por via marítima ou terrestre, do e para os países do terceiro-mundo e da Europa. Num segundo sentido, Portugal é ainda geograficamente considerado na zona que privilegia uma confluência de interesses para intervenções potenciais em áreas exteriores ao interesse nacional e à dimensão da soberania portuguesa mas que não são exteriores aos interesses das duas superpotências.
Queiramos ou não Portugal está, em termos geográficos, não numa periferia mas num centro e o nosso triângulo estratégico é de importância maior do que aquela que representa a mera dimensão territorial.
O quinto elemento a ter em conta como referencial na análise é o problema duma vontade política nacional. Há 10 anos que temos um regime democrático e embora não seja um dado extremamente importante para a análise do Conceito Estratégico de Defesa Nacional é, todavia, um elemento referencial importante que valoriza a opção portuguesa, porque é inerente à abertura de Portugal ao mundo e lhe dá uma perspectiva de convivência mundial mais forte.
Sendo estes, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os pontos de referência nesta análise, convém elucidarmos as três questões práticas que, naturalmente, um parlamento quer discutir sobre as grandes opções do Con-