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25 DE JANEIRO DE 1985 1625

da população encontram-se sem capacidade de sobrevivência digna. É a crise, a crise muito profunda já. Dois ou três exemplos bastam para evidenciar esses sintomas que todos conhecemos.
A questão do emprego, por exemplo. O ministro do Trabalho pode inventar números, mas a realidade vê-se. Hoje vende-se de tudo nas ruas do País: camisolas, electrodomésticos, sapatos ou fruta. E quem circula em Lisboa, por exemplo, vê ruas inteiras transformadas em mercados ambulantes, num tira e põe constante, numa luta pela sobrevivência a todo o custo, numa fuga diária à polícia. E a prostituição. Hoje não se vê só nas cidades. Existe, existe a toda a hora e é impressionante a visão das estradas no País e significa, por si só, uma das brutais acusações que podem fazer-se aos que levaram Portugal a este ponto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Basta ir à Avenida Almirante Reis, por exemplo, e ver à hora do almoço a bicha para a sopa dos pobres. A sopa que tinha desaparecido com o 25 de Abril! Hoje, diariamente são milhares rua fora que aguardam uma malga de caldo e o que mais impressiona - se os Srs. Deputados lá forem podem vê-lo - é encontrarem-se jovens, homens e mulheres em idade activa aguardando a sua vez.
E este Orçamento, Srs. Deputados, que prevê em termos sociais? Neste Orçamento não só não constam medidas sociais que ataquem a degradação das condições de vida de milhares de portugueses, como ainda se restringem direitos dos poucos existentes.
Aumentam os impostos, aumentam os preços, aumentam as propinas escolares, os descontos da função pública, os descontos dos trabalhadores rurais para a Segurança Social. Restringe-se o abono de família, corta-se a ADSE aos chamados tarefeiros. Para 1 800 000 reformados, que em Dezembro tiveram um aumento de 15 a 18% das suas pensões, anuncia-se para o ano de 1985 aumentos iguais. Isto é, as suas reformas vão descer em termos reais, mais uma vez. Foi profundamente chocante para o País, mas creio que espelha a realidade política deste Governo, que, por exemplo, a televisão passasse diariamente anúncios de aumentos dos reformados, onde se lia 700$ de aumento por mês, para a imensa maioria, enquanto o Telejornal escondia os imorais aumentos para os deputados e ministros.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!

A Oradora: - Para manter o nível miserável das prestações da Segurança Social o Governo aumenta a comparticipação do Orçamento do Estado, que este ano ultrapassa os 38 milhões de contos. Mas esta transferência é profundamente negativa, porque resulta de uma acentuada quebra de receitas. O patronato não paga, ou paga cada vez menos, o desemprego e os salários em atraso aumentam, logo as receitas descem!
Assim, é de uma demagogia ridícula o Governo vir elogiar-se das transferências do Orçamento do Estado para a Segurança Social quando isso resulta simplesmente da sua necessidade de tapar um défice cujas causas não são atacadas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O Governo não se preocupa nada com as dívidas do patronato à Segurança Social. Contra o que a lei exige, o Orçamento já nem nos apresenta dados e na exposição de motivos o número está ausente! Mas é importante para esclarecimento desta Câmara que o Governo diga aqui qual é o montante da dívida do patronato à Segurança Social e qual é a evolução dessa mesma dívida. Porque, na verdade, quando o Governo fala em grandes acções de fiscalização de fraudes, essa fiscalização incide unicamente nos beneficiários e a dívida das empresas sobe num valor que não deve andar longe dos 100 milhões de contos. Isto é gravíssimo e torna ainda mais necessária a definição do futuro do próprio sistema, tendo em conta que, por cada dois activos, há hoje no nosso país um reformado. Porém, a única inovação grande que este Governo apresenta em matéria de Segurança Social é o prever o aumento do desconto dos trabalhadores rurais que hoje pagam 150J por mês e passarão a pagar 5% do salário mínimo nacional do sector e 12% para as entidades patronais.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - É um escândalo.

A Oradora: - O Governo conta, assim, receber mais 4 milhões de contos. Mas mediu o Governo as consequências sociais desta decisão para um sector da população como os camponeses?
É uma medida inaceitável e que a Assembleia da República não pode consentir!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Inaceitável é também que os desempregados vão receber apenas cerca de metade das receitas do Fundo de Desemprego - 26,5 milhões de contos serão desviados para outros fins. Basta atentar nisto para se perceber logo o logro monumental que significa o recém-instituído seguro de desemprego. Curiosamente, no orçamento da Segurança Social a rubrica que mais sobe (e mesmo assim apenas 25%) é a acção social, exactamente aquela que iria permitir ao Governo - se lá chegasse - distribuir umas quantas benessezinhas na véspera das eleições. Há mesmo nesta Câmara quem tenha feito mais e melhor dentro do género.
O orçamento da saúde retrata bem a extrema degradação a que chegou o sector. Ao longo deste ano e meio de governação, ouvimos o ministro da Saúde louvar-se, vezes sem conta, de ter conseguido colocar 5000 médicos, que, porém, continuam, hoje como ontem, por colocar. É um intolerável escândalo a situação dos especialistas, por exemplo. São cerca de 1000 médicos de todas as especialidades que aguardam há anos o concurso, a quem o Estado está a pagar nos hospitais centrais onde quase não têm trabalho, enquanto nos hospitais distritais estão serviços inteiros paralisados por falta de médicos. Existem mais médicos que doentes nos hospitais centrais (e pobres dos doentes se um dia todos os médicos se pusessem a trabalhar) e há doentes que são transportados diariamente de ambulância para Lisboa, Porto e Coimbra, fazendo centenas de quilómetros para chegar a um médico. Hoje, nas estatísticas, figuramos, entre os países desenvolvidos, com um médico por cada 500 doentes. Mas é só no papel. A incapacidade do Governo e tal que, por exemplo, hospitais como o de Castelo Branco,