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que fez, designadamente, quanto ao Código Penal. Não percebi se ela se inseria numa crítica que esteve na moda em 1983. Penso que o Código Penal, com alguns defeitos mas também com algumas virtudes, foi um passo decisivo no sentido da modernização da legislação portuguesa. No entanto, foi objecto de críticas disparatadas e foi tratado como se tivesse entregue Portugal aos criminosos.
Penso que o Partido Comunista também tem algumas responsabilidades nas dificuldades que se criam na administração da justiça em Portugal. E não estou a fazer um ataque, Sr. Deputado, estou a falar a sério.
Concretamente, um dos problemas que hoje é evidente para todos nós é o da necessidade de reformas sensíveis no que toca à instrução criminal. A experiência dos juízes de instrução está, do ponto de vista da eficácia, irreversivelmente condenada e não são justificativas as suas credenciais numa perspectiva de justiça.
Ora, penso que o Partido Comunista deve também lamentar o seu próprio comportamento, pois não foi possível, nem na altura da elaboração da Constituição nem aquando do processo da sua revisão, contar com a boa vontade do Partido Comunista para se tornar as soluções constitucionais mais flexíveis e mais flexibilizantes da própria legislação ordinária. Penso que também aqui o Partido Comunista tem algumas culpas e não pode culpar só o status quo.
Muitas outras coisas havia para dizer mas a falta de tempo - a luz de sinalização já está vermelha - não mo permite. No entanto, e de uma maneira geral, gostaria de dar-lhe o meu aplauso pela sua intervenção, pela seriedade e pelo grau de preparação.
Permita-me ainda, agora num outro tom, que me congratule com a preocupação que o Partido Comunista tem em relação aos direitos fundamentais e às garantias dos cidadãos quanto aos processos, o que, de certa maneira, é consolador relativamente àquilo que aconteceu nalgum passado, também recente, em Portugal. Folgo também pelas experiências de Direito Comparado a que o Sr. Deputado lançou mão, pois todas elas se inserem, apesar de tudo, nesta coisa horrível que é o sistema capitalista. Apesar de tudo, o sistema capitalista ainda conserva virtualidades para propiciar formas de acesso ao Direito! ... Não vi na sua intervenção nenhum exemplo de países com outro tipo de experiência, mas estou certo de que também os haverá, e seria interessante tomar contacto com eles.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Costa.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, ouvi grande parte da sua intervenção, a qual me suscitou apenas duas perguntas.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado relacionou a iniciativa legislativa do Partido Comunista com o estado caótico, com o atraso e com a morosidade dos processos que se acumulam nos tribunais. Se bem entendi - e aqui está a razão e o sentido da minha pergunta -, o Sr. Deputado pretendeu dizer que com este projecto de lei a situação poderá melhorar muito. Pelo menos foi assim que entendi a sua intervenção.
Permita-me que discorde desse ponto de vista e gostaria que me esclarecesse em que razões objectivas é que este projecto de lei vai contribuir para a celeridade dos processos, o que todos desejamos.

I SÉRIE - NÚMERO 49

A segunda pergunta - e isto é uma questão de princípio, pois estamos na fase de apresentação do diploma e, portanto, não vamos cuidar da especialidade - é esta: está o Sr. Deputado convencido de que a forma de garantir o acesso ao direito ou que a melhor forma de garantir os direitos individuais dos cidadãos é tornar a justiça gratuita, ou é transformar os advogados, os profissionais do foro, em funcionários com vencimentos e com horários?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria, desde já, de agradecer as perguntas formuladas, que são um muito estimulante quadro de interrogações, que merecem resposta e ponderação quando se procura reflectir sobre a problemática, que é complexa e intrincada, da garantia do acesso ao Direito, num País que defronta as consequências da não adopção atempada de reformas em pontos fulcrais do sistema judicial e do sistema jurídico e que defronta as consequências de uma situação de dificuldades financeiras, que se projectam, como ainda há dias vimos durante o debate orçamental, no próprio financiamento do funcionamento da máquina judicial, que se ressente (e fortemente) da limitação dos recursos.
Efectivamente, durante o debate sobre o Orçamento do Estado pudemos ver até que ponto é que a limitação dos recursos contida no Orçamento aqui aprovado este ano irá implicar a impossibilidade de implementação de acções decisivas em relação a alguns dos pontos de estrangulamento do sistema. Porém, não se impedem todas nem se inviabilizam certas acções que, em determinados casos, nem têm custos financeiros significativos mas supõem uma sólida e esclarecida vontade política, a qual tem faltado por razões que todos os Srs. Deputados conhecem.
As perguntas formuladas - e se me permitem vou responder-lhes por uma ordem, pura e simplesmente, arbitrária - permitem situar os principais nós de problemas que o legislador tem de enfrentar.
A primeira questão suscitada - que veio da parte do Sr. Deputado Correia Afonso - parece-me digna de todo o debate e diria até do mais sério debate. 15to porque o tracejo que fez das soluções adoptadas neste, naquele e naqueloutro momento histórico para dar resposta à questão do acesso ao Direito por parte daqueles que não o podem pagar - porque quanto aos que o podem pagar o acesso está sempre garantido e, porventura, aos mais altos níveis de qualidade -, esse bosquejo histórico que facultou à Assembleia da República é útil por várias razões e desde logo porque permite mostrar como é caduca, como é ultrapassada, como é inaceitável uma concepção caritativista que faça assentar no esforço gratuito, não remunerado, casual - embora esforçado e digno de aplauso nos casos em que existe - dos advogados, como classe sócio-profissional, a resolução do problema que, sendo social, deve ter uma resposta organizada e também social.
É, portanto, particularmente útil que seja sublinhado o carácter caduco e ultrapassado desse esquema. Há, segundo creio - e também aqui se torna patente-, algum consenso sobre o carácter ultrapassado do esquema que está em vigor em Portugal, na sequência do retoque e da maquilhagem adoptada pela Lei n.º 7/70, nos alvores do «marcelismo», como sublinhei e como é um facto indiscutível.