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2198 I SÉRIE - NÚMERO 53

gura regimental do contraprotesto, já que é a única que me é possível utilizar, em resposta ao protesto do Sr. Deputado José Manuel Mendes direi o seguinte: o Sr. Deputado reportou-se a uma tipologia retirada do Código Penal, quando o certo é que eu tinha tido o cuidado de explicitar que o âmbito da utilização virtual da solicitada autorização seria o do direito penal secundário.
Ora, e passando exactamente por aqui ao objecto do protesto do Sr. Deputado Magalhães Mota, acrescentarei ainda que esse direito penal secundário seria fundamentalmente o direito fiscal. Isto, dentro de uma visão ampla do direito penal económico, em que ninguém de bom aviso poderá - sem desprimor para quem, eventualmente, tenha uma opinião em contrário - pensar que a eficácia dissuasora se conseguirá com a aplicação do direito de mera ordenação social. Penso que, realmente, se terá de fazer apelo ao ilícito criminal e ao ilícito contravencional. Não será de esquecer os escassos apetrechos de criminologia de que dispomos.
É tudo, e suponho que enfrentei suficientemente aquilo que os Srs. Deputados acabam, no essencial, de objectar à minha intervenção.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É conhecida a nossa posição quanto à inconstitucionalidade desta proposta de lei.
A autorização legislativa não tem sentido.
Nenhum deputado foi capaz de enfrentar o desafio colocado e dizer que sabe o que está a autorizar.
O próprio Governo a vem pedir para a usar em qualquer momento futuro, imprevisto ou incerto, isto é, no fundo, sem saber para quê! Acreditamos que, como afirma, a vá usar ponderada e comedidamente, um «comedidamente» que confirma que a autorização legislativa solicitada não tem também extensão.
Acontece, porém, que a Assembleia da República entende não dever exercer qualquer controle de constitucionalidade sobre as autorizações legislativas que concede, considerando que o sistema oferece válvulas de segurança suficientes.
Não é, obviamente, assim.
Quando o artigo 168.º da Constituição da República enumera a possibilidade de autorizações legislativas não está a conferir ao Governo poderes legislativos que à Assembleia pertencem, ao contrário do que parece pressupor a solicitude deferente de alguns.
É porque não existe delegação de competências do Parlamento para o Governo, mas alguma coisa que a Assembleia permite que o Governo faça, que a Assembleia não pode demitir-se de fixar o objecto, isto é, indicar a matéria da sua competência, em que autoriza o Governo a legislar, fixando-lhe pelo sentido os princípios base, as directivas e critérios por que haverá que orientar-se tal produção legislativa.
Por assim ser, fosse embora muito grande a confiança no Governo, porque não é disso que se trata, sempre será constitucionalmente impossível conferir a qualquer governo autênticos «cheques em branco» como este.
A discussão da substância da proposta de lei, isto é, do próprio conteúdo da proposta que na última semana iniciámos só veio sublinhar isto mesmo.
Através de pedidos de esclarecimento formulados, tentámos, aliás, que o Governo explicitasse, quer o pedido de autorização para criar novas contravenções, quer o enquadramento da proposta na política criminal que o Governo pretende prosseguir.
Consideramos importantes ambas as questões.
Não ficou claro se o Governo põe ou não em causa - e não são as palavras que contam - o passo em frente que significou a autonomia do ilícito de mera ordenação.
Para Figueiredo Dias - e já, no outro dia, tive ocasião de o citar - uma condição essencial é a de que «o legislador futuro não deverá criar nem mais uma contravenção».
Pois aqui temos um pedido de autorização legislativa, para criar um qualquer número delas, ainda que comedidamente ...
A segunda questão é, todavia, a questão fulcral que este debate indica. Há, ou não, uma política criminal do Governo?
A política subjacente ao novo Código Penal deverá, a tal propósito, ser recordada.
Na verdade, o princípio da legalidade, ou da tipicidade, que a Constituição da República garante - artigo 29.º - é, consagrado no Código Penal que, numa inovação da maior importância, dispõe no seu artigo 31.º que «um facto não é criminalmente punível quando a sua ilicitude for excluída pela ordem jurídica considerada na sua totalidade».
Ao fixar como limite da ilicitude criminal objectiva a ponderação da ordem jurídica no seu conjunto, existe uma política criminal em que procura garantir-se a unidade total do direito.
É esta mesma concepção global, que a autorização legislativa solicitada, abrindo caminho a um casuísmo indiscriminado, põe em causa.
Poderá inclusivamente temer-se - e os termos da autorização não afastam esse risco - que, ao arrepio das próprias consequências de um pluralismo assumido, o Governo venha a arrogar-se o direito de vir a criminalizar, quando e se lhe convier, quaisquer condutas.
É que, de facto, como noutro debate referimos, a legitimidade de criminalização, no contexto de uma sociedade pluralista, aberta, para que o campo do direito penal se não transforme «numa arma de ideologia e projectos de poder conflituantes» e o próprio direito penal se não degrade «num instrumento nas mãos do grupo ou estrato social em cada momento dominante» obriga a que só possa criminalizar-se «o que de forma inequívoca mereça o predicado de socialmente danoso» cito Maller-Dietz, aliás, expressamente citado por Costa Andrade nas Jornadas de Direito Criminal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que este debate justifica que se vá mais além do que a mera repetição de argumentos, já noutra ocasião expendidos e que, por assim ser, puderam com maior concisão, enumerar-se.
Na realidade, pensamos que - muito provavelmente sem que o Governo disso tenha consciência, porquanto em sucessivos debates nunca o disse - a proposta de lei deverá suscitar, e é a Assembleia da República o lugar próprio para tal debate, a problemática do chamado «direito penal secundário», há pouco aqui invocada pelo Sr. Ministro da Justiça.
De facto, como escrevem Figueiredo Dias e Costa Andrade no recente Criminologia - O Homem Delinquente e a Sociedade Criminógena:
Forçados a verter direito sobre domínios novos e progressivamente mais extensos, os legisladores