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2688 I SÉRIE - NÚMERO 66

De resto, tanto este Decreto-Lei n.° 637/76, como a Lei n.° 14/79, de 16 de Maio, asseguravam já a protecção de monumentos nacionais, edifícios religiosos e outros, proibindo que neles fossem afixados cartazes ou feitas inscrições.
O objectivo deste projecto de lei é, na realidade, asfixiar o direito de expressão do pensamento. O que implica não só a violação do artigo 37.° da Constituição, mas de todas as numerosas disposições constitucionais que definem o próprio quadro do regime democrático, desde o artigo 18.°, que estabelece a força jurídica dos preceitos respeitantes às liberdades, até ao artigo 10.°, que comina o estatuto essencial dos partidos políticos, e aos artigos 51.° e 56. °, que garantem a liberdade sindical.
Contudo, a maioria dos Srs. Deputados presentes na Comissão de Assuntos Constitucionais, optando mais pelo silêncio como resposta às razões e fundamentos expendidos pelos recorrentes, acabaria por votar o parecer que hoje está em apreço, sustentando, contra a própria evidência, que o projecto de lei, com a assinatura singular do Sr. Deputado António Capucho, não infringiria a Constituição.
O projecto de lei n.° 460/III vem tornar dependente de prévio licenciamento pelas câmaras municipais a afixação da propaganda em lugares públicos e restringir a realização de inscrições ou pinturas murais aos espaços escolhidos pelas câmaras.
Tal licenciamento prévio será emitido no prazo de 15 dias e deveria ser precedido de parecer favorável das mais variadas entidades, desde a Junta Autónoma das Estradas até à Direcção-Geral de Turismo.
Ora, se a Constituição garante, no artigo 37.°, que todos têm o direito de exprimir livremente o seu pensamento e que o exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer forma de censura, salta à vista que o projecto do Sr. Deputado Capucho representa a mais clara violação destas disposições constitucionais.
De resto, isto mesmo entendeu já o Tribunal Constitucional no seu Acórdão de 10 de Julho de 1984. Com efeito, neste recente acórdão, e com o voto unânime de todos os seus membros, o Tribunal Constitucional considerou ferida não só de inconstitucionalidade formal, mas também de inconstitucionalidade material, a postura da Câmara Municipal de Vila do Conde, que veio tornar dependente de autorização camarária a propaganda político-partidária.
Salienta-se, no referido acórdão, que «a exigência de uma autorização prévia retira logo à restrição todo o carácter da generalidade». E acrescenta-se: «A autorização camarária aqui questionada, porque prévia e com os efeitos apontados, viola também o artigo 37.°, n.° 2», que preceitua que «o exercício (da liberdade de informação) não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura»... «Pois é, de facto, ao conceito de censura prévia que, ao cabo e ao resto, se reconduz um sistema que condiciona, em certos casos, a propaganda político-partidária à obtenção prévia de uma autorização camarária».
Torna-se, assim, evidente que o parecer em questão só podia ser elaborado não só com total desprezo da Constituição, mas ainda com total alheamento e indiferença pelo referido acórdão do Tribunal Constitucional.
De todas as conquistas do 25 de Abril, a conquista das liberdades é, sem dúvida, a mais importante. E é uma dessas liberdades, a liberdade de expressão do pensamento, que está em causa.
Não podemos voltar atrás. Não podemos voltar ao tempo da vergonha de se ser preso por afixar um papel e ter se de pagar a multa (agora chamada coima) de 10 contos a 500 contos por se ter escrito numa parede «viva a liberdade» ou «abaixo o Governo».
É por isso que o MDP/CDE tudo fará para que não se volte para trás.
E é por isso que o presente recurso deve ser provido, rejeitando-se a admissão deste projecto de lei do PSD.
É uma questão grave que está em causa, é a democracia que está em causa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.° 460/III é sintoma de um profundo e desesperado isolamento político, ideológico e cultural; ergue-se ao arrepio do País, libertado do fascismo, insere-se nos sinistros planos de policialização da nossa democracia, é expressão dos extremos a que estão dispostos os que querem golpear a Constituição em todos os azimutes: do regime económico aos direitos dos trabalhadores, à genuinidade dos actos eleitorais.
O articulado subscrito pelo deputado António Capucho proíbe, fora dos locais administrativamente estabelecidos, a colagem de cartazes, a efectuação de pinturas murais ou pichagens, sujeitando-as a licenciamento pelo presidente da câmara municipal, mediante pareceres de várias entidades, emitidos num lauto prazo. Determina baias indébitas à passagem da licença, que é inaceitável, facultando às edilidades e aos proprietários ou usufrutuários dos locais afectados vastos poderes de inutilização ou desfiguração da propaganda, bem como, pelo que às câmaras concerne, de embargo ou demolição de obras. Permite que estas promovam ainda a retirada de publicidade actualmente existente, mercê de uma norma retroactivizadora. Consagra uma moldura penal que, sobre revelar-se desproporcionada e brutal, denuncia um claro conteúdo de classe e permite entrever a direcção da arma que se visa colocar na disponibilidade de dóceis agentes locais de uma estratégia antidemocrática.
Ora, antes de tudo, impõe-se perguntar: é isto compatível com a Constituição e, portanto, viável?
É óbvio que não.
Os partidos políticos e os sindicatos são independentes do Estado, não podendo o exercício dos seus direitos, no âmbito do título II da parte I da Constituição, depender de actos discricionários da administração. Por outro lado, cabe-lhes concorrer para a formação da vontade política do Estado, pelo que sobre eles recai uma protecção especial e intensa, inconsumível por constrições fora do apertado regime do artigo 18.° A iniciativa do PSD, que conta com a cumplicidade do PS, contende, em toda a linha, com este preceito. Desde logo admitindo um sistema de censura prévia através dos mecanismos e da lógica da opção pela licença. Mas também porque, longe de montar um elenco de comandos regulamentadores, diminui a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos artigos