O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2898 I SÉRIE-NÚMERO 71

intervenha por várias formas junto das autarquias, através do Governo, normalmente chegando mesmo ao ponto de exercer poderes de ingerência sobre os seus órgãos e podendo substituir-se-lhes na prática de determinados actos. Este era, por exemplo, o sistema adoptado no Código Administrativo Português de 1936-1940.
Nos regimes democráticos que consagram os princípios da descentralização e da autonomia do poder local, tal não sucede por via de regra. Aqui, o fundamento da tutela sobre as autarquias, relativamente aos actos que os seus órgãos praticam no exercício de competências próprias é, como sempre, o da submissão das mesmas ao império do direito, e a sua finalidade é tão-só a de averiguar se os seus órgãos e serviço cumprem efectivamente as leis. São normalmente afastados juízos de oportunidade e de conveniência, relativamente ao exercício dessas competências, que brigariam frontalmente com o princípio da autonomia do poder local.
O conceito de autonomia do poder local não é um conceito uniforme, padronizado na sua extensão e nos seus limites, na generalidade dos sistemas constitucionais democráticos. Ele comporta uma variabilidade acentuada de país para país, podendo no entanto ser traçada uma meridiana englobante dos seus caracteres comuns.
Em termos muito genéricos, é pacificamente aceite que a autonomia se concretiza, sempre, por qualquer forma de descentralização. Mas a simples descentralização, por si só, não é via suficiente para conduzir às liberdades locais. Estas não se atingem pela singela existência de poderes locais, mas sim pela existência de poderes locais autónomos quer dizer, responsáveis perante os cidadãos locais e não perante o Estado.
A descentralização será apenas administrativa, se as competências do orgão autárquico se reduzirem à prática de actos administrativos só impugnáveis por via de recurso contencioso: ou meramente financeira, se se reduzir à possibilidade de arrecadar certos rendimentos e dispor deles como receita própria. A atribuição de ambas a uma pessoa colectiva de direito público configurará um elevado grau de liberdade de agir. E embora tal liberdade de agir possa ser susceptível de limitação, em maior ou menor extensão, através da sujeição à tutela administrativa, não restam dúvidas de poder concluir-se pela verificação - genérica - da seguinte regra: quanto maior o grau de autonomia, menor será o âmbito sobre que se exerce a tutela; quanto menor o grau de autonomia, e consequentemente a zona de poderes próprios de que goza uma pessoa colectiva de direito público, maior será o âmbito sobre o qual a tutela poder ser exercida.
A autonomia local mede-se exclusivamente pela amplitude dos poderes outorgados às autoridades descentralizadas e, correlativamente, pela importância dos meios jurídicos, humanos e financeiros colocados à sua disposição.
A repartição entre o Estado e as colectividades locais das competências e dos recursos fiscais dá-nos a medida da realidade da autonomia local.
Fazendo uma pequena análise sobre a situação nalguns países membros do Conselho da Europa, podemos concluir o seguinte:

1.º Num estado federado como a Áustria e no qual os poderes locais gozam de uma razoável autonomia, a Constituição Federal garante-lhes, para além de uma esfera de competências no quadro da qual gerem determinados interesses do Land ou da federação, uma esfera de competências próprias, que eles administram, sob a sua exclusiva responsabilidade, na obediência às leis e regulamentos federais e do Land a que pertencem. Não estão submetidos a nenhuma directiva ou intervenção de órgãos administrativos exteriores, no tocante ao exercício de competências próprias. Estão sujeitos apenas a controle, que se exerce da seguinte forma:

As previsões e o equilíbrio orçamental são fiscalizados pelo organismo de controle do Land e pelo Tribunal de Contas.

A finalidade de tal controle é verificar se a política financeira das autarquias é eficaz, económica, ordenada, e se obedece às leis e regulamentos que lhe respeitam;

O controle da legalidade é exercido pelo Tribunal Administrativo. Não encontramos, pois, aqui, vestígios de qualquer intervenção do Governo na fiscalização e controle do cumprimento da legalidade.

2.ª Num país como a Dinamarca, por exemplo, com os órgãos do poder local eleitos por sufrágio universal, e com um grau de autonomia administrativa e financeira mais reduzida, a tutela exerce-se a três níveis:

Controle económico: as colectividades locais devem estabelecer planos financeiros respeitantes a cada triénio, e a aprovação dos empréstimos previstos dependem da concordância dessas previsões com o plano financeiro nacional;
Controle da legalidade: o Ministro do Interior tem poderes de anulação de decisões ilegais emanadas dos órgãos de poder local e dispõe de determinados poderes tendentes a obrigá-los a respeitar a lei. Isto, claro, independentemente da competência genérica dos tribunais de direito comum para dirimirem os litígios relativos à legalidade dos actos dos órgãos do poder local;
Controle de oportunidade: o controle sobre a oportunidade de actos específicos de administração dos órgãos autárquicos pertence a diversos ministérios.

Vejamos o caso italiano, país onde o esquema de articulação dos poderes locais é bastante semelhante ao português. Podemos verificar que as autarquias locais exercem, essencialmente, competências próprias. Porém, exercem também funções administrativas de interesse geral, por delegação legislativa, como órgãos descentralizados do Estado, embora em casos limitados.
Aqui poderíamos chegar à conclusão seguinte: o controle da legalidade sobre os actos das autarquias é exercido por um órgão da região - entidade autónoma e territorial, dotada de poderes legislativo e administrativo - constituído nos termos da lei.