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17 DE MAIO DE 1985

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O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, desejo proferir uma intervenção, já que essa é a única figura regimental a que posso recorrer. O Sr. Presidente conceder-me-á a palavra no momento oportuno.

O Sr. Presidente: - Para intervenções estão inscritos os Srs. Deputados João Abrantes, Lopes Cardoso e Rogério de Brito.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Continuamos a debater um projecto de lei, apresentado pelo PCP a esta Câmara em 13 de Março deste ano, de capital importância para a agricultura nacional.
Até agora a argumentação aduzida pelos detractores desta iniciativa legislativa não conseguiu negar a oportunidade da sua discussão tal é a evidência da clareza do articulado apresentado, reflectindo todo ele um trabalho apoiado na realidade da situação do sector leiteiro do País. Essa realidade assenta num completo e organizado sistema de recolha da produção de leite, cujo mérito cabe por inteiro às organizações cooperativas da lavoura, e que permite a recolha de 80% da produção, da qual cerca de 90% se destina ao consumo público.
São pois as cooperativas leiteiras as obreiras e responsáveis por toda uma estrutura que responde em concreto às exigências da produção, servindo ao consumidor um produto de boa qualidade sem sobrecarga de custos. Para quem conheça o sector leiteiro não é difící1 reconhecer a funcionalidade do esquema implantado e concluir que só esta forma permite reduzir os custos a que o produto chega ao consumidor, sabendo-se que são as cooperativas que suportam os custos da recolha e concentração nas zonas interiores e de mais difícil acesso com custos altamente diferenciados.
E é por isso mesmo que a abolição do preço de garantia ao primeiro escalão do circuito de leite veio acentuar as assimetrias regionais e prejudicar os produtores das áreas interiores ou mais distantes dos locais de concentração. E os reflexos da cessação dos custos ponderados ao primeiro escalão, que agora foram compensados com o aumento do preço do leite, cairão pesadamente sobre os agricultores logo que se verifiquem aumentos nos factores da produção.
Por outro lado, e como já referimos, 90% do leite recolhido pelas organizações cooperativas da lavoura destina-se ao consumo público, logo tendo um valor acrescentado bastante inferior ao do leite industrializado.
Torna-se pois compreensível a apetência da indústria e dos interesses a ela ligados na tentativa da liberalização da recolha e concentração do leite. Falo de uma forma inviesada, argumentando com a necessidade da adaptação da legislação às normas da CEE. Nada mais falso, como já demonstrámos com exemplos significativos, como é o caso da Inglaterra.
Não há frontalidade em se dizer que o que interessa é a procura desenfreada do lucro, sem a preocupação de satisfazer as necessidades do consumo público.
Por que, não tenhamos dúvida, com a pseudolíberalização da recolha e concentração do leite, que pressupõe a destruição do esquema existente, verificar-se-ão graves rupturas no abastecimento público. Um só exemplo: o concelho do Sabugal (terceiro produtor de leite do País) é uma zona de recolha livre, não organizada, onde mais de 20 indústrias se cruzam na recolha e de onde não sai 1 litro para consumo público.
Há hoje conhecimento de que a indústria programa a invasão das zonas de recolha organizada, a coberto da alteração da legislação existente. E pode afirmar-se que essa escalada, favorecida pela indefinição que o Governo permite que se estabeleça, e que visa atrair os produtores no imediato, terá consequências desastrosas para estes.
Começar-se-á por pagar preços mais elevados (fala-se em mais 5$ por litro nas áreas da Figueira da Foz e Montemor-o-Velho) e manter os pagamentos em dia, mas acabará por acontecer o que hoje sucede nas zonas de recolha livre: paga-se o que se quer, sempre como classe B e com atrasos que chegam a ser de 6 meses.
Vejamos agora como é possível que a indústria pague preços superiores ao estipulado legalmente: o leite para a indústria vai para a fabricação de elementos ricos (queijo, manteiga, iogurtes) a que se misturam outros produtos, designadamente a fécula de batata, o que permite um valor acrescentado muito superior ao do leite para consumo, comercializado pelas cooperativas.
Só para ficarmos com uma ideia do que é este milagre dos pães, refira-se que a fécula de batata que está a ser importada em doses maciças e em contentores da Holanda custa 100$/kg e dá para 10 l de água, ou seja, custa 10$ por litro. Vai daí reduz-se a compra de leite, que custa 41$ por litro, ao mínimo necessário e o que se compra até se pode pagar mais caro porque o negócio dá para isso e ao mesmo tempo desacreditam-se as organizações cooperativas.
Só como exemplo desta redução drástica das compras por parte da indústria à lavoura nacional, referimos que neste momento há excedentes de leite e que só em Trás-os-Montes estão armazenados 100 000 1 de leite.
Mas atenção, senhores produtores de leite, porque os preços acima da tabela são sol de pouca dura!
Analisemos agora os efeitos da anunciada liberalização na economia nacional. A dar-se, será um mau exemplo de gestão a que não nos podemos permitir: existem todas as estruturas montadas com investimentos feitos pelas organizações da lavoura; a tecnologia instalada é suficiente, os transportes, salas e vasilhame servem perfeitamente.
Vão duplicar-se todas as estruturas de recolha, duplicam-se os encargos com a classificação, laboratórios e administração, ao mesmo tempo que se baixa a qualidade do leite (onde existe uma ordenha não se monta outra ao lado, mas sim um posto de recepção).
A menos que se esteja a preparar o roubo puro e simples das estruturas que a lavoura levou anos a montar para as entregar de mão beijada à indústria. 15so, estamos certos, não o permitirão os agricultores. É um recuo de 20 anos no processo de recolha do leite no nosso país.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 443/III, do Grupo Parlamentar do PCP, é claro nos seus objectivos: visa consolidar e aperfeiçoar o esquema de recolha, concentração e abastecimento de