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11 DE JULHO DE 1985

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está interrompida a sessão, que recomeçará às 15 horas e 30 minutos.

Eram 13 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seria extremamente fácil neste momento que qualquer de nós, ao intervir neste debate, dissesse pura e simplesmente, justificando o seu discurso, que sofria os efeitos da crise e o cansaço destas vigílias e que, tal como o País, ia recorrer ao improviso porque está mal preparado para a adesão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não usarei dessa fácil desculpa. E se tenho de pedir a vossa benevolência para quem não teve oportunidade, nem tempo - e aqueles que me conhecem sabem como o lamento -, para passar ao crivo do rigor, que é a nossa própria meditação e a nossa própria reflexão face a um papel branco, aquilo que penso sobre o tema do nosso debate. Não usarei desculpas fáceis e tentarei que, no tempo que me é destinado, com as deficiências que são 2s minhas próprias e com as deficiências que são as do nosso trabalho nas condições em que o fazemos, seja assim mesmo a expressão tão autêntica quanto possível daquilo que penso sobre a adesão europeia.
Gostaria antes de mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de dizer que, tendo tido ocasião de nesta mesma tribuna me pronunciar favoravelmente à adesão na sessão que realizámos no dia 11 de Abril deste ano e de então explicitar as razões pelas quais penso que a adesão é uma boa hipótese e uma boa solução, gostaria, repito, de dizer agora que, estes meses volvidos, não tenho razão para modificar nenhum dos argumentos que então expendi e que continuo, portanto, a pensar que a adesão à Comunidade Europeía é, não apenas a melhor solução em relação às várias hipóteses de um futuro possível para Portugal, como penso também que as razões que nessa altura a justificavam permanecem, como permanecem desde há vários anos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assim sendo, poderei limitar-me naturalmente a alguns aspectos que ultrapassam esse momento do debate - esse momento que foi a deliberação da Assembleia da República de se congratular com o final de um processo negocial e de decidir, portanto, em termos políticos, que a adesão devia ser feita.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Direi hoje e aqui que, em primeiro lugar, gostaria de salientar um aspecto que me parece particularmente relevante em relação ao Tratado cuja ratificação temos de debater.
Direi que todos nós sabemos que a história da extensão das relações humanas se cumpriu em círculos concêntricos e que isso é particularmente sensível na matéria económica em que os homens passaram da economia local para a economia regional, depois para a economia nacional e finalmente para a continental, que
que essa dimensão nova apagasse as outras. Queria salientar precisamente esse aspecto: o Tratado que enfrentamos não é, nem em termos económicos nem em termos políticos, uma escala maior. É realmente uma dimensão nova.
Direi, complementarmente, que nunca os tratados poderão substituir os homens para criar uma nova ordem jurídica. Tal como só se pode fazer uma sociedade com homens porque só neles cabem as reservas de relação humana, de simpatia, de confiança, que podem fundar qualquer relação, também direi que a formação de uma ideia de Direito só é possível pela intervenção directa das consciências dos homens, porquanto, e em definitivo, numa ordem social futura, que se cria representando-a, só o homem e apenas ele é capaz de sofrer ou de beneficiar com ela.
Regressando à ideia clássica, se o homem é a medida de todas as coisas, também em matéria de relacionamento internacional esse relacionamento se processa por e através dos homens, bastante mais do que através dos Estados.
Aquilo que, neste momento, é capaz de ser o desafio das gerações vindouras é a substituição de uma história dos Estados pela história dos homens; uma história em que os homens já não são figurantes, mas são protagonistas e finalidade dessa mesma história. Creio que esse é o sentido profundo de um Tratado que ratificamos e cuja evolução naturalmente desconhecemos, mas que encaramos como parte do desafio que a adesão representa. Somos parte dessa mesma evolução, somos protagonistas dela, a história futura far-se-á connosco e por nós, com a nossa vontade, com a nossa esperança e com a nossa capacidade de sonhar e de querer.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Significa isto que direi muito simplesmente que para nós, Portugueses deste tempo, a adesão europeia não se aponta nem como um sebastianismo nem sequer como uma espécie de progresso tecnológico. Se quiserem uma expressão crua, mas verdadeira, direi que a adesão europeia não é para nós, Portugueses, o mesmo que para outros povos a conquista da Lua.
É alguma coisa substancialmente diferente: é interrogar-mo-nos sobre quem somos neste momento histórico particular e dizermos que, em termos da nossa presença na Europa do tempo que é o nosso, já não podemos responder dizendo, pura e simplesmente, que tivemos um Damião de Góis, que tivemos a Feitoria da Flandres ou que fomos mais humanistas do que qualquer outro humanista do Renascimento, mas, pelo contrário, dizer que já não somos - ao contrário da crítica de Fernando Pessoa- parte daquelas gerações cansadas depois de terem descoberto o caminho marítimo para a índia; dizermos que já não temos possivelmente o entusiasmo que triunfa dos obstáculos e conduz às vitórias, mas que temos a certeza plena de que, apesar de depositários de uma herança, temos consciência da nossa dimensão, da dimensão que é a da nossa voz e a certeza, se quiserem, desencantada de que para o mundo talvez contemos pouco hoje em dia - pelo contrário seremos nós a precisar do mundo; mas dizermos que temos a certeza plena- e queremos afirmá-la - de que a Europa precisa de nós e de que o mundo precisa da Europa.