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31 DE OUTUBRO DE 1986 127

A Assembleia da República não pode, face a afirmações daquele jaez, que constituem crime, dizer que aquilo não tem credibilidade, que são umas atoarda-zecas, que a criatura não tem a mínima expressão, que reuniões há muitas e que quanto a infiltrações logo se verá, porque isso é uma gravíssima atitude de subesti-mação que pode conduzir à paralisação dos órgãos de soberania para a resposta necessária face a realidades e movimentações de cunho separatista. Não se pode fechar os olhos a isso e não julgue que nesta bancada alguém tem ilusões sobre a natureza soldada, íntima e sem expressão popular da organizaçãozita que dá pelo nome de FLA. Não há nenhuma dúvida sobre isto, mas ela é uma organização que acaba de se afirmar, mais uma vez, como uma organização armada.
Sr. Deputado, creio que a Assembleia da República não pode ficar de braços cruzados nem encolher os ombros ou subestimar isto.
Se, ainda por cima, V. Ex.ª afirma que se trata de uma organização infiltrada nas Forças Armadas, está a colocar uma outra questão tão grave ou mais grave ainda.
Por isso, Sr. Deputado Vargas Bulcão, creio que se a sua bancada quer genuinamente contribuir para esta descodificação, isso é excelente. Em todo o caso, não suprirá a gravidade do escandaloso silêncio do presidente do Governo Regional dos Açores em relação a afirmações deste jaez.
Por isso digo que este debate não é um fim, mas, sim, um princípio de uma clarificação. Talvez se tenha feito até metade dessa clarificação, mas falta fazer o resto, o que é fundamental para que o próprio processo autonómico prossiga sem suspeições e sem misturas e miscigenações espúrias e, aliás, inconstitucionais.
Em torno disto deve haver um consenso nacional. Resta saber se o PSD está disposto a entrar nesse consenso ou se prefere enveredar pela outra via.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ano de 1986 foi internacionalmente consagrado à paz.
Infelizmente, a insegurança e os conflitos aumentaram, as tensões subiram e o radicalismo parece querer expulsar o diálogo das relações entre os homens, única forma de superar divisões e alcançar progresso e bem-estar.
Temos afirmado e repetimo-lo que Portugal pode e deve, com a experiência que tem de estar no mundo, contribuir para que o bom relacionamento entre os povos e a paz sejam uma realidade.
Nem sempre, porém, o tem sabido fazer, demonstrando estar agarrado a lógicas conjunturais, alienatórias dos princípios e valores que diz defender e preconizar, renegando assim a sua vocação e tradição, como que pretendendo alterar a sua historia e esquecer o seu passado naquilo que contém de mais perene e dignificante.
Não raras são as afirmações dos nossos dirigentes políticos sobre a defesa constante e permanente da democracia e da livre escolha por cada povo do seu governo.
Não raras são as promessas de fé, no sentido de denunciar a injustiça e a arbitrariedade de muitos governantes que, por esse mundo fora, se parecem esquecer que o acto de governar tem de ser para o povo e pelo povo, nunca à margem dele ou contra ele.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Pena é que tais manifestações de intenção não sejam livres e sinceras, já que denunciadoras de compromissos ideológicos e partidários anteriormente assumidos, que tantas vezes deturpam a verdade e outras tantas escamoteiam a frontalidade.
Mas porque não queremos ser iguais aos que criticamos, tão-pouco próximos dos que denunciamos, e porque a isso estamos obrigados perante o povo de Portugal, vimos hoje a esta Câmara para alertar os Portugueses e os seus representantes para uma situação que, longe de nos honrar, apenas mancha o nosso nome e em nada dignifica os nossos actos.
Referimo-nos concretamente a Angola e ao seu povo, às suas aspirações e desejos, iguais às de tantos outros povos que não querem ver os seus filhos mortos em guerras injustas e fraticidas e que clamam por paz e por melhor futuro.
Vive-se hoje em Angola, Estado de expressão portuguesa, um clima de confronto e de insegurança, de fome e de caos social, fazendo que a incerteza e a desilusão estejam estampadas nos rostos dos seus filhos, transparecendo a dor e a mágoa num povo que quer ser livre e deseja a felicidade e a paz.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Como podemos nós, Estado livre e democrático, lavar as nossas mãos como Pôncio Pilatos, e nada fazer para que esta situação se altere? Com que legitimidade clamamos nós pela democracia e pela liberdade do nosso país e de tantos outros, quando nos mantemos mudos e quedos face a um povo que fala a nossa língua e que tantas e tantas vezes nos tem dado provas de amizade e solidariedade?
Mal andaremos se não soubermos assumir com coragem e realismo, com verdade e confiança, as nossas responsabilidades históricas, porque também as temos, naquilo que hoje se verifica e passa no solo angolano.
Virá a propósito relembrar, aqui e agora, Acordo de Alvor assinado a 15 de Janeiro de 1975 entre o Estado Português e os representantes do povo angolano, a saber; MPLA, FNLA e UNITA. Tal Acordo, que tinha em mente a concessão da independência e da soberania a 11 de Novembro do mesmo ano, apontava claramente para a eleição de uma assembleia nacional constituinte até 31 de Outubro do ano já mencionado.
Nunca se vieram a verificar ou concretizar tais eleições, tendo o Estado Português, unilateralmente, a 22 de Agosto de 1975, suspendido o referido Acordo, com a justificação de que desde a sua celebração havia sido objecto de frequentes violações por parte dos movimentos de libertação.
Não importará, agora e aqui, comentar tal atitude, já que ultrapassada e justificada por muitos pelo momento de perturbação política que então vivíamos.
O que nos interessa e preocupa é que Angola, onze anos após a sua independência, continua mergulhada na guerra e no ódio, como que à beira de um precipício sem fundo e sem fim.