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14 DE NOVEMBRO DE 1986 263

O Sr. José Gama (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está na Região Autónoma da Madeira o Sr. Pieter Botha, presidente da África do Sul. As reacções da esquerda portuguesa quiseram tornar esta visita particularmente notada. A esquerda, em suma, não gostou.
Não se extinguindo a história por decreto e, muito menos, por simples declarações parlamentares, ternos boas razões para afirmar que está no funchal o presidente de um país amigo. Não consta da memória deste povo que alguma vez tenha mandado expropriar as casas ou bens de portugueses nem, tão-pouco, que alguma vez tenha arremedado da nossa história. Enquanto em países vizinhos se apeavam estátuas, só porque elas perpetuavam feitos de portugueses, no país do Presidente Pieter Botha erguiam-se estátuas novas, que, ao lado de padrões antigos, aí estão para continuar o nome de Portugal. Diogo Cão lá está na cidade do Cabo para dizer aos homens, novos e velhos, como foi a historia trágico-marítima deste povo que demandou as índias. Não me consta que noutros Estados africanos, curtidos os arroubos revolucionários, se tenha feito regressar Mouzinho de Albuquerque ao seu pedestal inicial ou feito as pazes com as estátuas estilhaçadas de portugueses de antanho.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Quando milhares de portugueses de famílias divididas e sem haveres fugiram de Angola e Moçambique, o país do Presidente Pieter Botha abriu-lhes as portas do trabalho e do sossego.
Quando estourava pelas costuras o mundo do emprego em Portugal, o país do Sr. Presidente Botha refazia o sonho de muitas famílias sem responsabilidade alguma nas guerras ou nos empregos que dão sustento e futuro.
Quando nos chegam notícias - que, infelizmente, já circulam sem espanto e com rotina - e nos falam de portugueses cativos, têm sido as fronteiras do país do Presidente Pieter Botha o ponto de encontro da libertação.
Quando as raízes da ira persistem em encontrar uma solução armada para os conflitos da África austral, os presidentes Pieter Botha e Samora Machel juraram calar canhões brindando à saúde da paz e da boa vizinhança.
Não estranhamos, por isso, que o Dr. Jaime Gama, então Ministro dos Negócios Estrangeiros do bloco central, e com a prudência que toda a gente lhe reconhece, tenha feito de Pick Botha seu convidado oficial. Consagrou-se também e assim a importância de uma comunidade de centenas de milhares de portugueses que, felizmente, os desatinos da história não obrigaram a regressar a Portugal, onde já somos tantos para terra tão nobre, mas tão pequena.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Em nome de um realismo político desapaixonado, não podemos deixar de considerar inoportunas as reacções da esquerda portuguesa. Há outras alturas mais apropriadas para falar do apartheid. E nós, neste domínio, como noutros, estamos de bem com a nossa consciência. Jamais e em tempo algum o CDS o consentiu ou aplaudiu. Só que sabemos distinguir o tempo e o modo sem jamais pormos em causa a nossa coerência.
Fique a esquerda sossegada que, quando visitar Portugal o presidente de um qualquer regime totalitário, não seremos determinados por agastes ou amuos partidários; antes, saberemos considerar o superior interesse nacional. Ai de nós se fizéssemos coincidir uma sessão parlamentar com a visita, em viagem de turismo ou por amizade confessada, de um ditador qualquer para aqui reinvidicarmos, por exemplo, a liberdade para os judeus que desejam emigrar ou tão-só o cumprimento dos direitos do homem.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Logo viriam vozes sábias e prudentes, com a colectânea da jurisprudência das cautelas diplomáticas bem erguida a fazer a apologia da palavra calculada, em reverente convite a um silêncio cauteloso.
Porque somos pela hospitalidade e o diálogo, por sabermos ir ao encontro do desejo de centenas de milhares de emigrantes e suas famílias, na linha das tradições portuguesas, exemplares da arte de bem receber, e por não perfilharmos o alarmismo da esquerda portuguesa que este voto documenta, votámos contra, sem com isto termos deixado de estranhar que o Governo central tenha dito «não» e que o Governo Regional da Madeira tenha dito «sim» ao Sr. Presidente da África do Sul.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Crespo.

O Sr. Vítor Crespo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD não pôde dar o seu apoio ao voto de protesto apresentado pelo PCP, MDP/CDE, PS e PRD.
A visita das autoridades sul-africanas é de natureza estritamente particular, como é amplamente reconhecido. Nela não houve até à data, e não vai haver até ao seu termo, um só aspecto que lhe possa conferir qualquer carácter de oficialidade.
A natureza da visita não permite que seja tratada sobre uma qualquer perspectiva oficial.
O PSD condena o apartheid.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É um regime detestável, viola quotidianamente os princípios da democracia e dos direitos humanos.
Têmo-lo dito e quero-o repetir mais uma vez.
Mas devemos ter o discernimento para saber pensar e agir com serenidade, ver os factos tal como são, não distorcidos pelo prisma de qualquer paixão partidária.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portugal é, felizmente, depois da Revolução de Abril, um país aberto e livre como gostaríamos que fossem todos os outros, entre eles a República da África do Sul. E nisto nos continuaremos a empenhar.
Mas não entendemos fechar as nossas portas a visitas turísticas por critérios que não sejam os legítimos e próprios de uma democracia plena e no respeito pelas regras aceites da convivência nacional e internacional.