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264 I SÉRIE - NÚMERO 10

Recordo aos Srs. Deputados que temos relações diplomáticas com a República da África do Sul e nada poderia justificar não permitir uma visita turística ao seu presidente ou outro qualquer membro do Governo. Seria um acto necessariamente contraditório com a situação diplomática existente e por isso mesmo carregado de absurdo.
Visto que foi concedido, como é de regra, e por isso também não poderia deixar de ter havido informação e acordo prévio entre SS. Ex.ª o Presidente da República e o Primeiro-Ministro.
Se enveredássemos por outros caminhos, o de recusar um visto turístico para uma visita de repouso, estaríamos a entrar por vias tortuosas. Não é difícil, seja a quem for, produzir listas de responsáveis pela violação de direitos humanos. Com a aprovação deste voto e em coerência com ele quantas portas não teríamos de fechar nas nossas fronteiras? Não estaria incluído, por exemplo, um general Pinochet...

Aplausos do PSD.

... que cerceia e oprime as aspirações democráticas do povo chileno, um general Jarusselski, que persegue um sindicalismo livre e empurra para a clandestinidade o Solidariedade...

Aplausos do PSD.

... ou um Presidente Gorbachov, que com as suas divisões ocupa o Afeganistão e impede que este povo procure os seus próprios caminhos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E não devemos também esquecer que há uma grande dose de hipocrisia neste voto. Já teremos esquecido que em Novembro de 1983 visitou Portugal, a convite do Sr. Ministro Jaime Gama, o Ministro dos Negócios Estrangeiros da África do Sul? E que a 29, 30 e 31 de Maio de 1984 nos visitou o Presidente da República da África do Sul, Sr. Pieter Botha, a convite do então Primeiro-Ministro, Dr. Mário Soares?

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E que nessa visita o Sr. Pieter Botha se avistou com o Sr. Presidente da República e com o Sr. Primeiro Ministro? E que se saiba não houve então nenhum voto de protesto.
É também preciso que não esqueçamos um outro aspecto importante.
O voto que aqui a Assembleia aprovou é de mau aviso, falho de sabedoria. Classificações que faço sem entrar pelas necessidades da real-politik.
A Assembleia da República - órgão de soberania -, ao tomar conhecimento e discutir uma visita particular, está ela mesmo a emprestar um carácter diferente à visita e, de certo modo, a dar-lhe um cariz oficial.

Vozes do PSP: - Muito bem!

O Orador: - De acordo com regras geralmente aceites pela comunidade internacional, não é uma visita particular que põe «em causa a política externa portuguesa».
Mas outro tanto não diremos com a aprovação do voto. A cada um as suas responsabilidades. A Oposição, que mais uma vez se dá as mãos num coro comum, que assuma as que lhe vão de feição.
Também por isso o PSD votou contra.
E dessa maneira a minha bancada está a pôr os interesses do Estado acima da procura de um papel declamatório que, em nosso entender, tem sido por vezes usado e abusado nesta Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A visita do Presidente Botha à Madeira suscita uma grave questão de regime e de Estado.

Risos do PSD.

A questão da unidade da política externa portuguesa, a questão da unidade do Estado democrático português. Estamos perante um novo abuso do poder autonómico, contrário à dignidade e à consolidação da própria autonomia. E estamos perante uma nova e significativa demissão do Governo da República, contrária à dignidade e ao prestígio do Estado português.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A política externa não pode ser fragmentada, nem regionalizada, nem muito menos condicionada por atitudes caprichosas ou por interesses parcelares. Os interesses globais de Portugal e a unidade do Estado não podem ser sacrificados aos problemas da unidade interna de um partido. É uma questão grave, séria, que tem a ver com a permanência dos valores nacionais e não se compadece com uma visão politiqueira, táctica ou conjuntural.
Acusamos por isso, e acima de tudo, o silêncio do Sr. Primeiro-Ministro.
É um silêncio revelador de falta de coragem política e de sentido de Estado. Um silêncio que traduz a incapacidade de fazer prevalecer as responsabilidade constitucionais e nacionais do chefe do governo sobre as conveniências de chefe de partido.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta é a questão de fundo, que não pode ser iludida nem minimizada.
Há também o problema de saber se a posição de Portugal em África e o papel que pode desempenhar na busca das vias do diálogo para uma solução de paz podem ser comprometidos por atitudes e interesses que nada têm a ver com a vocação humanista e anti-racista que constitui uma das pedras de toque da portugalidade.
Não está em causa questionar se, na procura de uma solução pacífica que contemple a complexidade dos interesses em jogo na África Austral, Portugal deve ou não dialogar também com as autoridades da República da África do Sul.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Muito bem!

O Orador: - O que está em causa é saber quem deve assumir a responsabilidade desse diálogo, como, quando, em que circunstâncias, com que perspectiva política global.

Aplausos do PS e do MDP/CDE.