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922 I SÉRIE - NÚMERO 20

Não se proíbe, como é óbvio, a via sacra dos recursos administrativos a partir daí. E admite-se expressamente que os interessados recorram aos tribunais comuns para definição dos seus direitos. Sabido como estes são lépidos, as comissões de trabalho e apreciação têm trabalho, e que apreciar, até à reforma dos seus membros!
Nos cotovelos deste labirinto burocrático deparamos com os habituais inquéritos, os inevitáveis estudos prévios e os esquisitos protocolos entre organismos do Estado que ameaçam invadir as intendências. Seguem-se os pareceres do Instituto de Gestão e Estruturação Fundiária, as autorizações do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, enfim as resoluções do Conselho de Ministros. Porque sem intervenção do Conselho de Ministros nada feito, qualquer que seja a grandeza, o tamanho, a importância do emparcelamento a fazer. Mas com ela, fia fino.
A resolução do Conselho de Ministros «confere ao projecto aprovado, como é natural, carácter obrigatório para todos os interessados abrangidos...»
Mas obrigatório como, pergunto eu, se não se desafora da competência dos tribunais - nem podia - o sagrado direito de cada um discordar e dispor do que é seu?
Estaremos cá para ver a velocidade com que este governo vai conseguir o primeiro emparcelamento, daqui a três ou quatro anos! Então já cá não teremos este Governo, é claro.
Isto, por um lado. Pelo outro, cai-se no extremo oposto da meia bola e força. Há de tudo nesta proposta.
Desde logo ao transformar-se o Instituto de Gestão e Estruturação Fundiárias no deus ex machina da terrível maquinação que o esquema no fundo é.
Tem poderes para - vejam Srs. Deputados:
Fazer caducar arrendamentos, decretando a sua intransferibilidade de um terreno para outro, sem que para aí risque nada a vontade dos contratantes (artigo 4.º, n.º 3);
Celebrar protocolos, os tais famigerados protocolos, com o Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação e outros ministérios;
Constituir e instalar as comissões de trabalho e de apreciação, superintender nelas, contratar peritos e remunerá-los;
Conhecer recursos;
Conferir eficácia a transmissões e partilhas que em regra, por esta lei a não têm. (artigo 26.º, n.º 2);
Adquirir terrenos para as reservas de terras;
Dispor deles;
Exercer direitos de preferência - com total adultação dos equilíbrios tradicionais neste domínio - e que só cedem perante o do comproprietário. Tudo o mais, cede perante o direito de preferência ao Instituto.

Isto para não ir além do principal.
Mas o facilitismo tipo «meia bola e força» espelha-se, com mais avultados riscos, nas seguintes soluções entre algumas apenas:

A aprovação dos projectos de emparcelamento integral depende da sua aceitação pela maioria simples dos proprietários interessados, detendo, cumulativamente, a maioria do rendimento colectável no perímetro respectivo. Parece-me que este apelo ao rendimento colectável é um péssimo elemento, de qualquer modo é o que está lá.

Considero este critério inçado de riscos. Mas não é disso que agora trato. Aquilo para que me permito chamar a atenção do Srs. Deputados é para o facto de se entender «que o não aprovam o emparcelamento aqueles que expressamente o declarem no prazo de quinze dias, contados da última publicação do edital que dê conhecimento público das rectificações do projecto».
O que significa que em matéria de propriedade, ou seja de alma, para os portugueses rurais quem cala consente. Quem não reclamar, quem não disser expressamente que não concorda, passa a concordar, ainda que cale por desconhecimento. Ou por analfabetismo. Temos infelizmente muitos analfabetos. Preparemo-nos para assistir!...
Outro exemplo: No artigo 60.º pré vê-se a notificação dos proprietários interessados, pelos serviços ou órgãos intervenientes nas operações de remodelação predial, a fim de prestarem esclarecimentos necessários. «Venha cá para esclarecer». Se o notificado não cumprir a notificação (sic), não sei se não cumprir é não ir, não responder ou não responder favoravelmente, «sujeita-se, sem possibilidade de reclamação ou recurso, à decisão que for tomada sobre a matéria a que a notificação se refira» (artigo 60.º, n.º 3).
Sem direito de recurso, que a Constituição exige, mas enfim!...
Assim mesmo! Aplaudo a desenvoltura, como aplaudo um bom número de circo. Mas não aplaudo a manifesta inconstitucionalidade deste jurídico atrevimento!...
Um último exemplo: É conferida tal virtude aos pareceres das direcções regionais de Agricultura que, só por si, desencadeiam este lote de consequências jurídicas.
Com base nesse pareceres é deferido o direito de preferência na venda ou dação em cumprimento de prédios rústicos (artigo 63.º). Pareceres! Não são decisões.
Por eles são também certificadas as condições de que depende, em certos termos, o exercício do direito de preferência na alienação de explorações agrícolas economicamente viáveis ou suas fracções, por parte de empresários agrícolas ou arrendatários (artigo 67.º, n.º 4).
Por eles é outrossim deferido o direito de preferência entre vários preferentes nas mesmas condições (artigo 67.º).
Idem àquele ou àqueles que constituam (sic) explorações mais concentradas (artigo 67.º, n.º 6).
Os seus pareceres determinam ainda a permissão do fraccionamento resultante da alienação de parcelas de exploração economicamente viável.
Idem o fraccionamento de explorações agrícolas do tipo patronal.
Certificam enfim a viabilidade técnica e económica das explorações resultantes de actos de divisão, para efeitos de redução de sisa (artigo 36.º do Código da Sisa).
Como se vê, o parecer de uma direcção regional de Agricultura é um «abre-te Sézamo!». Uma chave! Uma benção! Quem tiver a dita de ter por si um parecer favorável, tem tudo. O parecer é o acelerador e o travão. O óleo lubrificante e a areia na engrenagem. Esta proposta consagra o subjectivismo.