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I SÉRIE - NÚMERO 27

dições, nunca escondeu as suas ideias e que sempre manifestou a coerência que tinha com a sua maneira de pensar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É por isso que eu, com a mais profunda emoção, com a emoção de quem foi um amigo pessoal de Joaquim Namorado desde os difíceis anos 40 da resistência ao fascismo, em meu nome e em nome do MDP/CDE, me associo inteiramente à homenagem à memória de Joaquim Namorado.

Aplausos do PS, do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD e eu próprio congratulamo-nos com o facto de esta Assembleia ter aprovado por unanimidade um voto de pesar pelo desaparecimento de Joaquim Namorado. Foi um acto de justiça a um homem, a um cidadão, a um poeta que durante a sua vida foi vítima de tantas injustiças.
Poeta e cidadão incómodo, Joaquim Namorado foi uma figura singular em Portugal no ponto de vista cultural, cívico e humano - e permitam-me que ponha em relevo este último aspecto -, como seu amigo de muitos anos que fui, como seu compadre, como pessoa que com ele trabalhou diariamente, designadamente na revista «Vértice», durante vários anos. Foi a esse carácter singular e impar que o meu amigo e camarada de poesia Manuel Alegre chamou uma espécie de «avesso da ternura» - evidenciada, em outro plano, numa colecção, que o próprio Joaquim Namorado e eu lançámos, chamada «Cancioneiro Vértice», e que pretendeu prolongar ou ser uma espécie de uma segunda geração do neo-realismo, surgido em torno do «Novo Cancioneiro».
Jorge de Sena classificou-o de um lírico desesperado, reconhecendo nele, para além do crítico de um formalismo velho e balofo, o verdadeiro poeta que era, como singularmente alguns dos maiores poetas surrealistas o viriam a incluir em antologias da poesia surrealista e abjeccionista. É porque Joaquim Namorado, para além dessa sua poesia empenhada, era um grande poeta em que a imaginação e até o automatismo tinham raízes de cidade. E alguns dos seus pequenos poemas constituem pequenas jóias da poesia portuguesa de sempre, desde a célebre «Viagem aos mares do Sul» - poema que diz: «eu nunca fui lá» - até àquele outro que diz: «Onde o santo punha o pé nasciam rosas/E o povo lamentava que ele não fizesse o mesmo com batatas.»
Era uma figura sarcástica, Joaquim Namorado, mas esse sarcasmo escondia, como digo, uma grande ternura e a grande dimensão humana, daquele que foi um resistente, um combatente pelos seus ideais. Por detrás de uma afirmação um pouco «espectacular» e por vezes quase insuportável de uma aparência truculenta escondia-se um grande coração de «um amigo do seu amigo», de homem aberto, tolerante e capaz de dialogar, de discutir, e até de ajudar aqueles que pensavam de uma forma muito diferente da dele.
O 25 de Abril fez justiça ao professor que foi impossibilitado até de dar aulas no ensino particular e que, com grandes dificuldades, vivia de dar explicações. Fez justiça ao homem que foi perseguido, que nunca se vergou na sua incomodidade, na sua grandeza, constituindo de facto uma dessas reservas morais e cívicas que não veio nos jornais e que, inclusive, chegou ao máximo da dádiva, que foi sacrificar grande parte da obra que poderia ter e que não teve, pois a que nos deixou estava abaixo do que o próprio Joaquim Namorado era capaz. Sacrificou a sua obra a uma intervenção, a uma dinamização cultural e cívica de todos os dias e, a maior parte das vezes desconhecidas, que não chegava aos grandes centros de Lisboa ou Porto. Aliás, não sei sequer se a nossa televisão terá recolhidas algumas imagens do Joaquim.
Durante anos e anos em que, no período da ditadura, disse poesia em muitos locais deste país, quer em fábricas quer em cooperativas e em clubes, etc., senti como a sua poesia «dizia» ao nosso povo. O poema «Port-wine», que o José Manuel Mendes há pouco referiu, e que eu costumava dizer nesses encontros com o nosso povo (quando dizia versos dos grandes poetas portugueses, entre os quais incluía sempre o Joaquim) causava uma impressão que ainda hoje «sinto». Havia gente oprimida deste país que não resistia às lágrimas ou aos «vivas» ao ouvir esse poema. Essa era a melhor homenagem que se podia fazer ao Joaquim, essa, lembrar os seus versos e o seu exemplo, é a melhor homenagem que se pode fazer a Joaquim Namorado.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP, do MDP/CDE, de alguns deputados do PSD e do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Gama.

O Sr. José Gama (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Coimbra perdeu mais um professor. Dobraram os sinos da velha Universidade, anunciando que a sua cidade, a sua Faculdade de Ciências ficara mais pobre. De Joaquim Namorado resta a memória e a sementeira da sua obra.
Poeta de palavras livres, irreverentes e inconformadas, Joaquim Namorado conheceu a perseguição porque a fidelidade às suas convicções mais profundas voara mais alto que o temor às zangas do poder constituído.

Uma voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Pedagogo exímio, que vários jovens da minha geração tiveram o privilégio de ter como explicador, Joaquim Namorado irradiava a simpatia contagiante dos homens simples que não vestem casaca para exibir a profundidade do seu pensamento.
Obrigado a dar explicações de matemática por o seu nome integrar o índex dos mestres proibidos, Joaquim Namorado veria mais tarde a justiça bater à sua porta quando em Portugal aconteceu o Tempo Novo da Liberdade. Terá sido um encontro tardio para o velho lutador, abnegado e persistente, a Ordem da Liberdade e a medalha de ouro da cidade de Coimbra terão representado mais um testemunho público de que é inútil barrar o caminho ao vento norte dos ideais.
Nunca nos encontrámos nas mesmas sessões de esclarecimento político, nem frequentámos os mesmos comícios, simplesmente porque morávamos ideologicamente em sítios diferentes. O respeito pela cultura proíbe-nos, todavia, ciúmes, raivas e intolerâncias. A esta floresta de vícios a cultura diz-nos: não!