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28 DE JANEMO DE 1987

O que passa, repito, por combater a partidocracia exactamente para defender e valorizar os partidos, instrumentos decisivos, essenciais e insubstituíveis do regime democrático. Quem o não compreende, parece-nos que compreende pouco...
Mas a que propósito, Sr. Presidente e Srs. Deputados, recordamos o projecto de lei que constitui o nosso primeiro agendamento da anterior sessão legislativa, projecto que o PRD em breve voltará a apresentar, porque ele nos continua a surgir como justo e necessário e porque pode ser que já se tenham desvanecido os critérios de «oportunidade» que alguns partidos invocaram para votar contra ele?
Recordamo-lo precisamente para pôr em relevo duas coisas.
Primeiro, que, como naquele caso, o nosso primeiro agendamento desta sessão legislativa tem como objecto um projecto de lei que, em nosso juízo, para lá da sua importância prática, tem um peso político e simbólico relevante.
Segundo, que, também à semelhança daquele caso, em que (nomeadamente) combatemos a partidocracia para defender os partidos se questionamos aqui o que consideramos privilégios ou benefícios injustificados de titulares de cargos políticos, não é para pôr em causa tais titulares, e muito menos os respectivos orgãos, mas para os defender, para defender e reforçar o regime democrático, para defender e melhorar, sobretudo, a imagem dos deputados e da Assembleia da República, cerne e coração da democracia.
Não esquecemos -e é mesmo bom sublinhá-lo, num país como o nosso, que durante 48 anos viveu sobre o jugo de um regime tirânico, que obviamente deixou sequelas que não se apagam de um dia para o outro -, não esquecemos que as instituições democráticas são objecto de ataques dos que preferem ainda a ditadura e a servidão, em toda a sua ignomínia. E não esquecemos que, por via de regra, os parlamentos são o principal alvo desses ataques, quer exactamente por serem o cerne ou o centro da democracia, quer porque constituem a instituição democrática mais vulnerável, porque a mais aberta, a mais transparente, aquela em que tudo se passa aos olhos dos cidadãos e na qual se reflectem e se exercem em toda a sua pujança, e naturalmente também com todos os aspectos aparentemente negativos, as divergências, as tensões e os conflitos que existem na própria sociedade.
Naturalmente não vamos entrar aqui em toda a rica e diversificada problemática da acção e situação dos parlamentos na sociedade contemporânea e da necessidade que eles têm, como todas as instituições, de se adaptar à realidade dos novos tempos e até das novas técnicas. Uma coisa é certa: nenhum democrata, nenhum cidadão consciente, pode negar o seu papel insubstituível e o seu valor único de referencial democrático.
E ninguém pode negar também aquela sua vulnerabilidade, tanto maior, e muito maior quando o Governo, o executivo - que é quem pode dar a ideia demagógica, falsa e não democrática que só ele faz, realiza, enquanto o Parlamento se limita a falar e a impedi-lo de fazer... -, não colabora com a sua dignificação, antes, inclusive, o critique ou ataque por cumprir o seu papel, designadamente de fiscalizar com rigor a acção do Governo e tomar todas, mas todas, as iniciativas e medidas da sua competência.

Mesmo nos países de longa e firme tradição democrática e parlamentar, como é o caso dos Estados Unidos da América, há exemplos do que afirmamos, e um dos mais significativos é decerto este: já tinha rebentado há muito o escândalo Watergate, provara-se a grave actuação, política e moralmente corrupta, do presidente Nixon, que entretanto renunciou, e ainda, segundo as sondagens, a sua imagem era melhor e a sua popularidade maior que a do prestigioso Congresso dos Estados Unidos, que em vários domínios (designadamente quanto a vários poderes que tem - e esta Assembleia da República não tem) constitui exemplo democrático.
Ninguém pode negar, finalmente, que há uma distinção muito simples e clara, mas em nosso juizo muito importante a fazer. E ela é esta: há os que combatem o regime democrático, e designadamente o Parlamento, através dos seus erros e defeitos; e há os que combatem os seus erros e defeitos para defender o regime democrático, designadamente o Parlamento.
É esta, óbvia e indiscutivelmente, a posição do PRD, ao longo de toda a sua actuação em geral e em particular ao apresentar -com as considerações que eu próprio então fiz nesta tribuna- e agendar, há um ano, o seu projecto sobre as candidaturas independentes para as eleições municipais, e ao fazê-lo agora em relação ao projecto de lei que hoje nos ocupa, a propósito do chamado «estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos».
Quem não compreende aquela distinção e confunde os segundos com os primeiros acaba por prestar o melhor serviço a estes, isto é, àqueles que combatem o regime democrático e o Parlamento através dos seus defeitos e erros.
Sendo bem claros, quanto à matéria sub judice, o PRD entende que a Lei n.º 4/85, por força de algumas das suas disposições, e designadamente nas circunstâncias ou na conjuntura em que foi aprovada, não constituiu um bom serviço prestado a este Parlamento e, por isso, ao regime democrático e ao Pais. Essa lei continha e contém algumas disposições chocantes, que se traduzem naquilo que, como já salientei, consideramos privilégios ou benefícios injustificados para os titulares dos cargos políticos. Bem certo que o decurso do tempo e o facto de o Pais, entretanto, ter saído da situação de carência, com a consequente política de austeridade em que se encontrava, já representam mudança assinalável naquelas circunstâncias. E só por isso o PRD não propõe já alterações ainda mais substanciais à Lei n. 4/85, relativamente a artigos que, se ao tempo já existisse e estivesse representado nesta Assembleia, nunca poderiam merecer o seu voto favorável.
Não defendemos o «miserabilismo» na política nem em nada, mas entendemos que não se pode confundir dignificação com simples aumento de remunerações ou regalias, antes entendemos que ela passa por muitos outros aspectos, desde os políticos aos dos meios e das instalações.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Muito bem!

O Orador: - Sabemos perfeitamente que hoje qualquer quadro médio/superior com alguma qualificação ganha mais do que um deputado e qualquer administrador de empresa, ou nem isso, ganha mesmo mais do que um ministro, ou que um deputado que exerça uma profissão liberal, mesmo que a não abandone,