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31 DE JANEIRO DE 1987 1483

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Defensor de Moura.

O Sr. Defensor de Moura (PRD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Estando em discussão nesta Assembleia a ratificação do Decreto-Lei n. 16/87 e do respectivo decreto regulamentar, que introduzem profundas alterações na organização e funcionamento dos hospitais, a Sr.ª Ministra da Saúde justificou a necessidade de maior intervenção governamental na vida hospitalar como solução para a degradação e deficiente funcionamento destes estabelecimentos de saúde.
Embora advogue na nova legislação uma maior autonomia para os hospitais, desconcentrando a tomada de decisões, o Governo acaba por atribuir ao Ministério da Saúde a responsabilidade total da gestão hospitalar.
De facto, ao nomear directamente o presidente do conselho de administração e indirectamente o administrador-geral, o director clínico e os três adjuntos, o enfermeiro-director e os seus três adjuntos e até, nalguns casos, os próprios directores dos serviços de acção médica, o Governo chama a si todas as decisões da vida hospitalar.
É evidente que não é o controle da gestão e da direcção dos estabelecimentos que se pretende com esta legislação.
Esse, o controle governamental, já estava assegurado no Decreto-Lei n.º 129/77 que permitia ao Governo colocar, nos hospitais, gestores de nomeação governamental durante período de tempo e com objectivos predeterminados, quando se verificassem deficiências na organização e funcionamento dos serviços.
Ontem, a Sr.ª Ministra já nos informou que não concorda com esse regime de excepção, preferindo este Governo transformar a excepção em regra de intervenção na gestão dos hospitais.
Advoga ainda o Governo na nova lei orgânica hospitalar, a criação de centros de responsabilidade intermédia. No entanto, no decreto regulamentar exclui expressamente a direcção do internato médico e as comissões do bloco operatório e do serviço de urgência, previstas no decreto anterior, que são verdadeiros centros de responsabilidade intermédia da máxima importância na vida de qualquer hospital, cujas responsabilidades passam agora para o todo poderoso conselho de administração.
Em vez de exercer as suas competências de tutela e de incentivar o melhor funcionamento dos órgãos de gestão e direcção existentes, este governo prefere substituí-los pelos seus mandatários!
E quem vai o Governo nomear para o conselho de administração? Pelo teor do decreto, poderão não ser profissionais de saúde, nem sequer trabalhadores do próprio hospital.
O presidente é uma individualidade, evidentemente da confiança do Governo, que pode não ser médico nem pertencer aos quadros da instituição, tal como o próprio director clínico.
O administrado geral - imagine-se! - pode até nem ter o curso de administração hospitalar, desconhecer totalmente o hospital que vai "administrar" e ser até estranho à função pública.
Havendo no País uma escola de grande prestígio nacional e internacional, que forma administradores hospitalares, o Governo desperdiça esse capital para reservar os lugares para a gente da sua confiança.
Em vez de garantir a estabilidade da gestão hospitalar com administradores especializados na área da saúde, o Governo pretende transferir para os hospitais a "magnífica experiência" das gestões das empresas públicas nomeadas pelos governos.
Perguntava ontem a Sr.ª Ministra, se seria razoável que se desconfiasse sistematicamente do Governo. Hoje, devolvo a pergunta - será razoável que se desconfie tanto dos profissionais de saúde?
Ainda ontem, V. Ex.ª disse aqui que não tinha dúvidas nenhumas sobre a competência e a dedicação da generalidade dos profissionais de saúde, nem sobre o espírito de serviço da maioria dos que têm exercido cargos de gestão nos hospitais.
Será que V. Ex.ª acredita mesmo que em caso de conflito de interesses dos doentes e dos trabalhadores de saúde são estes que acabam por prevalecer, como aqui disse ontem?
Será que V. Ex.ª acredita tão pouco nos princípios deontológicos dos profissionais de saúde?
Não seria da competência de V. Ex. detectar os que não respeitam esses princípios e puni-los exemplarmente?
Se o fez, o seu número foi tão elevado que justifica a própria alteração da lei de gestão, para evitar o acesso de todos os profissionais a cargos de tal responsabilidade?
Se não o fez, por que continua a atribuir publicamente aos profissionais de saúde, especialmente aos médicos, a culpa do mau funcionamento dos hospitais?
Já pôs este governo à disposição dos hospitais os meios financeiros, humanos e materiais que os profissionais de saúde constantemente solicitam para optimizar a sua acção?
Que medidas tomou este governo para diminuir o afluxo de doentes aos hospitais e a duração dos internamentos, através da melhoria e da prontidão dos cuidados primários?
Na verdade, parece-me que este governo não compreendeu ainda a especificidade da gestão dos serviços de saúde em geral e dos hospitais em particular.
Qualquer legislação sobre gestão de saúde tem de tomar na devida conta o facto de serem os próprios prestadores de cuidados, na base da cadeia hierárquica, a decidir a maior parte das despesas dos serviços, prescrevendo ou executando terapêuticas ou exames complementares.
Só fazendo-os participar activamente na gestão das instituições, motivando-os e responsabilizando-os em órgãos colegiais, se conseguirá rentabilizar os meios existentes.
Nenhum autoritarismo pode limitar a autonomia técnica dos profissionais de saúde, médicos e não só, sem colidir com os fundamentos do seu exercício profissional e, consequentemente, com os interesses dos doentes.
Esta lei orgânica dos hospitais se fosse levada à prática seria um fracasso, como tantos outros deste governo no campo da saúde, e por isso juntamos a nossa voz à das organizações representativas dos médicos, enfermeiros, paramédicos, administradores, engenheiros e outros técnicos de saúde, recusando a sua ratificação.
A falta de diálogo que procedeu a elaboração deste decreto e a pressa com que foi publicado, mesmo quando já eram conhecidas as oposições das organizações dos profissionais de saúde e se adivinham as posições da maioria dos grupos políticos, leva-nos