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16 DE NOVEMBRO DE 1988 341

seja, quanto às três questões que estão claramente formuladas na proposta de lei, damos o nosso apoio. Em relação às outras não damos e, portanto, não o podemos dar a este pedido de autorização legislativa, porque as questões não se encontram formuladas em termos minimamente perceptíveis.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A Mesa solicita aos Srs. Deputados que ainda não votaram para a eleição do Conselho de Administração o favor de o fazerem, na medida em que as umas encerram dentro de 9 minutos.
Para um intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Licinio Moreira.

O Sr Licinio Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, Srs. Deputados: Rompendo com a classificação bipartida do Código Penal português de 1986, que definia o crime ou delito no seu artigo 1.º e a controvenção, posteriormente denominada transgressão, no artigo 3.º, inspirando-se, por certo, na lei pombalina de 1760, que criou a Intendência-Geral da Polícia, onde, pela primeira vez, se separou a jurisdição de polícia da jurisdição contenciosa, e apoiando-se nas legislações de vários países após a Segunda Guerra Mundial, nomeadamente a lei geral sobre transgressões da ordem, de 1978, da República Federal da Alemanha, o Código Penal Português de 1982 fez introduzir no direito punitivo ou sancionatório «o ilícito de mera ordenação social», com a exclusão das suas normas tudo o que não seja «ilícito penal».
Como refere o Prof. Manuel Cavaleiro de Ferreira, nas suas Lições de Direito Penal, I (Teoria do Crime no Código Penal de 1982), já a tese do alemão Goldschmidt, do princípio deste século, teve grande repercussão, quando tomando por base elementos oriundos da doutrina liberal, mesclados com princípios do direito público que tinham subsistido na Alemanha, afirmava:
No liberalismo individualista, a ordem jurídica, garantindo a liberdade de cada um com a dos outros, os direitos fundamentais do homem a ele referidos como a pessoa individual constituem a base da ordem constitucional. Frente a esta situar-se-ia a ordem administrativa que superintende na realização dos fins do Estado relativos à segurança e bem-estar da comunidade como tal. À ordem constitucional corresponderá um direito penal constítucional, depois denominado direito penal de justiça; à ordem administrativa, um direito penal administrativo.
Do ponto de vista legislativo, os resultados práticos imediatos foram reduzidos, mas tal tese constitui a base doutrinária para elaboração de legislação, sobretudo durante os dois períodos de beligerância em que o Mundo, mas sobretudo, a Europa, estiveram envolvidos com a introdução de medidas administrativas no condicionamento da economia, sancionadas directamente pela Administração.
Sustentando-se na diversa legislação económica na Alemanha, de antes e durante a II Grande Guerra-Mundial, Schmidt retoma a doutrina do seu compatriota Goldschmidt do princípio do século e participa
na elaboração da lei sobre Direito Penal Económico de 1949, em que se distinguem crimes e transgressões da ordem de carácter económico. Desde então, o campo de transgressões da ordem vai-se ampliando e abrangendo várias matérias, ao ponto de se sentir necessidade de elaborar uma lei geral sobre transgressões da ordem, compiladas por lei de 1975 (já alterada em 1978).
Esta curta incursão na história do ilícito de mera ordenação social deixa logo perceber que este ramo do Direito sancionatório ou punitivo está praticamente agora a ganhar foros de cidadania. Assim é que a Constituição da República Portuguesa, na sua. primitiva redacção a de 1976 -, desconhecia o direito de mera ordenação social, tendo sido na revisão constitucional de 1982 que foi introduzida a alínea d) do n.º 1 do artigo 168.º da Constituição da República Portuguesa, bem como o n.º 3 do artigo 282.º da Lei Fundamental.
É no Governo Constítucional, presidido pelo saudoso Prof. Mota Pinto, tendo como Ministro da Justiça o Prof. Eduardo Correia, que, pela primeira vez, no ordenamento legislativo português, é publicado um decreto-lei, versando o ilícito de mera ordenação social - o Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de Julho. No seu extenso preâmbulo, justificava-se a instante necessidade de dispor de um ordenamento sancionatório alternativo e diferente do Direito Criminal, que possibilitasse a libertação deste ramo do Direito «das infracções que prestam homenagem a dogmatismos morais ultrapassados e desajustados no quadro de sociedades democráticas e plurais, bem como do número inflacionário e incontrolável das infracções destinadas a assegurar a eficácia dos comandos normativos da Administração, cuja desobediência se não reveste de ressonância moral característica do Direito Penal», e; por fim, «permita reservar a intervenção do Direito Penal para a tutela de valores ético-sociais fundamentais e salvaguardar a sua plena disponibilidade para retribuir e prevenir com eficácia a onda crescente de criminalidade, nomeadamente da criminalidade violenta».
A superação definitiva do modelo do Estado liberal e o conhecido movimento de descriminalização que, por toda a parte, ganhou muito adeptos após o final do segundo grande conflito mundial, são os dois grandes factores que determinam o aparecimento do Direito de mera ordenação social, como ramo independente do Direito sancionatório ou punitivo. Assim é que .países com regimes políticos opostos, como são as duas Repúblicas alemãs, têm as suas administrações aparelhadas com este .valioso instrumento jurídico.
Na verdade, todos os Estados contemporâneos, independentemente da filosofia política dos seus regimes, chamaram a si tarefas de planificação, de propulsão e de conformação da vida económica e social. Cada vez mais a intervenção do Estado é ampliada a sectores, como a economia, a saúde, a educação, a cultura, a habitação, o desporto, o ambiente, a qualidade de vida, etc., pelo que nunca poderia atingir os fins a que se propõe se não dispusesse de uma aparelhagem de ordenação social, a que corresponde um ilícito e sanções próprias.
Quanto ao movimento da descriminalização, todos os que trabalham nos tribunais reconhecem quão doloroso é, para magistrados, funcionários e cidadãos, perder horas e horas de trabalho com processos de transgressões de duvidosa dignidade criminal, pois a reprovação