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19 DE NOVEMBRO DE 1988 387

disciplina, nem do respeito que lhe merecem as competências da Assembleia da República, o Governo poderia ter solucionado todas estas questões sem que tivesse que vir submeter à Assembleia da República esta figura de alteração à Lei do Orçamento do Estado para 1988. Quem tiver memória fraca basta-lhe consultar o Diário da Assembleia da República quanto aos debates do Orçamento do Estado para 1986, mas queria recordar algumas declarações de Srs. Deputados da oposição que, na altura, disseram que, de acordo com esta mesma filosofia, o Governo poderia e deveria vir à Assembleia neste processo que, não sendo a apresentação de um novo Orçamento, é um processo de meras alterações orçamentais que - é fundamental sublinhá-lo - visam reduzir o défice e introduzir mais disciplina nas finanças públicas.
Em suma, deveria considerar-se o Orçamento como um instrumento fundamental para a gestão das finanças públicas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Entre a data da apresentação da Proposta de Lei n.º 73/V, de alteração do Orçamento de Estado para 1988, e o dia de hoje em que se processa a sua discussão, registou-se um facto de importante significado e alcance político e orçamental que não pode, de modo algum, ser ignorado: a decisão do Tribunal Constitucional de declarar que a inconstitucionalidade de múltiplas normas inscritas naquele Orçamento.
O Tribunal Constitucional entendeu, por razões de segurança jurídica, ressalvar os efeitos já produzidos pelas gravíssimas inconstitucionalidades que o Governo foi praticando desde Janeiro de 1988.
É indisfarçavelmente importante o alcance da decisão, cujo conteúdo foi já oficialmente transmitido à Assembleia da República (aguardando-se apenas a divulgação de todos os seus fundamentos). Alguém pode ter dúvidas, por exemplo, sobre as implicações da declaração de inconstitucionalidade da chamada "dotação concorrencial"?
Recorde-se que, com a sua criação o Governo pretendia consagrar na ordem jurídica portuguesa, contra todas as normas constitucionais e orçamentais vigentes, o princípio de que as despesas do Orçamento do Estado deveriam concorrer entre si. Do que resultava que a Assembleia da República passaria a aprovar dois tipos de despesas, umas com cobertura e outras sem cobertura orçamental. Sendo certo, por acréscimo que a Assembleia ignoraria em qual daquelas categorias viriam a inserir-se as despesas que aprovasse.
A declaração de inconstitucionalidade da norma que criava aquela "dotação negativa" não pode deixar qualquer dúvida, a quem quer que seja, sobre o seu exacto alcance: primeiro, que todas as despesas inscritas no Orçamento do Estado têm que ter efectiva cobertura orçamental; segundo, que essa cobertura orçamental só pode revestir a forma das receitas orçamentalmente inscritas (nelas incluídas, logicamente, os empréstimos a obter). Isto é, a declaração de inconstitucionalidade da "dotação concorrencial" implica, necessariamente, a obrigatoriedade de a Assembleia da República (pois só ela tem competência constitucional para o fazer) votar uma alteração orçamental que estabeleça o equilíbrio do Orçamento do Estado para 1988, equilíbrio esse exigido pelo n.º 6 do artigo 108.º da Constituição e pelo artigo 4.º da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado. Esta é uma exigência constitucional a que a Assembleia da República não poderá subtrair-se. E é uma exigência a que o Governo não poderá fugir, pois é a ele que compete apresentar a correspondente proposta de lei.
Apesar de, na sequência da declaração que há poucos dias aqui fizemos sobre este assunto, o Grupo Parlamentar do PCP ter apresentado formalmente à Comissão de Economia, Finanças e Plano a necessidade de o Governo apresentar uma proposta de lei de alteração ao Orçamento, visando o expurgo das inconstitucionalidades agora confirmadas, e apesar de o Presidente da Comissão ter solicitado ao Presidente da Assembleia da República que o Governo fosse interpelado sobre as suas intenções, o Governo "aos costumes nada disse", pois não só não apresentou qualquer nova proposta como não se dignou, sequer, responder à questão que institucionalmente lhe foi colocada por este órgão de soberania.
Apenas se sabe, pelas declarações de Membros do Governo a órgãos de Comunicação Social, prestadas pelo Srs. Primeiro-Ministro e Ministro das Finanças e agora corroboradas pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que o Governo considera que nada tem que fazer, invocando que o Acórdão do Tribunal Constitucional não está publicado insinuando que não se lhe alcança o conteúdo constitucional.
Isto é, o Governo pretende escudar-se num excessivo formalismo jurídico para aproveitar o facto de o Tribunal Constitucional ter ressalvado os efeitos produzidos até à publicação do acórdão e para, quiçá, tentar eximir-se ao necessário expurgo das inconstitucionalidades.
Só por si, esta seria já uma posição merecedora de enérgica condenação política, designadamente pelo facto de as normas em questão sempre terem sido inconstitucionais, desde o momento em que foram propostas pelo Governo à Assembleia da República. Não foi a declaração do Tribunal Constitucional que as tornou inconstitucionais. O que aquele tribunal fez, com a competência que a Constituição lhe confere, foi declarar, com força obrigatória geral, que aquelas normas sempre foram, são e continuarão a ser inconstitucionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados: Há razões que justificam a suspeição de que o posicionamento do Governo tem intenções ainda mais condenáveis, visando defraudar a própria decisão do Tribunal Constitucional. Há indícios que o Governo pretende utilizar este compasso de espera para dar plena execução a algumas normas já oficialmente declaradas inconstitucionais, nomeadamente no que concerne à "dotação concorrencial" e às "operações activas" do tesouro. Isto é, o Governo pretende aproveitar-se da prudência usada pelo Tribunal Constitucional para continuar a fazer, até à data da publicação do Acórdão, aquilo que o tribunal já lhe fez oficialmente saber que constitucionalmente não pode ser feito.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Exactamente!