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916 I SÉRIE - NÚMERO 24

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos últimos anos iniciou-se em Portugal um trabalho de criação de um quadro conceptual e normativo das questões de reabilitação. Liderado pelo Secretariado Nacional de Reabilitação e Conselho Nacional de Reabilitação elaborou e apresentou ao Governo três documentos Fundamentais:

Contributo para uma política nacional de reabilitação;
Projecto de lei de bases de reabilitação;
Plano de orientação da política nacional de reabilitação.
É neste contexto que a Assembleia da República se ocupa da discussão da proposta relativa à lei de bases da reabilitação. O PRD saúda, desde logo, este esforço de definição e organização de uma política nacional de reabilitação, condição primeira e fundamental para uma acção correcta e eficaz.
É de salientar, por outro lado, a metodologia utilizada para a elaboração essa política e desses documentos, a qual conta, ao que supomos, com a participação activa e decisiva das organizações de e para deficientes.
A proposta agora em discussão define correctamente, em nosso entender, os princípios gerais da política de reabilitação, assim como define os princípios de políticas sectoriais, apontando medidas que nos parecem igualmente adequadas, assegurando em lei os direitos que a Constituição da República consagra. Todavia, o PRD chama a atenção para algumas questões. É que não basta ter uma boa lei para termos uma boa política. De facto, os princípios fundamentais de uma política de reabilitação, enunciados na lei de bases da reabilitação, como sejam os da universalidade, globalidade, integração, coordenação, igualdade de oportunidades, participação, informação, solidariedade e a obrigação do Estado na sua efectivação, não constituem qualquer novidade já que, essencial, esta lei visa promover o exercício dos direitos referidos no artigo 71.º da Constituição da República, ou seja, os direitos que a Constituição consagra nos domínios da prevenção da deficiência, do tratamento, da reabilitação e da equiparação de oportunidades de pessoas com deficiência.
Se a Constituição da República Portuguesa existe desde 1976, então porque só agora procura dar-lhe corpo?
Por outro lado, o Secretariado Nacional de Reabilitação, desde 1977, ano da sua criação, que tem por objectivo cito, «ser o instrumento do Governo para a implementação de uma política nacional de habilitação, reabilitação e integração social do deficiente, assente na planificação e coordenação de acções que concorram neste domínio em ordem à concretização do disposto no artigo 71.º da Constituição».
Assim e pelo menos a definição deste quadro legal que se fala da necessidade da implementação de uma política nacional de reabilitação, da responsabilidade do Governo. No entanto essa política tem continuado por definir, situando-se o atendimento aos deficientes muito mais em acções de carácter particular e ou cooperativo, tais como associações de pais, de técnicos, dos próprios deficientes... do que acções empreendidas pelo Estado. E sem fio condutor, naturalmente que têm sofrido avanços e recuos, conforme a situação política, económica ou sócio-cultural é mais ou menos favorável.
Outra observação a fazer vai no sentido da necessidade de uma aplicação efectiva e cabal da presente lei. Para tal é fundamental uma vontade política efectiva do Governo para a implementação das medidas de política constantes do plano orientador da política nacional de reabilitação, que deve emanar em discussão.
Além disso, é fundamental a adopção de novos padrões de conduta por parte dos serviços governamentais que, normalmente, actuam de forma desarticulada, por vezes mesmo em sobreposição quando não em guerrilha.
É, assim, necessário promover a cooperação e a actuação concertada entre todos os serviços. Necessário também se torna introduzir novos conceitos na acção política.
Destruir a tradicional concepção associada à argumentação economicista invocada para explicar as poucas realizações neste domínio, em favor da urgente necessidade da criação das condições para a realização dos inalienáveis direitos das pessoas com deficiência.
E aqui gostaria, também eu, de contar um pequeno facto. Há cerca de mês e meio, quando integrando uma comissão da Assembleia da República me desloquei a Hamburgo para participar na Assembleia do Tratado do Atlântico Norte, tive oportunidade de visitar o hospital militar de Hamburgo, com que o Governo português mantém um protocolo, há mais de vinte anos, para a reabilitação de estropiados da guerra colonial que existiu em Portugal e muita gente tende a esquecer.
Fui visitar esse hospital e deparei aí com uma situação incrível. Existe nele uma enfermaria, já chamada a enfermaria portuguesa, que tem seis camas. Dessas seis camas só três estão ocupadas, por razões financeiras. Um dos três militares que ocupava essas camas - permita-me esta nota pessoal - era um jovem alferes do meu curso. Os internados apresentavam as seguintes deficiências: cego das duas vistas, sem braços e sem pernas. Um deles estava a fazer a 26.ª operação e tinha aguardado vários anos para se deslocar ao hospital de Hamburgo, que é, reconhecidamente, a nível mundial, o hospital melhor equipado para tratamento de estropiados de guerra. Há vários militares em fila à espera de nele serem assistidos. No entanto, numa enfermaria de seis camas, três encontram-se vazias. E há várias pessoas à espera já há vários anos para fazerem o tratamento. Elas não podem nda mais do que, simplesmente, terem as condições mínimas para poderem viver com a sua deficiência.

Aplausos do PRD e do PCP.

Ainda gostaria de dizer que existe uma ligação extraordinária entre um funcionário do consulado português, em Hamburgo, com estes militares. Esta ligação para além dos aspectos funcionais, tem sido uma ajuda fundamental para a melhor reabilitação dos militares e a sua adaptação a esta unidade hospitalar.
Em nosso entender, as dificuldades neste domínio não estão, nem podem estar, ao nível dos recursos financeiros, mas principalmente: errada concepção desta problemática; na ausência de uma vontade política esclarecedora; na capacidade da utilização eficaz dos recursos disponíveis através de maior e mais eficazes programas e metodologia.
Para além de algum mérito, que cabe a este Governo no plano das definições, o PRD encara com alguma preocupação a capacidade de execução.