6 DE JANEIRO DE 1989 917
De facto, este Governo independentemente de qualquer outro juízo político que se possa fazer, tem cuidado fundamentalmente dos aspectos superestruturais, enquanto ao nível da realidade do dia a dia do trabalho concreto a situação sentida pela generalidade dos portugueses mantém-se sem grandes transformações.
Por outro lado, como já foi referido os diversos serviços de Estado que intervêm neste domínio teimam em continuar a trabalhar de forma desarticulada e por vezes mesmo em conflito uns com os outros. Um outro aspecto que gostaríamos de referir porque gerador de alguma perplexidade, é o facto de, por um lado os documentos já referidos, incluindo a própria lei perspectivaram a reabilitação como um problema multidisciplinar e por consequência da abordagem transministerial e intersectorial, enquanto a política de reabilitação parece ser entendida, por este Governo - esperamos que mude - como uma política de segurança social, e por consequência as pessoas com deficiência consideradas como carecendo fundamentalmente de apoio da sociedade para sobreviver.
E isto tem sido mais notório desde que passou o secretariado Nacional de Reabilitação para o âmbito do Ministério do Emprego e da Segurança Social. Perdeu claramente, campo e capacidade de acção, passando a ser mais um simples organismo dependente de um ministério. Ao mesmo tempo surge o Ministério da Educação e Segurança Social, na prática de liderar toda a política relacionada com a reabilitação dos deficientes será isto da sua vocação? Cremos que não! Mas como é o ministério que tem dinheiro para os deficientes (e muitos milhares de contos têm sido empregues, muito ingloriamente pela falta do tal plano nacional) é que neste momento «está a dar». Ele está presente em todas as estruturas de atendimento a deficientes, mesmo aquelas que eram claramente pertença da saúde ou da educação, levando, inclusivamente e em alguns casos, instituições particulares de educação especial, antes exclusivamente tuteladas pelo Ministério da Educação, a «passarem-se», para aquele ministério. Ë que eles têm o dinheiro e que resolvem os problemas económicos das instituições. Será que o Governo pensa que atribuindo subsídios resolve o problema?
Tudo isto contraria frontalmente o enunciado da lei de bases do sistema educativo que preceitua ser o ministério da tutela e responsável pela coordenação de toda a política educativa, incluindo a da educação especial. Mas também aqui falta a regulamentação! E vai ser regulamentada ou irá acontecer-lhe o mesmo que à Lei n.º 66/79 - Lei do Ensino Especial, que foi aprovada por unanimidade e não chegou a ser regulamentada? E esta lei de bases que estamos a discutir irá algum dia ser regulamentada?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos convencidos que o panorama de toda esta situação seria já hoje bastante diferente se os vários governos tivessem assumido as responsabilidades.
Estes princípios fundamentais, que hoje estamos a discutir, que até parecem inovadores e tão bem intencionados, são também princípios já universalmente aceites em todos os países ocidentais, pelo menos, e recomendados por um organismo tão inquestionável como é a Assembleia Geral das Nações Unidas.
O PRD entende que o que é urgente é transpor a política de reabilitação entendida como transsectorial e integrada para o quotidiano e para isso é fundamental: colocar o Secretariado Nacional de Reabilitação na dependência directa do Sr. Primeiro-Ministro (onde aliás começou por estar) como órgão transministerial de concepção e coordenação da política nacional de reabilitação com efectiva força política para cumprir a sua função; promover a melhor articulação dos serviços governamentais na execução da missão específica consignada na Lei de Bases, no sentido de se optimizarem os resultados e racionalizar os custos; agir de forma ousada e competente.
Será ainda conveniente a promoção social desta problemática retirando-a do ghetto onde tem estado retida, introduzindo-a nos centros de investigação, nos centros de decisão, no debate público, como problema nacional relevante, pois que afecta de forma directa ou indirecta cerca de 30% dos portugueses.
Sabemos que não há leis perfeitas! Sabemos, por outro lado, que sendo fundamentais não são as leis que resolvem só por si os problemas.
As más condições de vida nomeadamente a higiene e a alimentação dos agregados familiares, quantas vezes muito numerosos, são geradores de deficiências ou acentuam outras. Enquanto não forem melhoradas as condições de vida do povo português o combate à deficiência e principalmente a sua detecção precoce são muito limitadas, atendendo à falta de condições de assistência médica que, como sabemos, são deficientes e se perspectivam no futuro, infelizmente, ainda com maiores dificuldades.
Não é, pois, ao nível dos conceitos que as grandes questões se colocam mas sim a possibilidade de os levar à prática que nos levantam fundadas dúvidas a julgar pelo que tem sido essa prática.
Na verdade, as medidas diversificadas e complementares nos vários domínios do processo de reabilitação agora apresentado têm tido um desenvolvimento de tal modo deficiente que não augura nada de bom.
O que se tem passado no campo da educação especial? Para além das instituições e colégios de educação especial com encargos insuportáveis para as famílias, muitas crianças deficientes há que estão em casa, com familiares ou entregues a estranhos, por inexistência de resposta ao nível escolar/educativo.
As escolas oficiais, à excepção de algumas raríssimas excepções não estão adaptadas nem possuem material técnico/pedagógico essencial e específico, bem como o pessoal auxiliar necessário no trabalho com deficientes. O elevado número de alunos/turma, a enorme população escolar das escolas, a ausência de formação dos professores, são outros tantos factores que dificultam a integração escolar dos deficientes.
As instituições educativas para deficientes sem fins lucrativos, existem em Portugal desde a década de 60, mas muito particularmente depois do 25 de Abril de 1974. São as várias associações de pais e técnicos e principalmente o grande movimento cooperativo CERCI que no período de 1974 a 1978 surgiram por todo o País (são cerca de 80) que têm tido uma acção verdadeiramente excepcional e que, de ano para ano, tem vindo a ver as suas organizações mais dificultadas.
Às organizações de e para deficientes, mesmo aquelas que têm de mendigar sob quaisquer formas os apoios de que necessitam para realizar os seus objectivos, o PRD presta aqui a sua homenagem.
Relativamente à reabilitação profissional verifica-se que nos últimos anos têm sido gastos alguns milhões de contos, uma grande percentagem dos quais do Fundo Social Europeu. No entanto, e paradoxalmente