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3330 I SÉRIE - NÚMERO 70

Nesse sentido, dada a abertura constitucional congénita, que já permitiu a protecção da união de facto em certas situações e que permite o alargamento dessa protecção a outras situações, o PSD, considerando as desvantagens, em termos de política legislativa sobretudo, o que isso pode levantar, não vai apoiar o projecto de alteração de Os Verdes.
Quanto ao problema da proposta do CDS, reservar-me-ei, então, para depois da intervenção dos Srs. Deputados autores da mesma proposta.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr.ª Deputada, desde há tempos mantenho contactos profundos e criadores com o Centro de Estudos Judiciários, e aí respira-se uma nova mentalidade jurídica a que este órgão legislador não devia ser indiferente. Mas, é. Na orientação desses novos magistrados, predomina o princípio de que a lei tem de ouvir humildemente a cultura; tem de se afeiçoar aos modelos de vida e não o contrário.
Ora, o que se observa na realidade portuguesa é uma forte percentagem de casais que optam pela união de facto, o que, aliás, está de acordo - e ainda bem - com a primasia dada ao amor em relação à legalidade da perspectiva de uma liberdade de escolha sem a qual a vida não tem sentido.
É evidente que poderemos dizer: a união de facto não está constitucionalizada em muitas Constituições na Europa. A título de exemplo, devo dizer que já o mesmo se não verifica em Cabo Verde e Moçambique, o que não nos deve ser indiferente dados os interesses comuns culturais que temos com esses países de expressão portuguesa.
No nosso país, no Alentejo, pratica-se a união de facto com estabilidade total. E se ela se pratica com estabilidade total, não percebo por que não consagrada em termos que assentem sobre o reconhecimento dessa estabilidade total.
Quanto à Europa, na Inglaterra, a Common law aceita a relevância jurídica da união de facto até porque os ingleses não têm constituição escrita.
No artigo 111.º do Código Civil está consagrado o direito à transmissão, por morte, do arrendamento desde que a união de facto tenha a duração de cinco anos e o titular de arrendamento se encontre no estado de solteiro, viúvo ou divorciado. Em estado de simples separação, a transmissão já não funciona.
Estes exemplos deviam levar-nos a ponderar a possibilidade, para mim desejável, de consagrarmos a união de facto na nossa Constituição.
É evidente que me pode dizer que constitui uma originalidade constitucional mas, Sr.ª Deputada, a isso respondo: já que estamos condenados a ficar na retaguarda da Europa económica, alcancemos, pelo menos, o lugar de vanguarda na esfera legislativa, que é o mesmo que dizer, na esfera cultural da Europa.

O Sr. Presidente: - Para prestar esclarecimentos, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Este vês.

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr.ª Deputada, é para lhe responder, apenas, que mantenho aquilo que acabei de referir há pouco. Para o PSD, e creio que,
objectivamente, as outras bancadas poderão reconhecê-lo, a Constituição não é, em termos de política legislativa adequada, correcta, o lugar adequado para consagrar uma fórmula com esta que vem sendo proposta. A legislação ordinária, tendo em conta a ponderação da situação de facto, a sua delimitação, a sua concretização, é o lugar privilegiado.
Como disse, a Constituição não exclui a possibilidade de a lei ordinária vir proteger a união de facto e vir fazê-lo mesmo em vários aspectos da vida, como sejam o problema da segurança social apontado, o problema do arrendamento e outros. Mas não é a Constituição o lugar adequado pelas razões que acabei de referir. Trata-se de um pormenor que é - digamos - estranho à natureza constitucional. A própria noção de união de facto e do tempo que lhe corresponde são estranhos à própria técnica de elaboração em sede de Constituição e creio que o mais adequado é remeter, exactamente, para a legislação ordinária, uma vez que a abertura constitucional é total.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verde): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero agradecer à Sr.ª Deputada Natália Correia o facto de ter feito a apresentação da proposta que o Grupo Parlamentar de Os Verdes apresenta, de forma tão brilhante e com argumentos que, penso, irrefutáveis e tendo, ainda assim, o cuidado de a criticar do ponto de vista da sua elaboração, da sua refinação, da sua construção continuada.
Foi importante que o tivesse feito e gostaria de sublinhar que não é nossa intenção, ao contrário do que a intervenção da Sr.ª Deputada Assunção Esteves poderia fazer crer, substituirmo-nos, aqui, em sede de Revisão Constitucional, ao legislador ordinário. Mas, agora, o que temos de dizer é: coitado do legislador ordinário. Com efeito, tem-se visto até agora que, cada vez que o partido Os Verdes traz, aqui, ao debate da Revisão Constitucional um tema novo, um tema diferente que poderia, eventualmente, trazer alguma frescura à nossa Constituição, não se discorda frontalmente, não se arranjam argumentos contra, mas diz-se: mandamos para o legislador ordinário, não cabe aqui, a técnica da elaboração das Constituições não aconselha a que aqui se ponham essas coisas.
Ora bem, é muito simples rebater essa afirmação. É que aquilo que tratámos de fazer foi introduzir na Constituição - pensamos que é ai o local ideal - um comando constitucional para o legislador ordinário. Aquilo que se diz muito simplesmente é que a lei - e aí está o legislador ordinário para a elaborar depois - assegura aos que vivam em situação análoga à dos cônjuges adequada protecção. Isto é um comando constitucional que, a ser consagrado, funcionaria como tal e nada mais. Depois é, designadamente, uma ajuda para o legislador ordinário.
Agora, o que pensamos que é lamentável é que, sem argumentação de fundo e sem outras razões, a não ser aquelas que a razão desconhece, se veja, assim, rejeitada uma proposta que, de facto, consagraria na Constituição aquilo que em sociedade - como diz a deputada Natália Correia - o amor já consagrou. A nós o que nos interessa, de facto, é que as relações entre as pessoas funcionem na base do amor, na base do